Leônidas de Oliveira é secretário de Estado de Cultura e Turismo de Minas Gerais

Minas guarda. Somos, por natureza, aqueles que guardam: guardamos as cartas antigas, os móveis herdados, as receitas da avó, as imagens dos santos, os silêncios. Guardamos como quem sabe que o tempo tem valor, como quem aprendeu, entre montanhas, que perder o passado é perder a si mesmo. Essa vocação mineira de guardar — nas gavetas, na memória e no coração — não é nostalgia: é estratégia de pertencimento, resistência e até felicidade. Em um mundo acelerado, fragmentado e muitas vezes indiferente ao que passou, Minas ensina que a permanência também é uma forma de liberdade.


A poeta mineira Adélia Prado, que neste ano completa 90 anos, escreveu: “O que a memória ama fica eterno”. Talvez seja isso que mais nos defina — o amor ao que passou como fundamento do que permanece.


Minas abriga hoje 62% de todo o patrimônio histórico protegido do Brasil, sendo também o estado com o maior número de reconhecimentos da UNESCO, com dez títulos oficiais. 


Essa posição nasce de um ethos mineiro, do barroco que é forma e filosofia, do modernismo que se transformou em urbanismo poético na Pampulha, da cultura alimentar que é gesto e cuidado, da fé que se materializa em madeira e pedra, da natureza que é também altar e caminho.


Entre os bens reconhecidos, estão os quatro Patrimônios Culturais da Humanidade — Ouro Preto (1980), Congonhas (1985), Diamantina (1999) e a Pampulha (2016) —, além do mais recente título concedido ao Parque Nacional Cavernas do Peruaçu (2025), no Norte de Minas, como Patrimônio Natural da Humanidade. São paisagens de beleza e sentido, que revelam não apenas formas, mas histórias, cicatrizes e esperanças.


No campo do imaterial, Minas alcançou, em 2024, a consagração dos Modos Artesanais de Fazer o Queijo Minas como Patrimônio Cultural Imaterial da Humanidade, sendo o único bem da cultura alimentar brasileira com tal reconhecimento. No ano anterior, o Sistema Agrícola Tradicional das Apanhadoras de Sempre-Vivas, no Alto Jequitinhonha, foi inscrito como boa prática da UNESCO, celebrando um modo de vida baseado na harmonia entre saber, natureza e comunidade.


A isso somam-se dois reconhecimentos em redes globais: Belo Horizonte, como Cidade Criativa da Gastronomia da UNESCO (2019), e Uberaba, integrada em 2024 à Rede Mundial de Geoparques, com o território “Terra de Gigantes”. Aqui, a cultura e a ciência se unem ao turismo e à sustentabilidade como vias de futuro.


Significa que preservar é gerar trabalho. Que cultura é também economia. Que o barroco não é apenas passado, mas linguagem. Que o modernismo é memória urbana. Que o queijo é alimento, mas também identidade. Que as flores do cerrado têm mais valor quando colhidas com respeito e transmitidas com amor.
É a economia da criatividade que transforma o patrimônio em emprego, renda e desenvolvimento territorial, sobretudo nas regiões interiores. É o turismo cultural e de experiência que revela o Brasil profundo e sustentável, que em Minas encontra sua paisagem mais nítida.


De 2020 a 2025, quatro dos dez títulos da UNESCO foram conquistados. Mas, mais que prêmios, são compromissos. Compromissos com a memória e com o amanhã. Com os mestres do ofício, com os guardiões do saber popular, com as comunidades que transformam o cotidiano em cultura viva.


Minas é, portanto, o estado que escolheu preservar não apenas para lembrar, mas para continuar sendo. Porque ser Minas é exatamente isso: cultivar o tempo como quem cultiva um território — com beleza, cuidado, fé e resistência.