Quando se fala da falta de saneamento básico, a primeira associação que se faz é com seus impactos no adoecimento da população. Não surpreende, já que, no ano passado, 334 mil pessoas foram internadas no Brasil por causa de enfermidades ligadas à água – 70 mil delas, crianças entre 0 e 4 anos. Porém, é preciso sensibilidade e ousadia para olhar a questão não só pelo prisma do passado, mas também para o futuro. 

E é exatamente isso que os jornalistas Gabriel Rezende, José Vitor Camilo, Rayllan Oliveira e Tatiana Lagôa fazem na série especial publicada em O TEMPO nesta semana. De início, a falta de acesso à rede de água e esgoto tratados rouba das crianças mais de dois anos de escolaridade. Com isso, os resultados nas provas que lhes garantiriam acesso ao ensino superior e a uma melhor qualidade de vida também são impactados. Em média, candidatos ao Enem que vivem em áreas com saneamento básico alcançam notas 11% maiores do que os que não contam com esses recursos sanitários.

Essa desigualdade pouco explícita afeta tanto seu desempenho acadêmico quanto sua capacidade de autossustento. Dados do Instituto Trata Brasil mostram que trabalhadores sem água e esgoto têm uma renda média de R$ 1.393 – menos da metade (53%) do rendimento de quem é atendido por esses serviços essenciais.

E o problema não está apenas nas casas dessas crianças e jovens. A reportagem mostra que, somente em Minas, 557 escolas não possuem água tratada e 517 contam só com fossas rudimentares, de acordo com o Diagnóstico de Infraestrutura Escolar 2024. Quase 12,2 mil jovens estudam em locais sem água encanada e mais de 1.400, sem banheiros.

Ainda que o país conte com o Marco Legal do Saneamento desde 2020, esses dados mostram que o problema está longe de ser resolvido. A estimativa é que seriam necessários investimentos de R$ 45 bilhões por ano até 2033 para atingir a universalização – mais que o dobro do que é feito hoje.

Corrigir essa falha é urgente e um compromisso com a saúde e com o futuro de nossas crianças.