Meus últimos aniversários vêm sendo os mais felizes, os mais exultantes, os mais saborosos.
Não se deve ao fato de ter amadurecido, a uma serenidade da autoaceitação, a planejar e idealizar menos, a acolher o improviso e a imperfeição.
Até porque guardo a certeza de que todo aniversariante é uma criança incurável. A infância não acaba de vez com a adolescência. O adulto tem ainda um dia por ano para experimentar de sua criancice – e é justamente a sua data de nascimento.
Além da presença alvissareira de Beatriz em minha vida, quis entender o porquê, o que mudou em minha celebração.
Eu passo a semana inteira mais animado. Não é somente a alegria do dia, que não se esgota mais em 24 horas. É uma paz que se prolonga, uma disponibilidade que não se despede.
E entendi qual o motivo. Vai parecer doido, mas é a mais pura verdade: a minha gula infantil por doce é amplamente correspondida.
Tudo pela mania mineira de comprar ou fazer duas tortas para o aniversariante. Trata-se de uma dívida impagável que contraí com a gastronomia local. Só por esse acréscimo na minha rotina já valeu ter morado em Minas.
Eu estava acostumado a uma torta por vez. Nunca restava nada para lembrar da história na manhã seguinte.
Ela servia como referencial da idade, como plataforma para soprar as velinhas e fazer os pedidos. Era muito mais simbólica do que real.
Existia à base de um bolo cenográfico desde a infância.
Os amigos e familiares recebiam uma fatia, com direito a repetir, e não havia ambição de eternidade.
Gostava-se ou não, ninguém se lambuzava ou se derretia pelo recheio. Não se comentavam as façanhas do doceiro, não se pedia a receita ou o nome da confeitaria.
A torta murchava na lembrança como os balões presos nas luminárias, destinada unicamente a satisfazer o momento.
Repartia melancolicamente a minha alegria aos presentes, já com o amargo da avareza, prevendo que não teria sobremesa para a próxima semana.
Porém, o mineiro raciocina diferente. Ele quer o excedente glorioso. É necessário sobrar. Festa arretada é aquela que não termina com a meia-noite, mas que se espalha em potes de plástico.
Quando minha esposa surgiu com duas tortas grandes em meu primeiro aniversário juntos, há seis anos, eu já me preocupei com o número de convidados. Será que chamou a cidade inteira?
Ao descobrir que não se tratava de nenhuma lista absurda, capaz de se diferenciar em tamanho dos eventos anteriores, julguei como um desperdício, dinheiro posto fora, extravagância da sua parte.
Ou que simplesmente enlouqueceu e perdeu o senso de medida. Ou que devia sofrer um trauma de comida faltando em sua casa.
Mas ela abriu meus olhos para o prazer, e nunca mais fui o mesmo:
– Agora a que vamos dividir na “hora dos parabéns”... pense que terá uma torta exclusiva ao longo dos dias, para adoçar o almoço e a janta, para fazer companhia ao cafezinho.
Dessa forma, o meu aniversário fica um bom tempo na geladeira, e não mais envelheço.