Mineiro é precavido.
Mesmo quando viaja de avião para o litoral, já vai de biquíni ou de calção por baixo das roupas.
Está na fila do embarque, disfarçado, com as peças prontas para o mergulho. Ainda que falte retirar a bagagem, embarcar em ônibus, ir para hotel, não quer perder tempo. Não duvido que não tenha passado protetor.
Ele se mata antes para poder relaxar depois e não pensar mais em nada. Só relaxa quando dá conta de todos os preparativos.
Com objetivo de evitar incomodações, incomoda-se de véspera.
Suas promessas não têm fim. Vive comprando briga com os calendários. E não muda de opinião em clima ruim. Põe uma coisa na cabeça e não aposenta a ideia até cumprir. As circunstâncias desfavoráveis não interrompem os seus sonhos e passeios. Mineiro é o cauteloso teimoso, ansioso por natureza.
Tenta pagar as contas antes da data do vencimento, tenta guardar dinheiro para uma emergência, tenta organizar a mala uma semana anterior à partida, tenta aniquilar a carga do emprego com antecedência, tenta aliviar as demandas virando as madrugadas para não legar pendência aos colegas. Disputa, diariamente, uma corrida com a eternidade. Não pretende receber nenhum telefonema perturbando a sua folga.
Mineiro permanece adiantado um mês. Estamos em janeiro, ele já está em fevereiro. Há treze meses por ano para ele.
Por mais que eu esqueça algo para o veraneio, minha esposa Beatriz sempre se lembra antes de mim. Não tem graça. Não recordei do repelente, lá aparece ela com o produto. Não me ative com o cotonete, vem ela mostrar os palitos azuis em sua bolsa. Ela fez um sacolão na farmácia com o que poderíamos precisar e não precisar também. Trouxe um hospital junto para a praia, nos casos de gripe, febre, alergia, enjoo, enxaqueca, dor de barriga, bicho-de-pé, queimadura. Posso escolher a doença que ela providenciará a cura.
Há componentes inacreditáveis em sua nécessaire. Já surgiu com um saca-rolhas. Ou um coador para suco verde. Quem pensaria nisso?
É comum vê-la tirar coelhos de seu boné. Nem me espanto mais. Óbvio que me sinto dispensável, pois não consigo superá-la na memória funcional de casa. Os filhos a procuram em caso de algum apuro. Nem me cogitam.
Acredito que o mineiro tem planilhas de Excel entre as pálpebras. Usa um marca-passo com as cotações das bolsas de valores. Pois nunca é pego desprevenido. Não deixa escapar nem os centavos do cotidiano.
Calcula os gastos e as perdas com apurado planejamento. Organiza as saídas antevendo crises e adversidades. Dedica-se a detalhes imperceptíveis aos mortais de outros Estados.
Sua fama de quieto decorre das operações de sua mente incessante - encontra-se silencioso hoje porque adianta o amanhã em segredo.
Talvez seja a única criatura que, na hora de comprar um imóvel, preocupa-se com o valor do IPTU. Qualquer um perguntaria sobre o condomínio, jamais sobre o IPTU.
Tenha um mineiro ao seu lado e garantirá o seu futuro.