O número de prefeitos reeleitos em Minas Gerais mais do que dobrou em 2024, em relação às eleições de 2020. Dos 853 municípios do Estado, 378 serão governados a partir de 2025 por prefeitos que já ocupavam o posto. O aumento é superior a 240% em relação a 2020, quando 155 foram reconduzidos ao cargo.
De acordo com dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), 456 chefes de Executivos municipais em Minas tentaram a reeleição neste ano, sendo assim, 82,89% dos candidatos conseguiram manter as suas posições. Essa é a maior taxa nos últimos 20 anos tanto no Estado quanto no Brasil. Minas Gerais ainda supera ligeiramente a média nacional, que ficou em 80,8% neste ano.
Em anos anteriores, as eleições municipais registraram taxas de reeleição bem menores do que as atuais. Em Minas Gerais, a proporção foi de 56,3% em 2020, quando 275 prefeitos tentaram a reeleição e 155 foram reeleitos.
O menor índice da série histórica ocorreu em 2016, com uma taxa de 44,6%: apenas 205 dos 459 prefeitos que buscavam se reeleger conseguiram se manter no cargo. Numericamente, o ano com mais reeleitos foi 2008, com 398 prefeitos reconduzidos, mas o índice de sucesso foi de 67,2%, já que o número de candidatos foi maior: 592.
Cofres cheios
Cientistas políticos sugerem que o aumento no índice de reeleição pode estar relacionado ao crescimento do volume de emendas parlamentares – dinheiro dos Orçamentos federal e estaduais que deputados e senadores destinam a prefeituras – nos últimos anos, o que potencializa o uso da máquina pública ao assegurar mais recursos aos cofres municipais.
“O volume das emendas aumentou muito nos últimos anos, e isso significa que os deputados puderam canalizar muitos recursos para seus aliados nas prefeituras. Com mais recursos, os prefeitos podem fazer as obras e as melhorias que a população espera ou podem usar esses recursos para cultivar as suas redes de apoio no município”, avaliou a cientista política Marta Mendes, coordenadora do Núcleo de Estudos sobre Política Local da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF).
“O efeito disso é a redução da competição política e o aumento da vantagem dos atuais mandatários. Com as chamadas ‘emendas de relator’ e as ‘emendas Pix’, é possível até que os prefeitos usem os recursos para fins indevidos que podem aumentar suas chances eleitorais. A falta de transparência na execução das emendas torna difícil saber a extensão disso”, completou.
O cientista político Oswaldo Deon ressaltou que as emendas parlamentares têm um impacto mais significativo em cidades com menor Orçamento. Ele também avaliou que o aumento das reeleições está relacionado “à mudança do presidencialismo no Brasil”. “Deputados federais e senadores passaram a comandar uma parte significativa daquilo que é possível executar do Orçamento federal”, explicou Deon.
Já o prefeito de Coronel Fabriciano, Marcos Vinicius Bizarro (sem partido), presidente da Associação Mineira de Municípios (AMM), contestou o efeito das emendas e atribuiu o aumento na taxa de reeleição a mandatos mais qualificados dos prefeitos. “Os prefeitos estão mais dedicados à gestão pública. Eles estão fazendo entregas que não faziam no passado”, afirmou.
Eleitor desconfia de ‘novas aventuras’
O “conservadorismo eleitoral” também pode ser uma hipótese para explicar o aumento no número de prefeitos reeleitos neste ano. A opinião é do cientista político Oswaldo Deon. “A gente pode observar a tentativa de parte do eleitorado do Brasil de fugir daquilo que é considerado extremismo, levando a uma tendência mais clara de conservadorismo eleitoral – e não moral. Nesse caso, a ideia é que não seria o momento para ‘aventuras’”, afirmou Deon.
Ele ressaltou que o “conservadorismo” diz respeito a hábitos políticos, e não morais. Um exemplo disso, segundo ele, é o desempenho do PCdoB, um partido de esquerda, que venceu em 13 das 15 cidades onde lançou candidato a prefeito em Minas. O único prefeito do partido que buscava a reeleição foi reconduzido ao cargo. Paralelamente, o PSD, partido que mais elegeu prefeitos no Brasil e em Minas Gerais e reconduziu o maior número de prefeitos no Estado, integra a base do governo do presidente Lula (PT).
Para Deon, os eleitores estão demonstrando um comportamento voltado para a manutenção do status quo. “As pessoas estão avessas à mudança, uma espécie de cansaço do eleitor, tendo em vista tudo que foi trabalhado não só pela mídia, mas em canais especializados, daquilo que supostamente a polarização poderia causar de problemas para a vida do cidadão comum”, pontuou.
Gestores estão até no quinto mandato
Entre os prefeitos reeleitos em Minas, alguns vão iniciar no próximo ano o terceiro, quarto ou até quinto mandato. São os casos de Ângelo Oswaldo (PV), que vai assumir o comando de Ouro Preto pela quinta vez; de Marília Campos (PT), que ocupará o Executivo de Contagem pela quarta vez; e de Anderson Cabido (PSB) e Inácio Franco (PL), que seguem para o terceiro mandato em Congonhas e Pará de Minas, respectivamente.
A legislação permite que políticos tenham mais de dois mandatos no Executivo desde que não sejam consecutivos. O cientista político Oswaldo Deon vê os casos de Marília e Ângelo como exemplos de boas administrações aprovadas pela população. “São dois prefeitos que fizeram trabalhos que mudaram a fisionomia das cidades, e curiosamente as suas oposições reconhecem isso”, avaliou.
Sobre o caso de Ouro Preto, a também cientista política Marta Mendes chamou a atenção para uma possível “dificuldade encontrada por outros partidos e forças políticas de oferecer alternativas para a população”.
Ângelo Oswaldo, por sua vez, citou sua atuação na área cultural como um dos fatores que contribuíram para suas sucessivas vitórias. “Sempre me peguei na luta pela valorização do patrimônio e visando compatibilizar a qualidade de vida e os interesses da comunidade com a proteção do patrimônio”, pontuou.