As manifestações pelo país e em Minas Gerais apresentaram um comportamento diferente neste ano. Se até 2018 os atos eram menos frequentes, mas contavam com um número considerável de adeptos, em 2019 eles foram mais corriqueiros, porém com uma adesão menor do que a vista em outras ocasiões. Além de pautas repetidas e do próprio aumento do número de protestos, questões políticas podem explicar o esvaziamento dos atos.

Segundo dados do Movimento Brasil Livre (MBL) em Minas Gerais, Belo Horizonte registrou cinco atos no ano passado inteiro e oito em 2019 até a primeira semana deste mês. Foram três somente entre novembro e dezembro. 

“Isso aí é um tema que a gente vê com certa preocupação. As manifestações, além de se esvaziarem, tiveram pautas que foram se tornando cada vez menos urgentes. Passaram a ser estatizadas, era mais importante você falar que era leal ao presidente, ao Planalto, do que, de fato, ao tema da manifestação. Isso a gente viu nessa última, do dia 8, que foi a favor da (prisão em) segunda instância. Os discursos foram bizarros, poucos ou nenhum falando da técnica, da complexidade da segunda instância, porque é inconstitucional ou constitucional, cláusula pétrea, como ficaria. O resto foi falando ‘meu presidente Jair é Bolsonaro, votei 17, agora vou votar 38, no Aliança pelo Brasil’, e isso, sinceramente, essa estatização, isola, acaba com as manifestações, que são para reivindicar alguma coisa”, argumentou Caíque Januzzi, coordenador do MBL em Belo Horizonte.

Januzzi pontuou que “não dá para ir às ruas por qualquer coisa” e banalizar as manifestações. “A pessoa cansa, pensa que tem toda vez. As pessoas têm vida também, isso muita gente não olha, mas, por trás do militante, tem uma pessoa, tem família, isso cansa. Nos domingos em que poderíamos estar vendo Fórmula 1, futebol, estamos indo lá. É uma opinião minha, acho que as manifestações têm sido usadas de palanque político, têm sido utilizadas apenas como um meio para se atingir a eleição, a promoção pessoal. Você vê que a pessoa chega lá, sobe no caminhão, fala que está lá pelo presidente Bolsonaro, filma, joga nas redes sociais, e pronto, acabou a fala dela. Não falou do tema, não falou do que importa, só foi lá e mostrou-se submissa e subserviente ao Planalto”, disparou. 

Já Max Fernandes, porta-voz do movimento Vem pra Rua em Minas, também vê ligação entre o esvaziamento dos atos e as pautas políticas. Ele comparou ainda a baixa adesão nos atos pelo país aos realizados em Hong Kong, na Ásia.

“Lá, (as manifestações) estão sempre cheias e ocorrem todas as semanas. Por que isso não acontece aqui? Porque, acredito, que as pessoas estejam confusas a respeito de certos posicionamentos que o Executivo tem tomado atualmente em relação ao Legislativo e ao Judiciário, e isso desmobiliza naturalmente as pessoas. Nas manifestações anteriores, quando havia uma pauta única muito clara, vinculada (ao combate) à corrupção, era muito mais fácil para as pessoas compreenderem a mensagem e se engajarem”, destacou Max Fernandes.

Com a aproximação do pleito municipal, representantes de movimentos sociais admitem que os protestos podem crescer em 2020 e adquirir um cunho ainda mais político, já que muitas lideranças devem usar os atos como palanque partidário.

“Timing” errado, diz deputado

O deputado estadual Bruno Engler (PSL), que compareceu a várias manifestações em Belo Horizonte neste ano, avaliou que todas as pautas apresentadas foram válidas, mas que o timing de alguns atos poderia ter sido mais bem pensado. 

“Existem momentos em que a indignação é maior e você leva mais gente à rua, como, por exemplo, sobre a prisão em segunda instância. Logo que o STF revogou a prisão, a gente conseguiu colocar um número enorme de pessoas na praça da Liberdade. Praticamente um mês depois, foi feita outra manifestação contra a segunda instância, quando esse assunto não estava em evidência, aí o número foi muito menor. Então, acho que, às vezes, o timing de o assunto estar na mente das pessoas, estar provocando indignação, é que vai gerar um número grande ou pequeno de pessoas na manifestação. Mas não tiro os méritos de se fazer uma manifestação ‘fora do tempo’, por assim dizer, só que o resultado é menor”, pontuou o parlamentar. 

Embora entenda que uma manifestação não deva ser usada como palanque político – a não ser quando os atos são convocados estritamente para esse fim –, Engler disse que isso acaba se tornando inevitável.

“Se na manifestação você tem lideranças que querem se pronunciar e que, eventualmente, vão ser candidatos, o que você faz? Fala que por ser candidato não pode falar? Então, é uma questão que não tem muito como a gente controlar, mas acredito que a manifestação pode, sim, ser pautada pela indignação da população. Esse negócio de ficar chamando manifestação por candidato X ou Y para aparecer como ativista, eu acho uma grande bobagem, mas não acho que isso deva ocorrer em Belo Horizonte, não”, declarou.

Para o parlamentar, o aumento dos encontros neste ano se deve também à diversidade de grupos políticos que buscam externar seus respectivos anseios. Engler considera que “infelizmente” não existe um engajamento político no país capaz de levar a população à rua repetidas vezes, como se viu nas últimas semanas na Ásia.

“Se você faz uma manifestação a cada três meses, será uma manifestação muito grande. Agora, se você começa a fazer manifestação semana sim outra também, as pessoas vão se cansando, então acho que esse número menor de pessoas não se dá por uma falta de engajamento, mas pelo número maior de manifestações”, argumentou. 

Nos protestos em que esteve presente, Engler evitou fazer discursos em carros de som.