BRASÍLIA - O Conselho de Ética da Câmara aprovou, nesta terça-feira (6), a suspensão do mandato do deputado Gilvan da Federal (PL-ES), por 15 votos a 4. Ele ficará afastado de forma cautelar das funções por três meses por ofensas disparadas supostamente à ministra da Secretaria de Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann

O parecer favorável à suspensão foi apresentado pelo relator, deputado Ricardo Maia (MDB-BA). Gilvan poderia recorrer da decisão ao plenário da Câmara, que reúne os 513 deputados, mas informou que aceitará a punição e não apresentará recurso. 

O relatório aprovado, com suspensão de três meses, foi o segundo protocolado momentos antes da reunião. Na noite de segunda-feira (5), um primeiro parecer de Maia sugeria um afastamento cautelar de seis meses, como foi proposto originalmente.  

A redução da suspensão - sem resistência da base governista - e a disposição de Gilvan em não recorrer da decisão do Conselho de Ética foram atribuídas a um acordo construído nos bastidores. Afastado por três meses, o deputado não precisará passar a vaga para um suplente. 

O pedido cautelar foi apresentado pela Mesa Diretora da Câmara e assinado pelo presidente da Casa, Hugo Motta (Republicanos-PB). O argumento foi de que Gilvan cometeu quebra de decoro e comportamento “incompatível” com a dignidade do mandato, além de “ferir a honra” de Gleisi. 

“As falas do representado [Gilvan] excederam o direito constitucional à liberdade de expressão, caracterizando abuso de prerrogativas parlamentares além de, repise-se, ofenderem a dignidade da Câmara dos Deputados, de seus membros e de outras autoridades públicas”, diz o documento. 

O caso 

A punição foi pedida por falas de Gilvan da Federal na Comissão de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado em 29 de abril. Na ocasião, o deputado citou Gleisi como um exemplo de petistas que faziam ataques à Polícia Federal durante a investigação Lava Jato e fez menção às apurações que miravam a ministra. 

“Na Odebrecht, existia uma planilha de pagamento de propina a políticos. Eu citei aqui o nome ‘Lindinho’ e ‘Amante’, que devia ser uma prostituta do caramba. Teve até deputado que se revoltou. Ou seja, a carapuça serviu”, disparou. 

Durante a Lava Jato, o apelido “Amante” era atribuído a Gleisi no que seria uma planilha de propinas da construtora Odebrecht, enquanto “Lindinho” seria o deputado Lindbergh Farias (PT-RJ) - com quem Gilvan também protagonizou uma discussão. A atual ministra teve denúncias da Lava Jato contra ela rejeitadas e arquivadas, e foi absolvida em uma ação. 

Defesa 

Em defesa oficial protocolada no Conselho de Ética, Gilvan da Federal argumentou que “em nenhum momento se dirigiu a qualquer dos seus pares fazendo associação direta ou indireta que ensejasse conduta incompatível com o decoro parlamentar”.  

“A bem da verdade, quando o representado menciona a existência de uma lista conhecida no âmbito da operação Lava Jato com diversos vulgos, alcunhas e codinomes de eventuais beneficiados por propinas, ele se quer faz conexão ou associação com quem quer que seja, simplesmente reporta a existência da lista e nada mais”, justificou. 

O deputado acrescentou que a denúncia assinada por Motta foi apresentada de “forma açodada” e é “desprovido de provas cabais a demonstrar a quebra de decoro”. Ainda, que seu pronunciamento foi “tirado de contexto”. 

No parecer, o relator rebateu que “as expressões ofensivas, difamatórias e pessoalmente direcionadas à deputada licenciada GLEISI HOFFMANN, bem como o episódio de confronto verbal com o deputado LINDBERGH FARIAS, são materialmente documentados, sem margem para controvérsia quanto à autoria e ao conteúdo das declarações”. 

“As provas das alegações encontram-se devidamente acostadas aos autos [...], notadamente por meio das gravações oficiais da reunião da Comissão de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado, [...] amplamente divulgadas pela TV Câmara e pelas redes sociais institucionais, nas quais ficam evidentes as declarações desrespeitosas, reprováveis e incompatíveis com o decoro parlamentar”, completou Maia. 

Comportamento 

Na noite de segunda-feira, Gilvan da Federal fez um discurso no plenário da Câmara e declarou um compromisso de mudar seu comportamento. “Mesmo sendo atacado ou provocado pelo PT e pelo PSOL, assumo o compromisso de comunicar esse ataque à Mesa Diretora e não fazer o que eu vinha fazendo”, disse, em referência a seus discursos. 

Ele afirmou que embates entre deputados acontecem na Câmara, “mas, em hipótese alguma, pode-se partir para o lado pessoal, seja ofendendo pai, mãe, esposa”. “Se algum deputado se sentiu ofendido, eu discordo totalmente de ataques à família. [...] Eu peço desculpa a quem se sentiu ofendido e ao presidente da Câmara”. 

“Eu não estou falando aqui para não ser punido. Reconheço que, no calor da emoção, eu extrapolei. Assumo a responsabilidade e, se for punido, também aceito a punição”, completou. 

Em seguida, Motta disse que o discurso de Gilvan contra Gleisi excedeu a atuação parlamentar e que quando há discursos ofensivos, “quem vai para a lama é a imagem da Câmara dos Deputados”. “Tudo tem um limite do ponto de vista do exercício parlamentar”, alertou. 

Motta também afirmou que a disposição de Gilvan em mudar seu comportamento “engradece seu mandato”. “Isso, de certa forma, o coloca numa condição de reconhecimento de um excesso, reconhecimento de um erro. A primeira coisa a se fazer antes de nós termos a capacidade de construir uma solução é reconhecer que existe o problema, que existe ali certo arrependimento, para que a Casa possa se manifestar. Mas, enquanto presidente, podem ter certeza de que nós procuraremos sempre zelar pela ordem”. 

Histórico 

Esta não foi a primeira vez que um discurso polêmico de Gilvan da Federal chamou atenção na Câmara. Em 8 de abril, também em uma reunião da Comissão de Segurança Pública, ele disse que queria a morte do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). 

“Por mim, eu quero mais que o Lula morra, quero que ele vá para o quinto dos infernos. É um direito meu. Não vou dizer que eu vou matar o cara, mas eu quero que ele morra, que vá para o quinto dos infernos. Nem o diabo quer o Lula, por isso que ele está vivendo aí. Superou o câncer... tomara que ele tenha uma taquicardia, porque nem o diabo quer essa desgraça desse presidente que está afundando o país. Eu quero mais é que ele morra mesmo”, afirmou Gilvan da Federal.  

No dia seguinte, ele pediu desculpas. “Ontem, na Comissão de Segurança Pública, estávamos debatendo um projeto para desarmar os seguranças do descondenado Lula, e eu disse que, se ele tivesse um infarto ou uma taquicardia e morresse, eu não ia ficar triste. Um cristão não deve desejar a morte de ninguém. Então, eu não desejo a morte de qualquer pessoa”, disse.  

Gilvan da Federal completou: “Continuo entendendo que Luiz Inácio Lula da Silva deveria estar preso e pagar por seus crimes e por tudo o que fez de mal ao nosso país. Mas reconheço que exagerei na minha fala. Peço desculpa”. 

A Advocacia-Geral da União (AGU) chegou a pedir uma investigação criminal sobre as falas do deputado. O pedido foi enviado à Polícia Federal (PF) e à Procuradoria-Geral da República (PGR), para que as duas instituições adotassem providências cabíveis. A AGU informou que a declaração do deputado pode configurar, em tese, incitação ao crime e ameaça, previstos no Código Penal.