A Câmara de São Paulo deve instalar uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar as organizações não governamentais (ONGs) que atuam na Cracolândia, na região central de São Paulo. As assinaturas necessárias já foram recolhidas. A previsão é que os trabalhos comecem em fevereiro, quando os vereadores voltam das férias.

Um dos principais alvos da CPI é o padre Júlio Lancellotti, conhecido nacional e internacionalmente por fazer trabalhos em prol da população de rua, principalmente os que frequentam a região central da capital paulista, mais especificamente na Cracolândia.

O religioso tem sido alvo de constantes críticas de políticos e outras figuras de direita, por, entre outras coisas, ser contra medidas como remoção forçada de sem teto e internação compulsória de dependenetes químicos. Há quem acuse o padre de oportunismo e até de lucrar com o flagelo social.

Entenda abaixo os principais pontos sobre a CPI

  • Quem pediu a CPI:

A CPI das ONGs foi proposta pelo vereador Rubinho Nunes (União Brasil), cofundador do Movimento Brasil Livre (MBL) e ex-advogado do ex-deputado estadual e ex-integrante do MBL Arthur do Val, conhecido como Mamãe Falei, cassado pela Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) em 2022 por quebra de decoro parlamentar, após vídeo misógino contra ucranianas que fugiam dos ataques russos.

Rubinho Nunes, que está em seu segundo mandato consecutivo de vereador, deixou o MBL em outubro de 2022. Ele atuava como advogado do movimento e liderou manifestações que precederam o impeachment de Dilma Rousseff (PT). De 2011 até hoje, Nunes integrou seis partidos: PR, MDB, Patriota, PSL, Podemos e União Brasil.

  • O que a CPI quer investigar:

Filho do também vereador Rubens Nunes (Podemos), Rubinho, que teve o “estado mínimo” como uma de suas bandeiras, já declarou que Júlio Lancellotti é um dos principais alvos da CPI que tenta emplacar. Ele acusa as ONGs de promoverem uma “máfia da miséria”, que “explora os dependentes químicos do centro da capital”. 

O vereador diz que duas entidades serão prioridade nas investigações conduzidas pela comissão: o Centro Social Nossa Senhora do Bom Parto, conhecido como Bompar, e a Craco Resiste. Rubinho vincula o Bompar ao padre Júlio.

  • O que diz Padre Júlio

O religioso já declarou, mais de uma vez, que conta apenas com doações e voluntários, não dirige nem tem parceria formal com nenhuma instituição. Integra apenas a Paróquia São Miguel Arcanjo. Também já disse que apenas foi conselheiro, não remunerado, da Bompar. Deixou há 17 anos a posição no conselho deliberativo da entidade.

  • Qual o pano de fundo da CPI

Por trás da CPI está a disputa eleitoral de 2024. Lancellotti é próximo de Guilherme Boulos (PSOL), um dos pré-candidatos à Prefeitura de São Paulo. Rubinho apoiará a reeleição de Ricardo Nunes (MDB).

  • Polêmica nas redes

A iniciativa de Rubinho Nunes para investigar o padre Júlio Lancellotti provocou embates nas redes sociais, com personalidades e entidades ligadas à esquerda criticando a abertura da CPI das ONGs. O nome do religioso foi parar nas trends das redes sociais. 

Arquidiocese de SP diz estar perplexa com CPI contra padre

A Arquidiocese de São Paulo afirma que acompanha “com perplexidade” a possível abertura de uma CPI com o padre Júlio Lancellotti como alvo.

“Na qualidade de Vigário Episcopal para a Pastoral do Povo da Rua, Padre Júlio exerce o importante trabalho de coordenação, articulação e animação dos vários serviços pastorais voltados ao atendimento, acolhida e cuidado das pessoas em situação de rua na cidade”, diz nota do órgão da Igreja Católica.

“Reiteramos a importância de que, em nome da Igreja, continuem a ser realizadas as obras de misericórdia junto aos mais pobres e sofredores da sociedade”, conclui o texto.

A população de rua na cidade de São Paulo aumentou 31% durante a pandemia de Covid-19, passando de 24,3 mil em 2019 para 31,9 mil em 2021. Em relação a 2015, quando havia 15,9 mil moradores de rua, o número dobrou. Os números são de um censo realizado pela prefeitura.