O voto favorável do líder do governo Lula no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), à proposta que limita a atuação de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) escancarou um racha na articulação governista dentro do Congresso Nacional. Ele foi o único da bancada do PT a se manifestar favorável ao tema, aprovado na noite de quarta-feira (22) com 52 votos, apenas três a mais do que o mínimo necessário. Foram contrários 18 senadores.

Apesar de o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) indicar que não interfere em decisões da Câmara e do Senado, houve torcida contrária e integrante da base que trabalhou pela derrubada do texto. É o caso do líder do governo no Congresso, senador Randolfe Rodrigues (sem partido-AP), que classificou a proposta como "uma reação ao papel do Supremo, que garantiu a normalidade democrática diante da iminência de ruptura institucional".

Lula também exonerou o ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, para retornar ao mandato de senador e garantir um voto contrário à proposta. O movimento é utilizado por governos quando há articulação política por algum projeto e risco de derrota.

A avaliação foi a de que Jaques Wagner decidiu seguir o presidente do Congresso Nacional, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), que, internamente, tem tratado o tema como "questão de honra". De qualquer forma, o posicionamento coloca o líder do governo Lula numa ala que tem amplamente a presença da oposição, que garantiu a aprovação do tema ao apontar descontentamento com a atuação dos ministros do STF.

Na sessão, Jaques havia dito que o governo entende que o tema deve ser tratado entre o Legislativo e o Judiciário, indicando a não interferência. Logo depois, liberou o voto da bancada e defendeu o texto declarando que era sua posição como senador, fora da função de liderança, mesmo que isso fosse "indissociável".

"Eu entendo que fizeram, e eu me orgulho de ter participado, um movimento exatamente no sentido de minimizar ou diminuir as diferenças que poderiam, vou chamar assim, incomodar, ou serem interpretadas equivocadamente como uma intromissão do Legislativo na Corte Superior.
Com esta evolução e, na minha opinião, entendendo que nenhuma decisão deva ficar ad infinitum guardada, eu quero anunciar que meu voto será o voto 'sim', a favor da PEC", declarou minutos antes da votação.

A partir de agora, o governo assume uma posição de maior atenção ao debate sobre o tema na Câmara dos Deputados, próximo local de votação. A análise é de que o Senado é um ambiente mais pactuado e, com isso, pode-se esperar um embate intenso entre os deputados, que costumam ter reações incisivas e tons mais duros contra os ministros do STF. E não há nenhum interesse por parte de Lula em gerar mal-estar na relação entre o governo e o Judiciário.

Entenda o texto que limita a atuação de ministros do STF

De autoria do líder do Podemos no Senado, Oriovisto Guimarães (PR), a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) tem como alvo principal as decisões monocráticas, aquelas tomadas por um único ministro em Tribunais Superiores. De acordo com a PEC, elas não poderão ser emitidas para suspender a eficácia de uma lei.

Já em períodos de recesso do Poder Judiciário, quando o presidente da Corte, geralmente de plantão, fica apto a tomar decisões de forma monocrática, essa prerrogativa é mantida. Porém, o ato deverá ser julgado pelo plenário do Tribunal em até 30 dias.

O relator, senador Esperidião Amin (PP-SC), acatou uma emenda que retirou as mudanças feitas nas regras para os pedidos de vista - quando um ministro pede mais tempo para analisar o caso. O texto fixava em até seis meses o prazo para pedidos de vista. Segundo a redação, eles poderiam ser concedidos apenas coletivamente. Com o recuo de Amin, seguem válidas as normas atuais.

A PEC é parte de um pacote em análise pelo Senado, em resposta a seguidas decisões do STF, como o julgamento que pode descriminalizar o porte de drogas e o que declarou inconstitucional o marco temporal das terras indígenas. Porém, Pacheco nega que haja algum tipo de “retaliação” ao Supremo: "Não é resposta, não é retaliação, não é nenhum tipo de revanchismo. Não temos nem motivo para isso", afirmou.