A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Câmara Municipal de Belo Horizonte que investigará o pagamento de R$ 1,7 bilhão da prefeitura à empreiteira Andrade Gutierrez (AG) elegeu, na tarde de ontem, o vereador Pedro Patrus (PT) para a presidência e o vereador Jair Di Gregório (PP) para a relatoria do colegiado.
O pagamento sob suspeita foi feito em 14 parcelas anuais. A dívida seria relativa às obras da construção do túnel da Lagoinha, da canalização do ribeirão Arrudas e da remoção de aguapés da lagoa da Pampulha.
Como mostrou a edição de ontem de O TEMPO, há a suspeita de que em Belo Horizonte tenha sido utilizado o mesmo modus operandi praticado em Betim. Na cidade da região metropolitana, o documento usado pela Andrade Gutierrez para cobrar R$ 480 milhões contém assinaturas falsas, segundo laudo grafotécnico apresentado pela atual gestão municipal.
Pedro Patrus e Jair Di Gregório foram eleitos em votações separadas, por 4 votos a 3. Houve um racha na CPI: de um lado, derrotados, ficaram os vereadores Mateus Simões (Novo), Catatau do Povo (PHS) e Irlan Melo (PL); do outro, os vereadores Preto (DEM), Gilson Reis (PCdoB), Jair Di Gregório e Pedro Patrus.
No grupo que acabou derrotado, o vereador Catatau do Povo foi o candidato a presidente da CPI e o vereador Mateus Simões tentou a relatoria. Durante a reunião, Simões defendeu que o relator fosse alguém que não tivesse ligação com os prefeitos do período que será investigado pela CPI.
“A eleição de ‘coaliados’ dos investigados, para mim, mostra que a pizza desta CPI já foi para o forno. Agora é esperar para ver se ela vai ser efetivamente assada ou se nós teremos a oportunidade de investigar a verdade”, disse.
O vereador Pedro Patrus é do mesmo partido do ex-prefeito de Belo Horizonte Fernando Pimentel (PT), que foi secretário de Fazenda do governo Célio de Castro em 1998, ano em que o acordo com a Andrade foi feito.
Já o vereador Jair Di Gregório foi funcionário da Prefeitura de Belo Horizonte durante a gestão do então prefeito Marcio Lacerda, que realizou o pagamento das últimas parcelas do acordo. Uma delas foi quitada em 2013, fora do prazo do acordo que terminou em 2012.
“Eu vou trabalhar com muita força como relator para que a gente faça um excelente relatório. Se houver culpados, eles serão punidos. Se tiver que devolver dinheiro para os cofres de BH, vai ser devolvido. O que tiver que ser feito nós vamos fazer, e ninguém vai conseguir nos intimidar”, disse o relator Jair Di Gregório.
“O vereador Mateus Simões me conhece pouco e não sabe da minha seriedade. Pode ter certeza: não tem essa de PT ou outro partido. Nós aqui atuamos e somos vereadores da cidade. Essa CPI não tem partido. Vamos apurar possíveis irregularidades de dívidas pagas com o dinheiro público a empresas privadas”, afirmou o presidente da CPI, Pedro Patrus.
Na reunião, ficou decidido que, na próxima sexta-feira, Jair Di Gregório apresentará o cronograma dos trabalhos da CPI. O encontro será o último antes do recesso parlamentar. Os trabalhos da comissão começam em fevereiro do ano que vem, quando termina o recesso.
Semelhanças com Betim
Em caso similar ao que se investiga em Belo Horizonte, a construtora Andrade Gutierrez cobra da Prefeitura de Betim o pagamento de R$ 480 milhões por obras que teriam sido feitas na década de 80.
Na cidade da região metropolitana, a cobrança da empreiteira é baseada em um termo de confissão de dívida assinado pelo então prefeito Osvaldo Franco no início dos anos 80. Porém, a Prefeitura de Betim pediu que fosse feito um laudo grafotécnico no documento. A perícia concluiu que a assinatura é falsa.
Já em Belo Horizonte, a suspeita recai sobre a assinatura do então chefe da Superintendência de Desenvolvimento da Capital (Sudecap), Dario Rutier Duarte, no Termo Aditivo 04.
É esse aditivo que teria permitido à Andrade Gutierrez cobrar da Prefeitura de Belo Horizonte R$ 143 milhões, que, com juros e correção, chegaram a R$ 1,7 bilhão.
"Os dois casos são em tudo sincrônicos, inclusive no que diz respeito a datas. Nós temos aqui, em Belo Horizonte, obras feitas nas décadas de 70 e 80; confissões de dívida assinadas sem nenhum lastro documental e depois acordos que tentaram ser feitos para o pagamento (nos anos 90). Tudo como Betim”, afirmou o vereador Mateus Simões.
“A diferença é que Betim não pagou e conseguiu judicialmente a suspensão. Belo Horizonte já pagou. Lá em Betim, estão tentando evitar que o prejuízo seja causado. Aqui, nós estamos tentando investigar se o prejuízo já não foi causado”, completou.
Em novembro, o Tribunal de Justiça de Minas (TJMG) suspendeu o bloqueio de R$ 47,8 milhões que estava previsto nas contas de Betim para o pagamento de parte da dívida.