Se a principal atividade de Sergio Moro enquanto juiz federal era investigar políticos acusados de praticar corrupção, agora, como novo ministro da Justiça, ele vai precisar até mesmo da ajuda de parlamentares que estiveram sob a sua mira na operação Lava Jato para conseguir aprovar no Congresso Nacional propostas prioritárias para o ministério. Na avaliação de deputados federais e senadores, o responsável pela maior investigação de corrupção e lavagem de dinheiro que o Brasil já teve vai ter que aprender a fazer política e negociar.
Ao ser empossado ministro, na última semana, Moro disse que seu objetivo prioritário vai ser apresentar um projeto anticrime no início da legislatura, em fevereiro, e “lutar para convencer, com respeito e toda a abertura ao diálogo, os parlamentares”. Um dos pontos da proposta, no entanto, pode não atender o desejo da maioria dos congressistas: deixar claro na lei a obrigatoriedade da prisão logo após o julgamento em segunda instância. Na prática, isso significa que os réus sejam presos antes do esgotamento de todos os recursos disponíveis na Justiça.
Em 2016, o Supremo Tribunal Federal (STF) passou a permitir a execução da pena após condenação em segunda instância – o tema volta à pauta da Corte em março. Isso facilitou a prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Os petistas, inclusive, criticam fortemente Moro por ter autorizado a detenção. E é justamente com o partido que o Moro vai ter que negociar para viabilizar a aprovação do projeto, uma vez que o PT possui a maior bancada na Câmara dos Deputados, com 56 parlamentares.
O trabalho de convencimento de Moro também vai ter que ser feito com outros descontentes, já que vários políticos eleitos estiveram na mira da Lava Jato, entre eles o senador mineiro Aécio Neves (PSDB), que vai assumir uma cadeira na Câmara, e o senador Renan Calheiros (MDB-AL). Esse ponto crucial do projeto também atrapalharia a vida de outros políticos. Um levantamento do jornal “O Estado de S. Paulo” mostra que um terço do Congresso Nacional que vai assumir em fevereiro é investigado por algum tipo de crime (veja AQUI), o que representa 38 dos 81 senadores e 160 dos 513 deputados federais.
Avaliação. De acordo com o deputado federal petista Patrus Ananias, leis e medidas que visam ao combate à corrupção são bem-vindas para todas as pessoas que atuam em prol do país e a bancada de esquerda está aberta ao diálogo, mas é preciso entender de que forma essas políticas serão feitas e a quem beneficiarão.
“Claro que nós, que fazemos políticas com compromissos éticos, queremos combater a corrupção do país. Mas nós sabemos também que, muitas vezes, causas justas são utilizadas de formas avessas, para atender determinados projetos. Então, é preciso saber se essas leis são para combater a corrupção em todos os níveis ou se há apenas um lado político”, ponderou o petista. Patrus ainda criticou o fato de Moro ter aceitado assumir o cargo de ministro, o que, segundo ele, “escancarou um alinhamento ideológico”.
O deputado federal tucano Rodrigo de Castro acredita que o ministro vai ter que dialogar com o Congresso, uma vez que agora deixa de ser juiz e passa ser um agente político. “Ele tem uma função de ministro que é, principalmente, política e, portanto, tem que ter um diálogo com os parlamentares”, afirmou. “Eu acho que todas as medidas que forem benéficas para combater a impunidade e a violência terão apoio. Agora, é claro que o Congresso é soberano e vai analisar cada uma de maneira concreta”, defendeu Castro.
O vice-presidente da Câmara, Fábio Ramalho (MDB), declarou que o Congresso deve atuar de forma independente e que a função do parlamento é sempre dialogar. “Não haverá portas fechadas para ninguém no Congresso”, afirmou.
Proposta
“Um dos objetivos prioritários do Ministério da Justiça será apresentar um projeto de lei anticrime já no início da próxima legislatura e lutar para convencer, com respeito e toda a abertura ao diálogo, os parlamentares. São propostas simples, mas muito eficazes.”
Sergio Moro, ministro da Justiça
Credibilidade pode ajudar na articulação
O alinhamento do ministro da Justiça, Sergio Moro, com a opinião pública é o grande trunfo que o ex-juiz terá para aprovar suas medidas anticorrupção, na avaliação de congressistas novatos. Outro fator que pode ajudar é o “medo” que alguns políticos têm dele, depois que Moro se tornou uma das referências no país por conta da atuação na operação Lava Jato.
“Tietado” por populares, Moro foi aclamado pela opinião pública quando anunciado como ministro. No entanto, os que consideraram a atuação do juiz parcial lembraram que ele dizia que “jamais entraria para a política”. Na última semana, para justificar sua decisão de deixar a magistratura, Moro declarou que, ocupando um cargo na União, pode fazer mais para o combate à corrupção.
O deputado federal eleito Lucas Gonzalez (Novo-MG) concorda que o respaldo popular vai ajudar a passar as propostas do ministro. “A credibilidade que Sergio Moro construiu, a força da opinião pública e a importância do tema no atual momento do país são fatores que vão permitir que as propostas sejam aprovadas”, afirmou.
O também deputado eleito Cabo Júnio Amaral (PSL-MG) acredita que a “credibilidade de Moro vai ajudar a convencer o parlamento”. “Seria interessante ver Moro intermediando junto ao Congresso, até porque muitos lá têm medo dele. E quem sabe esse intermédio ajude a convencer os demais parlamentares que não estejam tão inclinados a promover mudanças no país”, disse.