BRASÍLIA - Trinta ex-chefes de Estado, além dos governos da Espanha e de países da América Latina assinam uma carta enviada ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) pedindo o compromisso com a democracia na Venezuela, em meio à crise política deflagrada no país caribenho após a eleição de 28 de julho, que oficialmente tem Nicolás Maduro como vencedor.

“Os ex-Chefes de Estado e de Governo que subscrevem esta mensagem, membros da Iniciativa Democrática da Espanha e das Américas (Idea), exortamos a Luiz Inácio Lula da Silva, presidente da República Federativa do Brasil, a reafirmar seu inquestionável compromisso com a democracia e a liberdade, as mesmas de que gozam seu povo, e a fazê-la prevalecer também na Venezuela”, diz trecho da carta.

O Idea é composto por 37 ex-líderes mundiais. O mesmo grupo pediu a Lula, na semana passada, que reconhecesse a vitória do candidato oposicionista Edmundo González. Entre os que assinam a carta endereçada ao brasileiro estão os ex-presidentes Maurício Macri, da Argentina; Álvaro Uribe e Iván Duque; Vicente Fox, do México; Guillermo Lasso, do Equador; Carlos Mesa, da Bolívia.

Lula discute com Boric a crise na Venezuela

Lula foi recebido nesta segunda-feira (5) pelo presidente chileno, Gabriel Boric, no Palácio de La Moneda. Os dois líderes de esquerda, que planejam assinar uma declaração conjunta ao término do encontro, têm assumido posições divergentes em relação às eleições de 28 de julho na Venezuela.

Um dos maiores críticos de Maduro, Boric,  foi um dos primeiros líderes a questionar os resultados, considerando-os “difíceis de acreditar” e exigindo transparência. Em retaliação, o governo venezuelano expulsou o pessoal diplomático de Santiago em Caracas.

Lula demorou dois dias para se pronunciar sobre as eleições na Venezuela. Embora tenha dito se tratar de “um processo normal, tranquilo”, o presidente brasileiro fez um apelo para que as atas eleitorais sejam publicadas, como exigem vários governos, em apoio às suspeitas de fraude denunciadas pela oposição.

Em um comunicado conjunto publicado em 1º de agosto, Brasil, Colômbia e México instaram o regime venezuelano a avançar de maneira rápida na divulgação das atas eleitorais, um posicionamento que posteriormente recebeu apoio de Boric.

União Europeia também não reconhece vitória de Maduro

No domingo, a União Europeia (UE) aumentou a pressão internacional sobre Maduro, ao se somar aos Estados Unidos e aos países da América Latina que não reconhecem o resultado das eleições de 28 de julho.

“Na ausência de provas que os respaldem, os resultados divulgados em 2 de agosto pelo Conselho Nacional Eleitoral não podem ser reconhecidos”, ressaltou o Conselho da União Europeia, que exigiu “uma verificação independente”.

Por outro lado, diferentemente dos Estados Unidos e de outros países – Peru, Argentina, Uruguai, Equador, Costa Rica e Panamá –, a UE se absteve de reconhecer a vitória do candidato opositor, Edmundo González Urrutia.

“As cópias das atas eleitorais divulgadas pela oposição e revisadas por organizações independentes indicam que Edmundo González Urrutia parece ter vencido as eleições presidenciais por uma maioria significativa. A União Europeia pede, portanto, uma nova verificação independente das atas eleitorais, se possível por uma entidade de reputação internacional”, diz o comunicado.

A UE também pediu ao governo venezuelano “que ponha fim às prisões arbitrárias, à repressão e à retórica violenta contra os membros da oposição e da sociedade civil, e que liberte todos os presos políticos”.

Nesta segunda-feira, o papa Francisco pediu no Vaticano para se “buscar a verdade” na Venezuela, Já a líder opositora María Corina Machado agradeceu aos países europeus que, no sábado (2), pediram a divulgação das atas de votação.

Em uma declaração publicada pelo governo italiano, os sete países europeus expressaram “forte preocupação” e pediram às autoridades venezuelanas "publicar rapidamente todos os registros” das eleições para garantir a “total transparência”.

Atas ainda não foram divulgadas, uma semana após votação

Maduro foi confirmado pelo Conselho Nacional Eleitoral (CNE) como presidente reeleito, com 52% dos votos, contra 43% para o opositor Edmundo González Urrutia. 

Com isso, o governante de esquerda assumiria um terceiro mandato, projetando-se para um total de 18 anos no poder. A oposição, no entanto, publicou em um site atas que dariam a González 67% dos votos.

Nesta segunda-feira, o CNE informou que vai entregar esta semana ao Judiciário as atas eleitorais. O Tribunal Superior de Justiça (TSJ) também pediu os documentos que comprovariam o ataque cibernético que teria atrasado os trabalhos do CNE, alegado por Maduro.  

A decisão do TSJ publicada na sexta-feira (2) determinou que o CNE apresente, em três dias úteis a partir da sua notificação:

  • as atas de votação das mesas eleitorais à nível nacional;
  • a ata de totalização definitiva do processo eleitoral;
  • a ata de adjudicação e a ata de proclamação do processo.

Na sexta-feira (2), uma audiência foi convocada pelo TSJ, e o principal candidato opositor, Edmundo González, não compareceu à reunião. Tanto o CNE como o TSJ são controlados pelo regime de Maduro

Em uma rede social, Edmundo disse que seria dever do CNE garantir a transparência e confiabilidade dos processos eleitorais “sem omissão de sua parte e eventualmente uma usurpação de funções por parte de outro órgão do Estado”.

Ao apresentar o recurso ao STJ, Maduro informou que estava pronto para entregar 100% das atas que estão com o partido do governo PSUV e pediu para que os demais candidatos e partidos fizessem o mesmo. 

No sistema venezuelano, ao fim da votação em cada urna, um boletim é impresso com o resultado entregue aos fiscais presentes, que assinam o documento que também é enviado eletronicamente ao CNE.

Governos do Brasil e da Venezuela firmam acordo para custódia de embaixadas

Os governos do Brasil e da Venezuela divulgaram nesta segunda-feira  a assinatura de um acordo para a custódia das embaixadas do Peru e da Argentina em Caracas por diplomatas brasileiros. 

Representantes do Brasil e da Venezuela formalizaram o que na prática vem ocorrendo desde quinta-feira (1º), quando diplomatas peruanos e argentinos deixaram o país caribenho após serem expulsos por Nicolás Maduro.

O regime chavista tem tomado a medida com os países que rejeitam a vitória de Maduro na eleição de 28 de julho. O Brasil ainda não reconheceu nem rejeitou o resultado.

Assim como outras nações, o Brasil pede a divulgação das atas eleitorais por mesa de votação do pleito presidencial. A oposição acusa fraude. Desde o dia seguinte ao pleito, venezuelanos foram às ruas contra Maduro em diferentes cidades.