Mistério na Amazônia

Bolsonaro diz que inglês e brasileiro podem ter sido mortos e fala em 'aventura'

A dupla estava na Terra Indígena Vale do Javari, que é frequentemente alvo de invasões de garimpeiros ilegais

Por Renato Alves
Publicado em 07 de junho de 2022 | 13:47
 
 
 
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O presidente Jair Bolsonaro (PL) disse nesta terça-feira (7) que o indigenista brasileiro Bruno Araújo Pereira, da Fundação Nacional do Índio (Funai), e o jornalista inglês Dom Phillips, colaborador do The Guardian, podem ter sido executados ou sofrido um acidente. 

Bolsonaro afirmou duas vezes, em entrevista ao SBT, que "tudo pode acontecer" nessa região, classificada por ele como "selvagem", e criticou o que chamou de "aventura" da dupla.

"Realmente, duas pessoas apenas num barco, numa região daquela completamente selvagem é uma aventura que não é recomendada que se faça. Tudo pode acontecer. Pode ser acidente, pode ser que tenham sido executados", afirmou.

O presidente acrescentou que espera que ambos estejam vivos.

"[A gente] Espera e pede a Deus que sejam encontrados brevemente. As Forças Armadas estão trabalhando com muito afinco na região", completou.

Pereira e Phillips desapareceram quando viajavam a trabalho, no domingo (5), e retornavam da comunidade São Rafael em direção à cidade de Atalaia do Norte, na Amazônia.

O indigenista, que está em licença na Funai, guiava o jornalista na Terra Indígena Vale do Javari, que é frequentemente alvo de invasões de garimpeiros ilegais.

No governo Bolsonaro, a prática se tornou mais frequente em alguns locais na Amazônia, com uma fiscalização menos presente, em especial em territórios indígenas.

Ainda na entrevista ao SBT, Bolsonaro disse que não demarcou terras indígenas, quilombolas e de proteção ambiental, porque "já tem demais", não por ser "malvadão". Ele também defendeu o marco temporal, que está em discussão hoje no Supremo Tribunal Federal (STF) e é defendida por ruralistas.

"Você não viu eu demarcando terra, demarcando [território] quilombolas, área de proteção ambiental. Nada. Não é porque eu sou malvadão. Já tem demais. Você não acha que é demais uma área do tamanho da região Sudeste, São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Espírito Santo, demarcada como terra indígena? Quer demarcar outra área do tamanho disso aí. Segundo uma proposta que tá circulando no STF", afirmou o presidente.

Itamaraty garante empenho em buscas e admite possibilidade de crime

Mais de 24 horas após o caso vir à tona, o Ministério das Relações Exteriores (MRE) emitiu uma nota oficial sobre o desaparecimento de Dom Phillips e Bruno Araújo Pereira.

“Mobilizado desde logo, o Departamento de Polícia Federal (PF) está atuando naquela região e tomando todas as providências para localizá-los o mais rápido possível. A PF fez repetidas incursões e tem contado com o apoio da Marinha do Brasil, que se somou aos esforços nos trabalhos de buscas de ambos os cidadãos”, garantiu o MRE, por meio da nota divulgada nesta terça-feira.

O Itamaraty garantiu que o governo brasileiro “seguirá acompanhando as buscas com o zelo que o caso demanda e envidando os esforços necessários para encontrar prontamente o profissional da imprensa britânica e o servidor da Fundação Nacional do Índio”.

O ministério disse ainda que “na hipótese de o desaparecimento ter sido causado por atividade criminosa, todas as providências serão tomadas para levar os perpetradores à Justiça”. 

Por fim, salientou que “os familiares e colegas de trabalho dos desaparecidos serão mantidos a par do progresso das buscas”.

Irmã e esposa fizeram apelos às autoridades brasileiras 

A irmã e a mulher do jornalista britânico que desapareceu na Amazônia fizeram apelos às autoridades, na segunda-feira (6). 

Ambas usaram as redes sociais para pedir celeridade na busca por Dom Phillips e Bruno Pereira.

A brasileira Alessandra Sampaio, que mora com Dom Phillips em Salvador, ressaltou que “cada segundo conta, cada segundo pode ser a diferença entre a vida e a morte".

"Tudo o que posso fazer é rezar para que Dom e Bruno [Araújo Pereira] estejam bem, em algum lugar, e incapazes de continuar com sua jornada por causa de algum problema mecânico, e que tudo isso acabe sendo apenas mais uma história nestas vidas completas deles", completou e mulher do britânico.

Como um segundo dia de buscas chegou ao fim sem qualquer sinal dos dois, a irmã do jornalista, Sian Phillips, fez uma declaração em vídeo. 

“Meu irmão Dom vive no Brasil com a mulher dele, ele ama o país e se preocupa muito com as pessoas lá. Sabíamos que era um lugar perigoso, mas Dom realmente acreditava que era possível proteger a natureza e o sustento dos povos indígenas”, observou.

Ela pediu que as autoridades brasileiras sejam mais rápidas na busca pelo irmão. 

"Estamos realmente preocupados com ele e pedimos às autoridades brasileiras que façam tudo o que puderem para procurar as rotas que ele seguia. Se alguém pode ajudar a aumentar os recursos para a busca, isso seria ótimo porque o tempo é crucial”, emendou.

Segundo o Guardian, Phillips está trabalhando em um livro sobre meio ambiente com apoio da Fundação Alicia Patterson. 

Marinha reforça buscas com helicóptero

Com a crescente pressão, dentro e fora do país, para informações sobre o paradeiro do indigenista brasileiro do jornalista inglês, a Marinha do Brasil decidiu reforçar a equipe de buscas à dupla.

A força militar enviou um helicóptero do 1º Esquadrão de Emprego Geral do Noroeste, duas embarcações e uma moto aquática à região do Vale do Javari, no extremo oeste do estado do Amazonas, onde homens e uma lancha começaram as buscas na segunda-feira, quando o caso veio à tona.

“Durante toda a tarde [de segunda-feira] foram realizadas ações nos rios Javari, Itaquaí e Ituí, no interior do Amazonas”, informou a Marinha em nota.

O Ministério Público Federal (MPF) instaurou, na segunda-feira, um procedimento administrativo para apurar o desaparecimento do jornalista e do indigenista. O órgão também acionou a Marinha, as polícias Civil e Federal, a Força Nacional e a Frente de Proteção Etnoambiental do Vale do Javari para participar das buscas.

"O MPF seguirá intermediando as ações de buscas e mobilizando as forças para assegurar a atuação integrada e articulada das autoridades, visando solucionar o caso o mais rápido possível", disse o órgão, também por meio de nota.

A Polícia Federal instaurou inquérito para apurar o desaparecimento e prendeu dois suspeitos, ainda no domingo. Um deles é um pescador conhecido como Churrasco, com quem Bruno iria se encontrar no domingo. A PF não deu mais informações. 

Dupla visitou comunidades para entrevistas

De acordo com a União dos Povos Indígenas do Vale do Javari (Univaja), Bruno Pereira e Dom Phillips se deslocaram para visitar a equipe de vigilância indígena que se encontra próxima ao Lago do Jaburu. 

O jornalista pretendia realizar algumas entrevistas com os habitantes daquela região. Segundo informações iniciais, o indigenista e o jornalista desapareceram quando faziam o trajeto da comunidade Ribeirinha São Rafael até a cidade de Atalaia do Norte, no Amazonas.

A Univaja destacou que Bruno era alvo constante de ameaças pelo trabalho que vinha fazendo com os indígenas contra invasores. Ele atua na Funai desde 2010. (Com Folhapress e Estadão Conteúdo)

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