BRASÍLIA - O juiz da 12ª Vara Federal Criminal em Brasília David Wilson de Abreu Pardo condenou o ex-assessor da Presidência da República Filipe Martins por um gesto considerado racista. O caso ocorreu em março de 2021 durante uma sessão do Senado.
Martins era assessor especial para Assuntos Internacionais da Presidência no governo de Jair Bolsonaro e assistia ao discurso do então ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo. O chanceler falava sobre os esforços do Itamaraty para garantir a compra de vacinas contra a Covid.
Quando foi a vez do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), falar, Felipe Martins fez um movimento com os dedos indicador e polegar da mão direita, unindo-os de forma arredondada e passando-os sobre o paletó que usava. A sessão estava sendo televisionada.
O gesto foi considerado indecoroso por parlamentares que o associaram a uma saudação conhecida entre grupos supremacistas brancos, que se consideram uma raça superior ao resto dos humanos. A forma com que os dedos estavam posicionados cria as letras WP, de "white power", ou poder branco na tradução literal.
O Ministério Público Federal, então, denunciou o ex-assessor de Bolsonaro e o caso foi levado à Justiça Federal de Brasília
Felipe terá que pagar multas e prestar serviços comunitários
O juiz David Wilson de Abreu Pardo entendeu que a atitude de Martins se enquadrava na Lei de Crimes Raciais, mais especificamente no artigo que trata de "praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou origem nacional".
O ex-assessor foi condenado a uma pena de dois anos e quatro meses de prisão em regime inicial aberto. A pena, no entanto, foi convertida em medidas restritivas de direitos, que incluem o cumprimento de 850 horas de serviços comunitários; o pagamento de R$ 1 mil por 14 meses a uma instituição social indicada pelo Judiciário; o pagamento de R$ 8,2 mil de multa; e a indenização de R$ 30 mil por danos morais. Por ser em primeira instância, a decisão ainda cabe recurso.
Em 8 de fevereiro de 2024 Filipe foi preso pela Polícia Federal durante uma operação que investiga um suposto plano de golpe de Estado que teria como objetivo manter o ex-presidente Bolsonaro no poder.
O que alega a defesa do ex-assessor de Bolsonaro
A defesa de Felipe Martins argumentou que ele não havia feito o gesto de forma voluntária, com intenção de se associar a um símbolo racista ou supremacista. Ela alegou ainda que as imagens apresentadas como prova não eram suficientemente claras para comprovar a acusação, já que o gesto, registrado por apenas alguns segundos, não correspondia à descrição fornecida pelo Ministério Público Federal.
Os advogados também defenderam a rejeição da denúncia e a absolvição do réu, argumentando falta de elementos suficientes para criminalizar o gesto.
Na sentença, de 81 páginas, divulgada na última segunda-feira (16), o juiz detalhou as provas, especialmente as imagens da sessão no Senado, que comprovariam a intenção de Martins.
Para o magistrado ficou evidente que o ex-assessor presidencial realizou o gesto de forma consciente e intencional, sem tratar-se de um simples ajuste na lapela do paletó. Ele ressaltou ainda que o sinal com os dedos foi feito enquanto Martins olhava para a tela que transmitia sua imagem, demonstrando plena consciência de sua ação.
"Este gesto tem um significado inequivocamente discriminatório, pois reforça a ideia de superioridade das pessoas brancas em relação às demais raças. A amplitude da manifestação e seu impacto são claros, pois o réu aproveitou a visibilidade proporcionada pela transmissão pública do Senado, alcançando uma audiência enorme", concluiu o a decisão judicial.