Trocas de mensagens extraídas por peritos da Polícia Federal do telefone celular do senador Marcos do Val (Podemos-ES) detalham como ele se referia a um suposto plano de golpe de Estado que diz ter tratado em reunião com o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e o ex-deputado federal Daniel Silveira.

Do Val é investigado pela PF por tentativa de obstruir as investigações e, nesse caso, contou várias versões diferentes. Em junho, uma operação da PF apreendeu outros aparelhos telefônicos, pendrives e computadores em endereços ligados a ele em Brasília e no Espírito Santo.

O senador já disse publicamente que havia um plano para impedir a posse de Luiz Inácio Lula da Silva e manter Bolsonaro na Presidência da República. Ele apontou Daniel Silveira como mentor. O ex-deputado está preso. Já o ex-presidente depõe à PF nesta quarta-feira (12) sobre o plano golpsta de Do Val e Silveira.

Nas conversas vazadas em reportagens publicadas nesta quarta, em um grupo no WhatsApp, o senador falou de uma suposta trama para impedir a posse de Lula. A informação foi divulgada pelo jornal O Globo. O portal Metrópoles trouxe outros diálogos.

Em uma das mensagens, Do Val diz que está “com a bomba na mão para destruir Bolsonaro e outra para destruir Lula”. Em outro trecho, o senador se coloca na seguinte posição de importância: “simplesmente está em minhas mãos o destino de dois presidentes”.

Reportagem de O Globo mostra que o plano de golpe Estado tratado com todo sigilo por Daniel Silveira foi compartilhado por Marcos do Val com ao menos seis pessoas.

O relatório da PF sobre o celular do parlamentar, documento ao qual a coluna de Bela Megale teve acesso, aponta que ele dividiu a trama para impedir a posse do presidente Lula com dois grupos de WhatsApp privilegiados: o “Chefias” e o “Amigas para a eternidade”.

De início, a cautela de Do Val se resumia a orientações como: “Vejam e apaguem em seguida”. Com o tempo, ele se sentiu mais à vontade para discorrer sobre a trama golpista.

As conversas com o grupo “Chefias”, que inclui dois assessores de seu gabinete, foram mais curtas. Nelas, Do Val adiantou os diálogos com Silveira e descreveu o plano como “missão que entrará para a história do Brasil/mundo”.

Foi com “As amigas para eternidade”, porém, que o senador se soltou de vez. Em textos e áudios entusiasmados, houve até participante que celebrou a possibilidade do golpe.

“Eu tô vibrando, vibrando, mas já vou apagar a mensagem!”, disse uma das amigas. Em seguida, em momento de maior cautela, a mesma participante lembrou: “Tudo aqui é secreto.”

Em um momento, Do Val não se conteve e colocou o destino da República em suas mãos: “Estou com a bomba da (sic) mão para destruir Bolsonaro e outra para destruir o Lula.”

Diante da ambiguidade de seu poder destrutivo, uma das participantes declaradamente bolsonarista tratou de alertar: “Amigo…. prioridades.”

Do Val ainda atribuiu para si a decisão de Bolsonaro de ter deixado o Brasil com a família e viajado para os Estados Unidos na véspera de deixar a presidência: “Eu fui convidado por ele (Bolsonaro) para fazer essa ação. Como integrante da CCAI (Comissão Mista de Controle das Atividades de Inteligência), fui dando corda para ver até onde ele iria. Na eminência (sic) de fato acontecer eu passei para ele que estaria cometendo um crime gravíssimo contra a democracia e de lá reportei para o órgão responsável. Foi diante disse que ele fugiu para os EUA.”

O Globo revelou ainda que as conversas não se limitaram às trocas de mensagens de texto. O senador encaminhou para as amigas os prints dos diálogos secretos mantidos com Daniel Silveira e a imagem da mensagem que fez para o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes.

As integrantes do grupo lamentaram o destino e a derrocada de Bolsonaro, ao que Marcos do Val pontuou: “Ele não estava mais preocupado com o Brasil, mas por ser preso.” Um tanto alterada, uma das amigas apelou para o senador: “Salva a gente, Do Val!!!!”

O parlamentar renovou sua importância diante do momento crítico vivido pelo país e escreveu: “Simplesmente está em minhas mãos o destino de 2 presidentes.” Uma colega resumiu a situação: “Inusitado.” Outra tratou de adverti-lo de que seu protagonismo poderia ser comprometido por Alexandre de Moraes: “Eu já disse que não sei se o careca vai deixar seu nome engrandecer desse jeito.”

Marcos do Val fala em “reportar para a inteligência americana”

No plano mal sucedido para desmoralizar Alexandre de Moraes e o sistema eleitoral brasileiro, com o intuito de criar condições para um golpe de estado que colocaria em xeque as eleições presidenciais de 2022, Do Val enviou uma mensagem a Daniel Silveira, na qual diz que, devido a uma “outra função” que exerce, teve de reportar informações “para a inteligência americana”.

Conforme revelou o Metrópoles, na mensagem de 13 de dezembro de 2022, Daniel Silveira dá bom dia ao senador e diz estar a caminho de Brasília para “fecharmos aquela conversa”. O suposto plano golpista dos dois já estava em pleno curso. “Fala camarada! Estou pegando o voo agora para Brasília”, respondeu Do Val. Em seguida, aparentemente tentando explicar a demora na resposta, ele emenda: “Devido a outra função que exerço, tive que reportar para a inteligência americana. Amanhã teremos uma posição para te passar”.

Ainda segundo o Metrópoles, no relatório da investigação, a PF registra que a mensagem “causa estranheza”. Em seguida, observa não ter encontrado registros de conversas travadas por Marcos do Val com contatos do exterior e cogita a hipótese de o tal “reporte para a inteligência americana” ser um mero blefe: “Mesmo havendo contatos com números americanos (DDI +1) no celular do senador não foram encontradas mensagens no aplicativo WhatsApp que se referissem ao compartilhamento da ‘missão’ com qualquer contato. É possível que DO VAL tenha dito (sic) tal afirmação apenas como um ‘blefe’”.

A mensagem, de acordo com o portal, foi enviada um dia antes de o senador escrever a Daniel Silveira dizendo que estava “declinando” da suposta missão golpista, que consistia em marcar uma reunião com Alexandre de Moraes para gravá-lo e, depois, usar o teor da gravação para descredibilizar o processo eleitoral e criar condições para uma intervenção militar no país.

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