Apesar da tentativa de deputados federais de ampliar o repasse aos partidos políticos para mais de R$ 4 bilhões para 2020, as legendas perderam, desde 2017, R$ 25,6 milhões do Fundo Partidário por decisões judiciais – principalmente por falta de clareza nas declarações de gastos do dinheiro público. As informações foram acessadas por O TEMPO junto ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Nas ações que declaram irregulares os gastos com Fundo Partidário, a Justiça deixa claro que não há comprovações de transferências bancárias para diretórios estaduais, recibos para pagamento de passagens aéreas e diárias em hotéis, além de haver problemas com repasses indevidos e não comprovados. Quando o partido tem a verba bloqueada, os recursos são encaminhados ao Tesouro Nacional.
O Fundo Partidário é uma cota distribuída para os partidos políticos brasileiros se manterem. A maioria das legendas – sem participação no fundo partidário – não existiria.
De janeiro a julho deste ano, o PT foi o partido que mais perdeu verba, segundo o sistema do TSE. Foram R$ 2,1 milhões bloqueados do que seria destinado à legenda. Os bloqueios ocorreram por falta de documentos que comprovassem gastos do partido nas prestações de contas de 2009 e de 2011.
No acórdão do TSE, os ministros citam, inclusive, que o PT utilizou pouco mais de R$ 2 milhões do Fundo Partidário para simular empréstimo junto ao Banco Rural.
Esse empréstimo fez parte, como julgou o Supremo Tribunal Federal (STF), do esquema que ficou conhecido popularmente como “mensalão”.
Ao mesmo tempo, o PT já recebeu R$ 40,2 milhões divididos nos sete primeiros meses deste ano. Procurado, o PT informou que “apresentou documentação comprobatória de todas as despesas realizadas e as informações adicionais requisitadas, que, no entanto, não foram consideradas pela assessoria técnica do TSE”.
<CW-12>Ainda em 2019, o Cidadania (antigo PPS) aparece com bloqueio de R$ 978,6 milhões por irregularidades apontadas na prestação de contas do exercício de 2012. Nos mesmo moldes do PT, a Justiça aponta falta de documentação – notas fiscais – para comprovar gastos.
O tesoureiro do partido, Régis Cavalcanti, afirmou que a legenda tenta, por meio de um recurso, liberar a verba que foi bloqueada. “Pedimos embargo. A prestação vai para julgamento, no nosso entendimento, de uma maneira injusta. Eles (Justiça) colocam recursos que não são originários do Fundo (Partidário) e mandam descontar. Não consideram, por exemplo, doação de uma pessoa física”, disse Cavalcanti. O tesoureiro informou ainda que o partido publica todos os gastos no site oficial.
Resolução
Os bloqueios de verba do Fundo Partidário começaram a partir de uma resolução do TSE, de 2017, que determina, ainda, que, após transitada em julgado a decisão, o partido sofrerá penalização acrescida de 20% por irregularidades na prestação de contas.
Projetos
Na Câmara dos Deputados tramitam 518 propostas sobre Fundo Partidário. Uma delas prevê que as siglas, em 2020, recebam mais de R$ 4,5 bilhões para financiar campanhas. Deste valor, R$ 900 milhões são do Fundo Partidário e do Fundo Eleitoral – utilizado apenas em anos de eleição.
Valor
Nos sete primeiros meses deste ano, os 33 partidos políticos brasileiros receberam quase R$ 400 milhões por meio do Fundo Partidário, informa o Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Especialistas
Em uma tentativa de diminuir os problemas com prestação de contas dos partidos, o doutor em direito pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) Bruno Carazza afirma que as legendas deveriam receber doação de pessoas físicas. Para ele, as pessoas, ao saberem que o partido não utilizou corretamente o dinheiro doado, poderiam deixar de realizar os pagamentos ao partido.
“É muito complicado destinar cada vez mais dinheiro público para campanha, com pouca fiscalização e sem nenhuma regra de distribuição dentro do partido. A gente não soluciona os problemas da nossa democracia simplesmente colocando mais dinheiro nas mãos dos partidos, que precisam convencer o eleitor a doar para campanhas. O partido tem que se mostrar confiável para o eleitor se sentir seguro a fazer”, disse Carazza, que é autor do livro “Dinheiro, Eleições e Poder: As Engrenagens do Sistema Político Brasileiro”.
Para Gil Castello Branco, do Contas Abertas, a situação dos partidos políticos cria movimentos por candidaturas avulsas, ou seja, quando o candidato decide sair para disputa eleitoral sem ligação partidária. “Os partidos estão em um momento de total descrédito, talvez um dos níveis mais baixos de credibilidade que já tiveram”, disse.
Castello Branco também lembra que há “certa conivência” com a situação, porque são os próprios políticos que decidem, por meio de leis, como vão se proteger. Para o especialista, a tendência é que a situação piore, caso as legendas continuem com a mesma postura.
A tentativa em elevar para cerca de R$ 4,5 bilhões para serem utilizados em ano eleitoral, para Castello Branco, é inviável, principalmente pela crise econômica no país.
“Os partidos vão perder credibilidade e ficar desconectados. Estão caminhando as candidaturas individuais. Cidadãos de bem estão se afastamento dos partidos e criando movimentos de tendências variadas”, conclui.