Após assinar a intenção de compra de 90% das ações da SAF Cruzeiro no final do ano passado, Ronaldo deu uma espécie de ‘ultimato’ ao Conselho Deliberativo do Cruzeiro na terça-feira (16). O Fenômeno solicitou alterações no teor do acordo, sem as quais, segundo ele, “ficaria difícil seguir com o projeto”. Além disso, sugeriu que o clube entrasse com um pedido de recuperação extrajudicial ou judicial. Pega de surpresa, a torcida se pergunta: Na prática, o que isso significa? O SUPER.FC conversou com especialista do ramo jurídico para esclarecer a questão.
“A diferença entre recuperação extrajudicial ou judicial diz respeito à participação mais ativa ou não do judiciário. A judicial podemos dizer que é um pouco mais “agressiva”, possui mais etapas. Até por isso, passa a ser mais morosa”, aponta Thiago Pereira Costa, da MPC Advogados, especialista em direito trabalhista e desportivo.
Ele esclarece como se dá o processo de recuperação extrajudicial. “Do ponto de vista prático, significa que o devedor faz um bolo de todas as dívidas cíveis e trabalhistas, já que as tributárias têm regulamentação especial. A partir daí, vai conversar com os credores para colocar um plano para pagar essa dívida. O clube apresenta previsão de pagamento, perspectivas de caixa. E esse plano é levado para os credores. Se 50% + 1 dos credores aprovam, o clube apresenta esta estruturação para o Judiciário e pede para que o plano seja homologado”, enumera.
.
Thiago Costa vê o processo de recuperação como o mais benéfico para empresas que se encontram em caos financeiro, como é o caso do Cruzeiro.
“Na recuperação, o que se tem são todos os credores. E o clube pode negociar abatimentos na dívida e prazo de parcelamento. E a questão do desconto não tem uma via de regra, um limite. O poder de negociação cresce exponencialmente. Em alguns casos, o deságio (desconto) pode chegar a 50%”, destaca.
Para Thiago Costa, a “grande sacada da recuperação” (seja ela judicial ou extrajudicial) é que protege mais o clube. “Os mecanismos são muito mais seguros para o investidor, que é o que o Ronaldo está querendo. Consegue enxergar mais a médio e longo prazo. O investidor entra já sabendo até que ponto pode ir. Sabendo que não vai respingar para ele lá na frente”, acrescenta.
Pior cenário
Mas e se o clube opta pelo caminho da recuperação judicial, mas depois não consegue honrar com o plano apresentado aos credores? Quais seriam as consequências? O especialista explica:
“Não havendo o cumprimento do plano de recuperação o caminho a seguir é a decretação da falência. Pega todo o ativo mobilizado e imobilizado, desfaz através de leilão, pega o que consegue arrecadar de dinheiro e vai pagar os credores, de acordo com a ordem de preferência que a lei estabelece”.
O advogado Thiago Costa ressalta que esta, entretanto, é a última alternativa. “Geralmente, antes da decretação de falência ainda se propõe um novo plano, analisando o que deu certo e o que não deu. Mas isso não pode servir para o devedor ficar empurrando com a barriga”, ressalta.
No caso específico do Cruzeiro, o especialista em direito desportivo entende que as propostas solicitadas por Ronaldo são justas. “Tem um time com R$ 1 bilhão de dívidas. Como o Ronaldo disse, a cada gaveta que abre tem uma surpresa nova. Se não tem uma segurança que o negócio é viável, que o futebol é viável, fica impossível investir. Ronaldo olha para o negócio e vê que precisa ser algo que não vai prejudicá-lo como investidor. Não vai colocar um caminhão de dinheiro se não tiver uma realidade de médio e longo prazo. Não é assim que funciona”.
Pelo cenário atual do Cruzeiro, Thiago Costa não vê alternativa a não ser o Conselho Deliberativo aprovar as mudanças solicitadas por Ronaldo.
“Na questão do Cruzeiro, penso que é muito cacique para pouco índio. Penso que o Cruzeiro está numa posição que tem que levantar as mãos para o céu porque tem alguém querendo ajudar. E ajudar vai envolver dinheiro. E o principal problema são as dívidas, de R$ 1 bilhão, que não estão equacionadas. A posição do Ronaldo é óbvio que é de investidor, mas também é uma grande janela de oportunidade. Ter a figura de Ronaldo associada ao Cruzeiro chama patrocinadores”, acrescenta. “O Cruzeiro precisa acima de tudo de um plano, um horizonte. Não dá pra viver só da imagem do clube. Se não enxergarem isso, será impossível resolver o problema”, finaliza o especialista em direito desportivo.