O Tribunal de Contas de Minas Gerais (TCE-MG), após mais de cinco meses de apuração, autorizou a entrega da gestão do Hospital Maria Amélia Lins (HMAL), na região Centro-Sul de Belo Horizonte, a um consórcio público ou a uma entidade privada sem fins lucrativos desde que sejam cumpridas algumas exigências, entre elas a abertura de seis salas cirúrgicas na rede da Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais (Fhemig). A decisão, desta terça-feira (9/9), reconheceu os prejuízos na assistência aos pacientes do SUS, mas, na avaliação dos servidores, favoreceu mais o projeto do estado de terceirizar a unidade.
Conforme adiantou O TEMPO, na semana passada a Secretaria de Estado de Saúde (SES-MG) concluiu o envio das informações solicitadas pelo Tribunal de Contas, e o secretário da pasta, Fábio Baccheretti, afirmou que estava "otimista pelo consenso”. Na segunda-feira (8/9), a Corte de Contas participou da conclusão de outro processo de terceirização hospitalar, desta vez do Hospital Regional de Teófilo Otoni (HRTO), no Vale do Mucuri, que será administrado pelo Instituto Mário Penna, uma associação privada sem fins lucrativos.
A médica Andréa Fontenelle, diretora do Hospital Maria Amélia Lins (HMAL), avalia que a decisão desconsidera a história e a referência da unidade no atendimento cirúrgico de alta complexidade em traumato-ortopedia, além de facilitar sua entrega ao novo gestor. "Esse resultado não era o esperado, principalmente depois de uma demora na apuração. Faz pensar em uma negociação de bastidor com o estado. É uma decisão desfavorável à saúde pública que considera o fechamento de um hospital especializado e referência em ortopedia, com expertise de décadas", afirma.
O TCE determinou que, para que a licitação de terceirização prossiga, sejam abertas duas salas cirúrgicas no Hospital Júlia Kubitschek, duas no Hospital João XXIII e mais duas no Hospital Cristiano Machado, em Sabará, na Região Metropolitana, dentro de 30 dias. O objetivo seria compensar a interrupção das cirurgias ortopédicas no HMAL, mas, na análise da diretora Andréa, a proposta não é viável.
“Primeiro, não ocupa o espaço do HMAL e não há garantia da continuidade do serviço. Segundo, simplesmente não cabem mais duas salas cirúrgicas no João XXIII. No Júlia Kubitschek, duvido, lá já há desafios emergenciais. Vão tentar fazer o que já tentaram no João XXIII, usando as salas existentes nesses hospitais, mas foi um fracasso. O gargalo vai continuar”, denuncia.
Segundo a diretora médica, a Fhemig ainda não definiu quais equipes serão responsáveis pelas cirurgias do Amélia Lins nas outras unidades — se os servidores do HMAL ou de outros hospitais. Também não há informações sobre a transferência dos pacientes entre hospitais nem sobre quais deles assumirão o acompanhamento dos casos que exigem tratamentos sequenciais. “O ambulatório do HMAL sequer foi citado na decisão do tribunal. As sequelas das vítimas de trauma, em sua maioria jovens, já são uma realidade. Estão transferindo o custo do investimento em saúde da população para o sistema previdenciário. É um desmonte da saúde”, alerta Andréa Fontenelle.
Para o advogado do Sindicato Único dos Trabalhadores da Saúde (Sind-Saúde/MG), Gilmar Dias Viana, a decisão da Corte de Contas apresenta ambiguidades. Segundo ele, o TCE considerou e comprovou todas as denúncias da categoria sobre desassistência a pacientes, sequelas, queda no número de cirurgias e sucateamento do hospital, mas o resultado não foi o esperado. “O relatório do TCE confirma tudo o que denunciamos, e, nisso, é favorável. Mas o resultado da decisão não é bom, ao considerar a abertura das salas cirúrgicas em outros hospitais que não o Amélia Lins. Faremos a análise dessa decisão com cautela”, afirmou.
O que diz a Fhemig?
Em nota, a Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais (Fhemig) esclareceu que a decisão cautelar do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais (TCE-MG) autorizou a continuidade do edital que prevê a cessão das instalações do Hospital Maria Amélia Lins (HMAL), em Belo Horizonte, a uma entidade sem fins lucrativos, e estabelece contrapartidas como a disponibilização de seis salas cirúrgicas distribuídas entre hospitais da rede pública estadual.
"Serão duas salas cirúrgicas no Hospital Júlia Kubitschek, duas no Hospital João XXIII e duas em outra unidade da Fhemig na Região Metropolitana. Os espaços terão de realizar, juntos, pelo menos 300 intervenções mensais. Importante reforçar que, em nenhum momento, a realização das cirurgias ortopédicas de segundo tempo foi descontinuada. A Fhemig reafirma seu compromisso em ampliar o acesso da população mineira a procedimentos cirúrgicos, atuando de forma articulada com a Secretaria de Estado de Saúde e cumprindo integralmente as determinações do TCE-MG", ressaltou a Fhemig.