Desde pequenas, de toda parte e o tempo todo, estão nos dizendo que nossos corpos têm que ser de determinada forma e ter certas funções já definidas, não escolhidas por nós, pois nossos corpos não nos pertencem.
A mídia veicula o ideal da forma; a lei determina funções, com a licença só para a mãe (excluindo o pai) e a proibição do aborto; o trabalho confirma, tendo as mulheres menos cargos de liderança e mais trabalho doméstico, remunerado ou não; o vestuário feminino (salto alto, roupa justa) é desconfortável, pouco prático e expõe o corpo, limitando movimentos e obrigando uma postura de constante tensão e vulnerabilidade; os rituais de “beleza” (depilação, unhas, cabelos, maquiagem) tomam tempo, dinheiro e envolvem dor ou desconforto, mas abdicar deles é inapropriado e excêntrico.
Esses comportamentos, essenciais para a manutenção da ideologia hegemônica, inclusive por movimentarem enorme capital, são transformados em virtudes sociais. E assim despossuímos nossos corpos até que se tornem carne, que deve ser cortada, de um jeito ou de outro, para que se aproxime do que dela se espera, posto que é sempre defeituosa. Jamais boa o bastante ou funcional o suficiente.
O Brasil é o país com o maior número de cirurgias plásticas estéticas (quase 90% em mulheres, muitas adolescentes) e, paralelamente, de cesarianas sem indicação. Nós corremos riscos desnecessários (algumas morremos) para sermos submetidas a uma suposta adequação de nossos corpos perfeitamente saudáveis.
Em “O Mito da Beleza”, Naomi Wolf questiona: “Quantas teremos de morrer até que sejamos consideradas muitas?”. Quando não morremos prematuramente, sofremos dores (às vezes sequelas) e perdemos tempo com recuperação. Se não pagamos com a carne, pagamos com sofrimento psíquico – distúrbios da autoimagem e alimentares, diversas formas de privação de prazer, de exercício de autocontrole e de culpa, transtornos depressivos e obsessivos.
O desapossamento do próprio corpo não é fruto do narcisismo, como tentam nos convencer, mas de um verdadeiro desespero para se manter passível de ser desejada, que nos dizem ser a única medida de nosso valor. Cortar nossa carne, nos ensinam então, não é fútil, mas parte essencial do processo de desposse, sem o qual a felicidade não será possível. Porém, cada intervenção só será paliativa, até o próximo sentimento de inadequação, seja pelo envelhecimento inevitável, seja pelo fato de esse ideal de corpo-carne ser, por definição, inatingível.
Quando o que é essencialmente humano aparece no corpo feminino – a vida nas marcas do rosto, o branqueamento dos cabelos, a textura da pele, o formato pendente dos seios ao longo dos anos e as mudanças que gravidez e parto causam –, diminui o valor da carne e deve ser consertado, ainda que à custa da própria existência.
Mas há, venturosamente, uma saída, que, apesar de simples, é revolucionária: empoderar-se! Sim, trata-se de abandonar (e combater estridentemente, como diria Caitlin Moran) o ideal da forma; ressignificar a beleza, um conceito pessoal e intransferível; reinventar os rituais femininos, abraçando a sororidade como modo de relação entre nós. Enfim, ousar o poder e o prazer de possuir o próprio corpo.
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