Um vídeo de pouco mais de 20 segundos em que o professor de artes William Rezende Quintal, de 43 anos, falava "bem-vindes", publicado em um site particular usado para apresentar o seu trabalho, foi o suficiente para levar à sua demissão do Colégio Santo Agostinho, um dos mais tradicionais de Belo Horizonte. O caso, ocorrido em fevereiro de 2022 e denunciado nesta quinta-feira (13 de abril) a O TEMPO, é alvo de uma batalha judicial entre as partes que já chegou ao Tribunal Superior do Trabalho (TST). A denúncia acontece no dia em que a Câmara Municipal adiou a votação de uma lei que proibiria o uso da linguagem inclusiva nas escolas públicas e privadas de BH.
Segundo o profissional, que, após o caso, desistiu de lecionar, conta que mantinha a página como uma espécie de portfólio de seu trabalho, já que, além de professor, também é artista. "Era a minha primeira aula na escola, online por conta da pandemia. Ao final da aula, depois que eu mostrei pinturas, desenhei na frente deles, os alunos ficaram entusiasmados e alguns pediram alguma rede social para conhecer mais do meu trabalho. Foi então que eu indiquei o meu site, onde estava esse vídeo de 23 segundos em que eu fazia uma espécie de saudação", explicou.
Cerca de uma semana depois, Quintal passou a receber notícias de que pais de alunos estariam reclamando sobre ele para a escola, o que o pegou de surpresa, já que ele sequer conseguia pensar em qualquer coisa em seu site que pudesse ser alvo de uma "polêmica".
"Acabei recebendo uns prints de um grupo em que uma das mães chegava a dizer que eu deveria ser preso, que era um pervertido. Com isso, eu decidi denunciar o caso à Polícia Civil, fiz um boletim de ocorrência e procurei um advogado. Mas, pouco depois, eu fui demitido menos de 20 dias após começar a trabalhar no colégio", lembrou o professor.
Ainda segundo o artista, durante a reunião em que seu desligamento foi anunciado, a direção da escola teria alegado que entre os pais estariam pessoas "muito poderosas" que poderiam "interditar o funcionamento da escola". "Para eles, seria menos 'custoso' encerrar meu contrato de experiência. Isso me desestabilizou profundamente, nessa condição de ser atacado na minha honra, por um tema que é absurdo", ponderou Quintal.
"Respeito à diversidade é um dos nossos pilares", disse Santo Agostinho
Procurado pela reportagem de O TEMPO, o Colégio Santo Agostinho informou, por nota, que é uma instituição comprometida com os direitos humanos, tendo em sua pauta o "ensino da convivência e o reconhecimento às diferenças" e que tem, como um de seus pilares, "a alteridade e respeito à diversidade".
"A Instituição reitera que, em seus espaços, ninguém é discriminado, humilhado, constrangido por raça/etnia, religião ou orientação sexual. O projeto pedagógico contempla a sociedade pluralista em que vivemos, abordando, de forma dialogal e respeitosa, os desafios do mundo contemporâneo", completou a escola antes de dizer que não comentaria sobre o motivo da demissão do profissional.
Leia o posicionamento do colégio na íntegra:
"O Colégio Santo Agostinho é uma escola de educação básica com alunos de 2 a 17 anos. É Instituição comprometida, eticamente, no trato dos direitos humanos, tendo em sua pauta o ensino da convivência e o reconhecimento às diferenças. Todas as temáticas, de todas as áreas, são trabalhadas considerando as faixas etárias.
Um dos pilares do Colégio é a alteridade e respeito à diversidade, tendo em vista o corpo docente e de colaboradores. A Instituição reitera que, em seus espaços, ninguém é discriminado, humilhado, constrangido por raça/etnia, religião ou orientação sexual. O projeto pedagógico contempla a sociedade pluralista em que vivemos, abordando, de forma dialogal e respeitosa, os desafios do mundo contemporâneo.
Sobre o desligamento do profissional, que ocorreu no início de 2022, o Colégio informa que, por questões contratuais e de cuidado com os profissionais da Instituição, não expõe informações sobre professores ou ex-professores. A Instituição destaca que, seguindo critérios da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), os colaboradores das áreas pedagógica e administrativa passam pelo período de experiência, isto é, um acordo estabelecido entre contratante e contratado, em que ambos podem avaliar se o cargo atende às expectativas e aos objetivos do processo.
Durante esse período, tanto colaborador quanto Instituição podem rescindir o contrato antes do prazo, amparados pela legislação. Esse é um processo natural de Recursos Humanos, em que o Colégio zela sempre pelo bom relacionamento entre as partes"