HOSPITAL DAS CLÍNICAS

Prontuário da mãe da bebê supostamente decapitada não consta parto, diz família

Família está solicitando ajuste nas informações do documento; defesa acredita que será preciso requerimento pela polícia

Por Isabela Abalen
Publicado em 09 de maio de 2023 | 12:13
 
 
 
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O prontuário médico de Ranielly Coelho, de 34 anos, mãe da bebê que supostamente teve a cabeça arrancada durante parto no Hospital das Clínicas, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), na região Centro-Sul de Belo Horizonte, não consta as datas e informações do procedimento do parto, de acordo com a advogada que representa a família, Jennifer Valente. 

A advogada afirma que o documento está com falta de informações desde a alta de Ranielly, na terça-feira de 2 de maio. “O prontuário está incompleto. Só está registrada a primeira internação da mãe, do dia 24 a 28 de abril. Os últimos dados, principalmente os realizados no dia 30 até o dia 1º, do parto, não aparecem”, pontua. 

Ainda, na semana da alta da mãe, a tia da bebê, Aryane Santos, de 32 anos, teve acesso ao prontuário e identificou outro suposto erro na informação das datas de entrada e saída de Ranielly no hospital. “No prontuário está que minha irmã entrou no hospital dia 28 de abril e saiu dia 24. Uma trabalhadora até brincou: ‘sua irmã voltou no tempo?’”, denuncia. Na verdade, Ranielly deu entrada no Hospital das Clínicas na segunda-feira (24 de abril) e teve alta na terça (2 de maio). 

Segundo a família, as datas não foram corrigidas e, também por isso, estão se recusando a receber o documento. “Não tivemos acesso ainda ao prontuário de forma íntegra, porque o que querem entregar para a família está incompleto e com erro”, continua a advogada. Para Jennifer Valente, o problema só será resolvido com a ação da polícia. “Acredito que esse prontuário terá que ser oficiado pela polícia”, diz. 

A tia, Aryane, reclama da falta de respostas do hospital. “Eles escondem tudo. Hoje, ninguém mais me atende. Não adianta ligar, é uma dificuldade imensa. Tentei ir no hospital em um dia que a médica estivesse de plantão, mas desconversam, falam que ela não está”, relata. 

O Hospital das Clínicas não respondeu sobre as informações do parto no prontuário, apenas informou que se trata de “um documento oficial, pertencente ao paciente, sob a guarda da unidade hospitalar”.

De acordo com a instituição, Ranielly foi devidamente orientada a respeito dos procedimentos para acesso ao documento, que está disponível para sua retirada. “Informamos que o teor do prontuário diz respeito ao paciente e lhe deve ser dada a garantia da privacidade dos dados”, completou. 

Entenda o caso 

A morte de uma bebê na hora do parto, supostamente após ter a cabeça arrancada pela médica no Hospital das Clínicas, em Belo Horizonte, é investigada pela Polícia Civil. O caso aconteceu no último dia 1º de maio e foi denunciado neste domingo (7 de maio) a O TEMPO pela família da criança, que está completamente abalada.

A mãe da criança, uma mulher de 34 anos, registrou um boletim de ocorrência após a morte do filho no Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), no bairro Santa Efigênia, na região Centro-Sul de Belo Horizonte. 

De acordo com o registro, feito dois dias depois pela Polícia Civil, a gestante contou que estava com 28 semanas e apresentou um quadro de pressão alta. Por causa disso, ela ficou internada na unidade de saúde, onde foi optado pelo parto induzido. 

O pai da criança e a mãe da grávida acompanharam o parto. O homem relatou para a polícia que viu o rosto de sua filha. Ele disse também que percebeu que a pequena mexia a boca e os olhos, mas que, momentos depois, viu que a médica tinha arrancado a cabeça da criança. 

Ainda na versão dos familiares à polícia, a médica pediu desculpas e a assistente social da unidade de saúde disse que o hospital arcaria com todos os custos do sepultamento. A necropsia da bebê também teria sido feita no hospital, e o corpo não teria sido encaminhado ao Instituto Médico-Legal (IML) após a morte.

“Com a ocorrência, conseguimos a remoção do corpo do hospital para o IML. O hospital não queria liberar para que a família fizesse qualquer procedimento, inclusive enterro e velório, por que eles falaram que eles lidariam com essa situação do sepultamento. Amanhã (nesta segunda-feira) sai o resultado preliminar da necropsia e também uma guia preliminar para a mãe da criança. Ela está com mais de 60 pontos, não consegue andar e está muito mal psicologicamente”, explicou a advogada Aline Fernandes, que representa a família da vítima.

Ainda segundo o registro no boletim de ocorrência, familiares acompanhavam o parto através de um vidro. Eles teriam presenciado a médica subindo sobre a barriga da mãe enquanto puxava a criança, que, ao nascer, teve a cabeça arrancada do corpo. Conforme a advogada da família, a criança, inclusive, teria tido a cabeça costurada para que a mãe pudesse carregá-la.

O que diz o Hospital das Clínicas (HC)?

O Hospital das Clínicas, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), no bairro Santa Efigênia, região Centro-Sul de Belo Horizonte, afirmou que a bebê decapitada durante o parto tinha “malformação pulmonar, incompatível com a vida”. 

A gestão da unidade disse que o parto foi prematuro, com 30 semanas de gestação, e que a gestante evoluiu para “agravamento do quadro clínico, com elevação da pressão arterial e edema generalizado”.

“Devido à gravidade do quadro materno e à inviabilidade fetal [incapacidade do feto de sobreviver fora do útero], o corpo médico optou pela indução do parto", prosseguiu. O hospital também diz que "se solidariza com a família" e que segue "à disposição dos parentes e das autoridades".

"O HC e a EBSERH empenharão todos os esforços para apuração dos fatos e análise do caso e apoio à família", concluiu o texto divulgado pelo hospital. As defesas das médicas não foram localizadas pela reportagem. 

Sobre as informações do prontuário: "O prontuário é um documento oficial, pertencente ao paciente, sob a guarda da unidade hospitalar. A paciente já foi devidamente orientada a respeito sobre os procedimentos para acesso ao documento.

Na oportunidade, informamos que o teor do prontuário diz respeito ao paciente lhe deve ser dada a garantia da privacidade dos dados. O prontuário do paciente só pode ser disponibilizado em três situações e de acordo com o fluxo institucional:

- Ao próprio interessado, ou seja, o paciente.

- A terceiros, desde que munido de poderes, pelo paciente (procuração legal)

- à Autoridade judicial."

O que diz a Polícia Civil?

Por meio de uma nota, a Polícia Civil confirmou que instaurou um inquérito para apurar as "causas e circunstâncias" do ocorrido. "A PCMG esclarece que procedimentos estão sendo realizados com o intuito de elucidar o caso. Tão logo seja possível, outras informações serão divulgadas".

"A Polícia Civil de Minas Gerais (PCMG) informa que o caso se reveste de grande complexidade e demanda estudos necroscópicos e laboratoriais detalhados. Os trabalhos já foram iniciados imediatamente após a chegada do corpo no Instituto Médico-Legal Dr André Roquette. Por ora, não é possível definir data exata da conclusão do laudo. O corpo será liberado tão logo os médicos legistas definam que não serão necessárias coletas adicionais de tecidos para análises."

O que diz o CRM-MG?

O Conselho Regional de Medicina do Estado de Minas Gerais (CRM-MG) afirmou que irá investigar o caso. "Em resposta a sua solicitação, o Conselho Regional de Medicina do Estado de Minas Gerais (CRM-MG) informa ter tomado conhecimento, pela imprensa, de desfecho desfavorável em parto realizado em Belo Horizonte, e vai instaurar os procedimentos administrativos necessários à  apuração dos fatos.

Todas as denúncias recebidas, formais e de ofício, são apuradas de acordo com os trâmites estabelecidos no Código de Processo Ético Profissional (CPEP), tendo o médico amplo direito de defesa e ao contraditório. Em conformidade com o CPEP todos os processos correm sob sigilo."

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