Regulamentação

Terceirização de vistorias: como será o processo 'fora das mãos' do Detran-MG

Portaria que regulamenta as empresas credenciadas foi publicada pelo Governo de Minas nesta quarta (26); terceirização deverá estar completa em março de 2023

Por José Vítor Camilo e Vitor Fórneas
Publicado em 26 de outubro de 2022 | 10:08
 
 
 
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O Governo de Minas publicou, nesta quarta-feira (26), a portaria que regulamenta as empresas credenciadas que deverão assumir o processo de vistoria veicular, atualmente sob a responsabilidade do Departamento de Trânsito de Minas Gerais (Detran-MG). Com início do credenciamento previsto para o dia 9 de janeiro de 2023, a expectativa é que os mineiros já contem com a terceirização do processo a partir de março, segundo o Sindicato das Empresas de Vistorias de Identificação Veicular e Motores no Estado de Minas Gerais (Sindev-MG). 

O processo de terceirização das vistorias começou em 2018, durante o governo de Fernando Pimentel (PT). Entretanto, ainda aquele ano, a portaria que regulamentava o serviço acabou suspensa pelo Detran-MG poucos meses depois, após a Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) fazer uma audiencia pública e deputados e despachantes apresentarem uma série de vícios no processo

Três anos depois, após um atraso ocasionado pela pandemia de Covid-19, em 2021 o processo começou a sair do "papel", e, depois de novos estudos, nos últimos meses foram publicadas as portarias regulamentando, a formação dos vistoriadores - que passarão por um curso de 140h -, e as empresas de tecnologia da informação, que farão a interligação entre as empresas credenciadas e o Detran-MG. 

"Agora, com essa portaria regulamentando as empresas, nasce um credenciamento aberto, sem qualquer limitação, até mesmo para que consigamos atender as demandas dos 853 municípios de Minas. Hoje, acreditamos que cerca de 70% das cidades não contam com o serviço da vistoria. O melhor é que o cidadão não será onerado por isso, já que a taxa será paga dentro da taxa de trasnferência", detalha Natalia Cazarini, presidente do Sindev-MG. 

Ainda conforme ela, a princípio, a medida já deverá gerar cerca de 10 mil empregos, com base nos vistoriadores que serão treinados para atuarem nas empresas. Também já existem 1.200 empresas prontas para o credenciamento, mas, com a publicação da portaria, este número deverá aumentar. 

"Além da capilaridades que esperamos, teremos ainda a qualidade do atendimento e uma maior segurança, já que as vistorias serão filmadas do início ao fim e o laudo só será liberado com a biometria dos vistoriadores. Portanto, a tecnologia trará muitos benefícios para o usuário final", pondera Natalia. 

Usuários acreditam em melhoria, mas temem aumento de preço

Na tarde desta quarta, a reportagem de O TEMPO esteve no Detran-MG, na Gameleira, na região Oeste de Belo Horizonte, e conversou com algumas pessoas que aguardavam na longa fila para passar na vistoria feita por policiais civis. Embora a maior parte deles acredite na melhoria do serviço, eles também temem que o preço pago sofra aumento. 

O despachante Helio Eustaquio Gomes, de 44, espera que haja uma melhoria do serviço oferecido, entretanto, afirma que, certamente, isso terá um custo para o usuário. "Com certeza a taxa de transferência, que hoje é de R$ 233, vai ter um aumento significativo a partir de janeiro. Todo início de ano o estado aumenta a taxa, então, com essa novidade, o usuário pode preparar", argumentou.

Ainda conforme Gomes, outra coisa que o preocupa é com relação à qualificação dos vistoriadores das empresas privadas em comparação aos policiais civis.  "Se você parar aqui por uma semana você vai ver a quantidade de carro que é apreendido por estar lindo por fora, mas com chassi adulterado, um número do motor que foi remarcado, uma etiqueta ótica que foi falsificada. Isso a sociedade não tem dimensão e não sei se esses vistoriadores das empresas terão a mesma capacidade de identificar", completou o despachante. 

Sem se identificar, um outro despachante afirmou que, atualmente, existe muita corrupção durante as vistorias, sendo pagos valores para os policiais fazerem "vista grossa" para carros com irregularidades. "Isso é uma das coisas que acredito que acabará com terceirização. Mas, o melhor, para mim, é a questão de proximidade. Moro em Venda Nova e tenho que vir na Gameleira, andar mais de 20 km para poder resolver as coisas. Tendo unidade mais próxima, eu economizarei tempo e dinheiro", afirmou. 

O empresário Jeferson Martins, de 40 anos, também acredita que a mudança será para melhor. "Eu acho que vai ser bom, não é má história terceirizar o serviço. Por exemplo, estou na fila aqui já há algum tempo", disse. "Mas não acredito, por exemplo, que vá acabar com a corrupção que hoje existe. É um câncer que está introduzido no sistema, não tem como mudar", ponderou. 

Policiais auxiliando investigações

A terceirização das vistorias vai proporcionar, segundo o diretor geral do Detran-MG, Eurico da Cunha Neto, a liberação de policiais para auxiliar nos trabalhos investigativos, além de facilitar o acesso de moradores de outras cidades de Minas aos serviços. Somente na capital mineira, são 40 policiais vistoriadores.

“Será bom não só para liberar os policiais civis mas para ter capilarização de empresas. O serviço ficará mais próximo dos mineiros. Aqui, em Belo Horizonte, se a pessoa mora no outro lado da cidade precisa atravessar para ir até o Detran Gameleira. Com a terceirização, poderá buscar o serviço de forma mais rápida. Policial civil não se formou para fazer vistoria em veículo”, disse. 

Os serviços realizados no Detran já vêm sendo transferidos para a Unidade de Atendimento Integrado (UAI). “Temos, atualmente, 34 UAIs que disponibilizam os serviços. A vistoria até então não poderia ser feita por um não policial porque não havia o credenciamento de empresas. A tendência é dos serviços saírem [do Detran]”.

Com os serviços sendo terceirizados e com eles nas UAIs, a unidade do Detran Gameleira será destinada apenas a casos relacionados a crimes, conforme explica. “A vistoria será somente para produtos de crimes, por exemplo, carros furtados ou roubados”, disse.

O diretor-geral do Detran tranquilizou o usuário sobre possível aumento no valor da taxa de transferência a partir do momento em que ocorrer a terceirização. “Não vai acontecer aumento do preço. Uma das coisas mais importantes que definimos é que o cidadão não será onerado em nada. Não vai pagar um centavo a mais”.

Com relação a possível corrupção durante as vistorias, Neto ressaltou que “qualquer desvio de função não é tolerado”. “Somos policiais e temos que combater a corrupção ao máximo. Somos o último Estado do Brasil com Detran ligado a Polícia Civil e não quer dizer que nos outros não tenha corrupção e desvios de princípios. Falar que a corrupção está ligada a Polícia Civil é, no mínimo, uma injustiça”.

Indagado sobre quando as vitorias terceirizadas vão começar, Neto não precisou data. “Tem todo um tempo para receber os documentos das empresas, fazer perícia e não dá para cravar a data”, concluiu.

Regras 

Na portaria 1.766 do Detran-MG, todos os detalhes são descritos todos os detalhes sobre as empresas que poderão se credenciar, detalhando inclusive que todas deverão contar com um pátio coberto, onde o número de boxes irão variar de acordo com o porte do município. 

Nas cidades de pequeno porte, com população de até 100 mil habitantes, serão de dois a quatro boxes de vistoria de veículos leves e, ao menos, um ou dois para veículos pesados. Já nas cidades de médio porte (100 a 500 mil habitantes), serão de 4 a 8 boxes de veículos pequenos e 1 a 3 para veículos pesados. Já as cidades de grande porte, que têm mais de 500 mil moradores, os pátios das empresas deverão contar com 8 a 16 boxes pequenos e 1 a quatro de veículos pesados. 

O regulamento ainda precisa quais são as cidades de acordo com o porte, sendo as grandes Belo Horizonte, Contagem, Juiz de Fora e Uberlândia; médias Betim, Montes Claros, Ribeirão das Neves, Uberaba, Governador Valadares, Ipatinga, Sete Lagoas, Divinópolis, Santa Luzia, Ibirité, Poços de Caldas, Patos de Minas, Pouso Alegre, Teófilo Otoni, Barbacena, Sabará, Varginha, Vespasiano, Conselheiro Lafaiete, Itabira, Araguari, Ubá, Passos, Coronel Fabriciano, Muriaé, Araxá, Nova Serrana, Ituiutaba e Lavras; e pequeno porte todas as demais. 

Não poderão participar do credenciamento empresas impedidas de atuar no poder público, empresas de servidores públicos (concursados ou de confiança), de familiares de agentes públicos, e empresas cujo sócio atue em áreas de risco, como: fabricação, reparação, aluguel, importação ou comercialização de veículos, seus componentes e acessórios; exercício da atividade de transportes; exercício da atividade de despachante documentalista; leilão de veículos e sua preparação. 

Empresas que tenham sido condenadas nos últimos cinco anos por exploração de trabalho infantil ou trabalho escravo também estão impedidas de participar do processo. 

Matéria atualizada às 18h07

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