Um funcionário da mineradora Vale que sobreviveu por um triz da 'tragédia de Brumadinho', mas que viu o próprio irmão e colegas de trabalho morrerem soterrados na enxurrada de lama, conseguiu na Justiça o direito de receber indenização de R$ 200 mil. O desastre ocorrido na cidade mineira, em janeiro de 2019, deixou 270 mortos.
Por causa do trauma, o homem entrou na Justiça do Trabalho alegando sofrer, desde então, de síndrome do pânico e extremo estresse. A Vale se defendeu e declarou que cumpriu todas as normas de saúde e segurança do trabalho. No entanto, a 11ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho (TRT-MG) manteve a sentença determinada pela 3ª Vara do Trabalho de Betim, que fixou o valor da indenização.
O funcionário da mineradora disse que presenciou todo o desastre. No momento em que a barragem da mina do Córrego do Feijão se rompeu, ele realizava o carregamento de caminhão de minério bem próximo da estrutura de rejeitos. Informou que se salvou por pouco, passando por um momento de pânico e extremo estresse, o que acarretou uma série de sequelas à sua vida funcional.
Segundo o relato, ele não estava no refeitório que foi atingido pela avalanche de lama, por mero acaso, já que antecipou o horário de almoço em uma hora. E que, desde a tragédia, “vem apresentando sérias sequelas emocionais, de modo que não consegue sequer retornar ao local de trabalho, mesmo estando sob os cuidados médicos, e sendo submetido a tratamento psicológico”.
Em sua defesa, a empresa alegou que realizou todos os licenciamentos necessários junto aos órgãos competentes e sempre cumpriu as normas de saúde e segurança do trabalho, inclusive no que diz respeito à manutenção e monitoramento de barragens. E, por último, argumentou que o trabalhador não sofreu dano moral em razão do acidente, motivo pelo qual a empresa diz que não há falar em indenização.
Mas para o desembargador Marco Antônio Paulinelli de Carvalho, relator do recurso da empresa, que a atividade de mineração apresenta fatores múltiplos de risco, ligados, inclusive, às condições geológicas e climáticas. Além disso, o magistrado citou a insuficiência das medidas de segurança necessárias.
“Ainda que assim não fosse, é certo que a empresa reclamada é comprovadamente culpada pelo acidente, tendo em vista que ela não demonstrou a adoção de medidas preventivas que pudessem assegurar a não ocorrência do acidente”, ressaltou.
Segundo o desembargador, especialistas confirmaram em relatório que o rompimento ocorreu por deformações da estrutura da barragem. Já, em relação à ocorrência do dano moral, o magistrado pontuou que os relatórios médicos, anexados aos autos, e a CAT emitida pela empresa, evidenciam que o trabalhador apresentou transtornos de estresse pós-traumático logo após o acidente.
“Nesse contexto, entendo que restou evidenciado que a integridade mental e moral do empregado foi exposta, não apenas pelo risco a que foi submetido, mas também em razão da perda do seu irmão e de diversos colegas de trabalho”, pontuou o desembargador.
Ele destacou que são invioláveis a honra, a dignidade e a integridade física e psíquica da pessoa. E, segundo o relator, a violação a qualquer desses bens jurídicos no âmbito do contrato de trabalho ensejará ao violador a obrigação de reparar os danos dela decorrentes.
“Porém, uma vez consumado o dano, na pior das hipóteses, pode o ofendido sentir-se parcialmente aliviado com o abrandamento do agravo na forma de compensação material. Além disso, a medida tem uma faceta pedagógica no sentido de alertar o ofensor para que não persista em atitudes dessa natureza”, frisou. Desta forma, manteve o valor da indenização.
Em nota, a Vale declarou "ser sensível à situação de todos os empregados próprios e terceirizados e segue aberta ao diálogo, com uma escuta ativa para conhecer e analisar as demandas apresentadas individualmente ou coletivamente pelos trabalhadores, Instituições de Justiça e órgãos do Estado"