Testemunhas do caso das crianças, de 6 e 9 anos, encontradas em cárcere privado em um apartamento no bairro Lagoinha, região Noroeste de Belo Horizonte, começaram a ser ouvidas nesta sexta-feira (24). Elas prestaram depoimento na Delegacia Especializada de Proteção a Criança e ao Adolescente (DEPCA) no bairro Carlos Prates, na região Noroeste de Belo Horizonte.

A vizinha das crianças responsável por acionar as autoridades, que resgataram os menores, foi uma das primeiras a ser ouvida. Na sequência, a outra vizinha, que teria feito o vídeo das crianças encarceradas pedindo comida e remédio, também foi ouvida. 

Ainda prestarão depoimento os advogados da mãe das crianças. A mulher está presa desde o dia 6 de fevereiro, suspeita de ter matado o filho de 4 anos, em São Joaquim de Bicas, região metropolitana de Belo Horizonte. 

O irmão da mulher presa também vai prestar depoimento. Ele mora em Goiás e está em Belo Horizonte com o intuito de obter a guarda dos sobrinhos — dos meninos, de 6 e 9 anos, e das outras duas meninas de 1 e 2 anos.

Entenda o caso

O resgate

As crianças, de seis e nove anos, foram resgatadas na terça-feira, 21 de fevereiro, trancadas em um apartamento do bairro Lagoinha, na região Noroeste de Belo Horizonte. Segundo a Polícia Militar, elas estavam com sintomas de desnutrição e febre. Elas ficaram trancadas por três dias, sem alimentação.  

Conforme informado pela polícia, as vítimas estavam magras, usavam roupas sujas e o ambiente onde elas estavam era escuro e encardido. Após o resgate, as crianças foram encaminhadas para o hospital Odilon Behrens, no bairro São Cristóvão. 

A denúncia

A denúncia foi feita por uma vizinha, a vendedora Poliana Pereira dos Santos, de 37 anos. Ela acionou a polícia depois que percebeu que elas estavam sozinhas no apartamento e sem o auxílio de familiares. Ela tentou alimentar as crianças por um buraco na parede do apartamento. A porta da residência onde elas estavam foi trancada com um cadeado e correntes. 

O local em que as crianças estavam

Conforme a denunciante, no local em que as crianças estavam, havia uma vasilha de comida com bicho. Em entrevista ao TEMPO, ela descreveu o cenário. "Encontramos muita sujeira, o cheiro era tão forte que, quando os policiais abriram a porta, nem eles aguentaram. A gente se emocionou muito quando vimos os dois, com os bracinhos fininhos, um deles sem conseguir nem falar. Aí começamos a chorar. Aqui tudo sujo, tudo podre, vasilha com bichos, colchão no chão", relatou.

Menino sentiu cheiro de churrasco e pediu comida

Uma das crianças resgatadas pediu um pouco de comida para a vizinha depois que sentiu o cheiro do churrasco que era feito por ela. "Meu sobrinho estava andando de bicicleta aqui e, pelo buraquinho, ele viu e pediu um pouco de comida. Meu sobrinho, que tem mais ou menos a idade dele, veio até mim e contou. Fui até a porta e vi os dois, um deles disse que estava com fome e pediu churrasco para ele e o irmão. Pedi para ele abrir a porta, e ele falou que podia ser por ali mesmo. Falei que a vasilha não cabia no buraco. Ele, então, sugeriu que eu colocasse em uma sacolinha e disse 'eu estou com muita fome, me dá churrasco'",  detalhou a vendedora Poliana dos Santos, de 37 anos, responsável por fazer a denúncia para a polícia.

A criança disse para a vendedora que elas estavam acompanhadas da avó. No entanto, o menino voltou a pedir comida durante a noite daquele dia, o que intrigou a vizinha e indicou de que elas estariam sozinhas.

Os responsáveis pelas crianças

A investigação apontou que as crianças são filhas de uma mulher, de 30 anos, que foi presa por maus-tratos a outro filho, morto no último dia 6 de fevereiro. O caso foi registrado em São Joaquim de Bicas, na região metropolitana da capital. De acordo com o boletim de ocorrência, no início do mês, a mulher levou o filho de 4 anos ao médico, mas a criança já estava morta. O menino chegou com lesões no olho, inchaço no pé e queimaduras no tornozelo.

O pai biológico das crianças, segundo a apuração do caso, teria morrido de Covid-19, em 2020. Em depoimento à polícia, uma das vítimas resgatadas no apartamento, na última terça-feira (21), informou que elas haviam vindo de São Joaquim de Bicas, na semana anterior ao resgate, e que a avó teria passado a noite de sábado (18) com elas, mas não retornou.