Ao final desta semana, o mercado exportador brasileiro terá uma barreira invisível, mas pesada para enviar produtos aos Estados Unidos, com a entrada em vigor da tarifa de 50% anunciada por Donald Trump na próxima sexta-feira, 1º de agosto. A cobrança - não exclusiva ao Brasil - segue a política protecionista do republicano e esbarra também no interesse estadunidense em evitar que a economia da China, em franco avanço, ultrapasse os norte-americanos na dianteira mundial

Desde 2013, o Produto Interno Bruto (PIB) dos asiáticos saltou 92% - saindo dos US$ 9,74 trilhões para os US$ 18,7 trilhões registrados em 2024. Do outro lado, em Washington, o PIB cresceu menos, em comparação ao salto chinês: o avanço foi de 72,7%, deixando o patamar US$ 16,9 trilhões para US$ 29,2 trilhões, segundo dados da plataforma Trading Economics e do Banco Mundial.

Em alguns setores da indústria, como a siderurgia, enquanto a produção em Pequim cresceu mais de 30% nos últimos anos, o volume norte-americano teve um ganho de pouco mais de 2%. Apesar da disputa direta, a China não entrará no rol de países punidos por Trump a partir de 1º de agosto. O presidente norte-americano chegou a anunciar 145% de cobrança adicional ao mercado chinês, que revidou com uma taxa de 125%. 

No entanto, os países negociam um acordo em tratativas que devem se arrastar pelos próximos 90 dias, segundo a imprensa asiática. Até a chegada a um consenso, a alíquota aplicada à economia chinesa pelos EUA será de 30%. Parceiros comerciais da China, como o Brasil, amargam taxas distintas: Japão 15%, Coréia do Sul 25%, Vietnã 20% e União Europeia 15%. 

O economista e professor do Ibmec Gilberto Braga acredita que as tarifas de Trump têm relação com a guerra comercial travada entre os dois países, mas não de maneira direta. “O presidente Trump acredita no protecionismo para resgate e crescimento da economia norte-americana. Neste processo, a China é um dos alvos, mas não é o único, embora as duas economias disputem o protagonismo mundial atualmente”, lembra. 

Braga cita que a partir do tarifaço, a Casa Branca busca estimular a produção local em detrimento da internacionalização observada nas últimas décadas. “Hoje, toda a produção é integrada em cadeias internacionalizadas. Se você pegar a indústria de roupas, muitas marcas americanas têm braços no oriente para fabricação. Destravar ou retornar isso a um processo de 30, 40 anos atrás é bem complexo, até mesmo pelas vantagens comparativas que se têm na China”, observa. 

“A China tem menos leis trabalhistas, mão de obra abundante e custo de produção mais barato em comparação aos Estados Unidos. É difícil fazer essa competição em condições iguais e, ao que parece, a maneira que os Estados Unidos encontraram de competir foi taxando, inclusive, a própria indústria norte-americana, porque o custo do produto americano vai aumentar”, complementa o professor. 

Efeito contrário

Na avaliação do professor de Direito Internacional da Fundação Getúlio Vargas (FGV) e da Universidade Federal Fluminense (UFF) Evandro Menezes de Carvalho, a implementação de barreiras comerciais por Trump pode surtir o efeito contrário ao pretendido pela Casa Branca. Ele frisa que as medidas representam um choque econômico, que coloca em risco as relações com países aliados. 

“Pode-se até admitir que, a curto prazo, essa política venha a ter um efeito econômico desejado e ainda assim isso é controverso. Mas a longo prazo, vai deixar um rastro de inimizades pelo caminho que pode, inclusive, dificultar o objetivo maior dos Estados Unidos em permanecer tendo o maior poder hegemônico global”, salienta Menezes que vê diferenças no relacionamento externo do governo de Xi Jinping. 

“A abordagem chinesa é diferente, que se inicia em um processo de aproximação diplomática no tratamento com o país que está se negociando, respeitando os princípios da igualdade soberana e na busca por acordos em que não só a China tenha ganhos, mas o outro país também. Essa abordagem é mais sustentável, a longo prazo”, complementa. 

E o Brasil? 

Principal parceira comercial do Brasil desde 2009, a China pode ter uma relação ainda maior com o mercado brasileiro após a tarifa de Trump. Dados da Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex Brasil) mostram que em 2023 o comércio de produtos que saíram do território tupiniquim ao mercado chinês somou US$ 157,5 bilhões, valor que representa 27,1% de todo o volume de negociações externas do país. 

A pauta de exportação aos chineses é predominante de produtos da agropecuária, indústria extrativa e produtos de menor sofisticação tecnológica da indústria de transformação. “Brasil e China têm uma relação de complementaridade. A gente tem o que o chinês não tem para vender. Então quando Trump age desse modo, de maneira hostil com um país como o Brasil, que sempre teve uma relação saudável com os Estados Unidos, ele coloca o Brasil ainda mais aberto a negociações e outras possibilidades de acordos com a China”, arremata Evandro Menezes.