Ao longo desta segunda-feira (31), os protestos de caminhoneiros tomaram força em todo o Brasil. O movimento teve início logo após a divulgação do resultado das eleições presidenciais na noite deste domingo (30), quando estradas em todo o Brasil registraram manifestações de transportadores.
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— PRF MINAS GERAIS (@prf_mg) October 31, 2022
Os atos são organizados por motoristas de carga que apoiam o presidente Jair Bolsonaro (PL) e não concordam com a derrota indicada no resultado das urnas. Na noite desta segunda-feira (31), a Polícia Rodoviária Federal (PRF) chegou a contabilizar 236 ocorrências em 20 Estados do Brasil.
Santa Catarina lidera os registros, com mais de 40 trechos em que há restrições de tráfego em função das manifestações. Outros Estados com grande concentração de transportadores são Mato Grosso do Sul e Rondônia. Minas Gerais, que tem a maior malha rodoviária do Brasil, contabiliza mais de 10 interdições, parciais ou totais, até o final da tarde desta segunda-feira.
As principais concentrações são na BR-381 em Betim, onde os caminhoneiros chegaram a bloquear completamente o trânsito, e em Ipatinga, onde a movimentação começou ainda na noite de domingo. Ao final da noite de segunda-feira, o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Alexandre de Moraes, determinou que a PRF e as Polícias Militares estaduais atuem para desobstruir de imediato todas as rodovias ocupadas ilegalmente.
Moraes impõe multa de R$ 100 mil por hora e afastamento do cargo ao diretor-geral da PRF, Silvinei Vasques, além de autorizar a prisão em flagrante dele em caso de desobediência. Horas depois, já durante a madrugada desta terça-feira (01), o Supremo Tribunal Federal (STF) formou maioria para referendar a decisão do TSE.
Após a decisão, a PRF informou que iniciou operação para desmobilização dos protestos, mesmo com vídeos mostrando, nas redes sociais, manifestações de agentes da corporação se negando a multar caminhoneiros. Conforme a corporação, entre a noite de segunda-feira e manhã de terça-feira, foram 192 manifestações desfeitas.
Versões distintas
O movimento, apesar de estar ganhando força, não é unanimidade na categoria. Diretor da CNTTL, Carlos Alberto Litti Dahmer classificou os atos como “ação antidemocrática”. "O que estamos vivenciando neste momento no País é uma ação antidemocrática de alguns segmentos que não representam a categoria dos caminhoneiros autônomos, como tem se querido dar o crédito para essa movimentação de não aceitação do resultado das urnas. Isso é antidemocrático. Nós precisamos respeitar o que o povo decidiu. O povo é soberano. E a soberania das urnas determinou que a vitória é do candidato Luiz Inácio Lula da Silva (PT)”, disse.
Presidente da Frente Parlamentar dos Caminhoneiros Autônomos e Celetistas, o deputado federal Nereu Crispim (PSD-RS) afirmou, por meio de sua conta no Twitter, que os bloqueios nas rodovias não representam a categoria. "Os bloqueios de rodovias estão sendo feitos por criminosos que não representam a categoria. Enviamos um ofício à PRF para que garanta o direito de ir e vir dos caminhoneiros e desbloqueie as rodovias", escreveu.
Um dos líderes da greve de 2018, o caminhoneiro Wallace Landim, conhecido como Chorão, também pediu aos colegas que suspendam os bloqueios iniciados após a confirmação da derrota do presidente Jair Bolsonaro (PL) na votação desse domingo. "Nesse momento, parar o país vai prejudicar muito a democracia desse país. Precisamos ter reconhecimento da democracia, da vitória do presidente (Luiz Inácio Lula da Silva)", afirma ele, em vídeo divulgado por redes sociais.
Por outro lado, um representante do movimento nacional de caminhoneiros autônomos, que pediu anonimato, afirmou que a manifestação não é apenas da categoria, mas de todos os brasileiros que “estão revoltados com o que está se vislumbrando para o cenário nacional”. Ele citou críticas ao Supremo Tribunal Federal (STF) e, sem provas, disse que o processo eleitoral no país não teve “lisura”.
“Queremos intervenção das Forças Armadas. Existe uma movimentação, uma situação de eu autorizo novamente para o presidente, para mostrar que grande parcela da população continua com ele”, complementou. O posicionamento é semelhante ao de Jackson Caetano, caminhoneiro autônomo que participa de protestos em Ipatinga.
"Estamos esperando um pronunciamento para saber o que vai ser feito e tomar uma providência. É um ato de apoio ao presidente", disse. Segundo ele, a expectativa da categoria é que Bolsonaro anuncie alguma medida em relação à condução do processo eleitoral. "Faltou transparência", avalia Caetano.
Articulação
Todos os atos estão sendo articulados em redes sociais. Em um grupo de apoiadores do presidente no Telegram, membros recusam o resultado das eleições do segundo turno, apoiam os protestos dos caminhoneiros ao redor do país e pedem intervenção militar no resultado das urnas.
O resultado das eleições foi confirmado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) no domingo (30) e consagrou a vitória de Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Derrotado, Bolsonaro não fez nenhuma declaração pública desde o anúncio do resultado.
Bolsonaristas criaram um grupo de mobilização por Estado, em que clamam por uma “paralisação geral”. Alguns usuários incentivam que os participantes contribuam com alimentos e outros itens básicos para ajudar os caminhoneiros. “Descubra onde estão se mobilizando na sua cidade e leve mantimentos”, diz uma mensagem.
Ao mesmo tempo, falam em ir para a porta de quarteis pedir que o Exército intervenha contra o resultado das urnas. “Vamos à resistência civil, então!! Todos juntos, a hora é agora!!!!”, diz outra mensagem.
Aguardo
Nas estradas, os caminhoneiros esperam por um pronunciamento de Jair Bolsonaro (PL) para definir os rumos do protesto. “Assim que o presidente se manifestar sobre a derrota, acredito que isso vai passar. Tudo depende do posicionamento do presidente da República”, afirmou José Natan, presidente do Sindicato Interestadual dos Caminhoneiros em Minas.
Apesar da expectativa, o presidente Jair Bolsonaro ainda não se pronunciou após a divulgação do resultado das eleições. Aliados importantes, como o próprio filho, senador Flávio Bolsonaro (PL), já indicaram que a derrota será bem aceita. “Obrigado a cada um que nos ajudou a resgatar o patriotismo, que orou, rezou, foi para as ruas, deu seu suor pelo país que está dando certo e deu a Bolsonaro a maior votação de sua vida! Vamos erguer a cabeça e não vamos desistir do nosso Brasil! Deus no comando!”, escreveu no Twitter.
Análise
Diferente de 2018, o protesto dos caminhoneiros neste ano não tem adesão do empresariado, o que dificulta a continuidade do movimento que não aceita o resultado das urnas por vários dias. Ao menos, é o que pensa o advogado e economista Alessandro Azzoni, ouvido pela reportagem de O TEMPO nesta segunda-feira (31). Para ele, a diferença é que os protestos atuais são de caráter político, não econômico.
“Acredito que esse movimento não tende a crescer se houver uma manifestação do presidente (Jair Bolsonaro, do PL) ainda hoje. Essa questão da transição do governo é o que realmente preocupa toda a questão de aceitação desse pleito eleitoral. Vejo que é uma questão de provocar o presidente Bolsonaro a tomar partido para que não haja nesse silêncio, uma preocupação de não aceitar a derrota. O famoso tentar levar para um terceiro turno. É mais um alerta, não uma paralisação efetiva, como tivemos no passado, em 2018”, diz Alessandro.
O professor de logística da Fundação Dom Cabral (FDC), Paulo Resende, afirma que não é possível medir o tamanho dos problemas causados pela paralisação na cadeia de suprimentos. “Ainda não se tem noção de qualquer prejuízo, pois a paralisação está restrita a trechos específicos, onde não temos dados de volumes de tráfego. Além disso, não temos noção ainda pois algum tipo de prejuízo só pode ser medido em dias ou semanas”, diz o especialista.