Embora a inflação oficial do país medida em 2016 pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) do IBGE tenha tido variação de 6,29%, percentual inferior ao verificado em 2015 (10,67%), e ficado abaixo do teto da meta do governo (6,5%), o bolso do brasileiro não teve alívio. E um dos motivos foi o reajuste salarial com índice inferior ao da inflação, registrado por muitas categorias, destaca o economista do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos em Minas Gerais (Dieese-MG), Fernando Duca.

Os últimos dados da entidade, referentes ao primeiro semestre de 2016, mostram que 76% das negociações coletivas no país não obtiveram reajustes acima da inflação, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) do IBGE. Do total, 39% tiveram aumento abaixo do índice; 37% conseguiram recompor as perdas; e 24% tiveram reajustes acima da inflação na data-base.

Paralelamente, conforme o levantamento do Dieese, houve crescimento no número de reajustes de categorias parcelados e escalonados. “A crise acaba reduzindo o poder de barganha do trabalhador nas negociações salariais”, observa o economista.

Levantamento da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe), com base nos dados do Ministério do Trabalho, confirma o movimento de negociações salariais abaixo da inflação. Mais da metade das negociações coletivas com vigência em agosto de 2016 não conseguiram sequer a inflação. Das 162 analisadas pela fundação, 17 não conseguiram repor a inflação e ainda levaram à redução de salário e de jornada.

Os programas de lay-off, que contemplam cortes de salário e da jornada, aconteceram com mais intensidade em 2015 e 2016, com destaque para as montadoras de automóveis.

Para o economista do Dieese-MG, é fato que o brasileiro está empobrecido. Além dos reajustes salariais abaixo da inflação, o que corrói a renda, Duca ressalta o aumento do desemprego formal dentre diversos outros fatores. “Além do salário fixo todo mês, a pessoa deixa de contar com outros benefícios oferecidos pelas empresas, entre eles, plano de saúde”, observa.

Segundo o levantamento mais recente da Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde), os planos de saúde registraram queda de 3,1% no número de usuários entre setembro de 2015 e setembro de 2016, o que representou a perda de 1,5 milhão de beneficiários no país.

Fernando Duca lembra que, com menos postos de trabalho, as pessoas são levadas para a informalidade. “E nesse caso, nem reajuste há”, frisa o economista.


Na mesa

Corte de gasto para contornar a crise

Com a crise, a vida da família da hoje dona de casa Waldete Saldanha mudou. “Em 2015, eu perdi o emprego de auxiliar de berçário de uma escola infantil, que teve redução de alunos. Assim, eles não precisavam mais do meu trabalho”, diz.

Waldete conta que a renda da família ficou menor e ela teve que se adaptar ao novo cenário da economia. “Reduzi as compras de alguns produtos, como o queijo canastra, que subiu muito, de R$14,90 para R$ 29,90”, ressalta. “Sou aposentada, ganho um salário. Assim, precisava trabalhar para complementar a renda”, frisa.

Com menos renda e com a inflação em alta, a dona de casa conta que a vida ficou pior nos dois últimos anos, em especial, em 2016.

E a última Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD) do IBGE não é nada animadora. O levantamento mostra que no intervalo de setembro a novembro de 2016, frente a igual período do ano anterior, houve queda de 3,7% no emprego com carteira de trabalho no setor privado, o que representou diminuição de 1,3 milhão de pessoas no mercado. (JG)