SEXO

Marmita vira sinônimo de pessoas que participam de sexo a três com casais

O não envolvimento emocional é regra número um para quem quer variar a "refeição"

Por Paulo Henrique Silva
Publicado em 24 de maio de 2024 | 06:40
 
 
 

Em outros tempos, a marmita – também conhecida como “quentinha” – não passava de um recipiente de metal, usado principalmente por trabalhadores, para guardar comida, oferecendo a facilidade de, na hora da refeição, poder esquentar o conteúdo. A geração Z tratou de “aquecer” ainda mais a expressão, levando-a para a cama. “Marmita” virou sinônimo de pessoa que participa de um ménage (sexo a três) com um casal.

Diferentemente da marmita antiga, em que sabíamos bem o que vinha dentro, a “refeição” em forma humana não pode ter nenhuma relação mais emocional com o par, já que a ideia é evitar qualquer problema conjugal mais tarde. Não é algo exatamente novo, mas tem aparecido nos cardápios sexuais com maior frequência, justamente devido ao perfil da geração nascida após a segunda metade da década de 1990, mais avessa a relações monogâmicas.

Principal site de relacionamentos extraconjugais do mundo, o Ashley Madison constatou, em pesquisa com seus usuários, que a geração Z é mais propensa a aderir ao conceito de não monogamia do que as gerações anteriores. Entre os brasileiros, 62% responderam “sim” para esse tipo de relacionamento. Para boa parte deles, a satisfação sexual não pode ser plenamente alcançada com um parceiro apenas.

“O desenho de marmita sexual envolve justamente o prazer momentâneo. Vamos imaginar que eu seja a marmita. Meu prazer é o de ser ‘comido’ e de ‘comer’, de estar nesta relação. Há, em nossa cultura, uma dificuldade muito grande de fazer uma separação entre sexo, intercurso sexual, prazer, amor e paixão. Fica tudo muito embolado”, observa Claudio Paixão, doutor em psicologia social e professor da Escola de Ciência da Informação (ECI) da UFMG.

“São conceitos diferentes, que podem se sobrepor, mas não necessariamente. E, como vários termos na sociedade, acabam sendo ressignificados”, destaca. Ele registra que, no universo LGBTQIA+, por exemplo, há muitas frases ou expressões pejorativas dirigidas a homens homossexuais ou mulheres lésbicas que foram ressignificadas por esses grupos – entre eles “bicha” e “sapatão”.

“Neste sentido, a ideia de marmita, embora esteja nesse contexto de ser objeto de prazer do outro, quando se pensa neste desprendimento emocional por parte de quem está ali, quando a pessoa encara isso como uma experiência prazerosa, ela pode também ressignificá-la. A ideia por trás disso é esta: a pessoa estar livre para essa experiência”, explica Paixão.

Por parte do casal, independentemente do tipo de relação entre eles, encomendar uma “marmita” não deve ser feito quando não estão bem. “Isso pode gerar ciúme e inveja. Tudo tem que ser muito conversado, trabalhado. A relação tem que ter bom senso de parte a parte, estabelecendo, desde o início, uma consciência de que aquela marmita será comida e o relacionamento será encerrado naquela noite, quando terminar a transa”.

Para quem pensa em encomendar uma “marmita” para casa, a regra é clara: “Nada de ficar contatando-a na ausência da parceira ou do parceiro. Nada de ficar retendo aquela pessoa, tentando estabelecer um vínculo com ela que seja diferente da proposta inicial. A regra deve ser sempre colocada para seu limite, e não para o limite do parceiro, como em qualquer relação com outra pessoa”.

Variação não está associada a relações não monogâmicas

Claudio Paixão põe uma interrogação sobre a associação da geração Z com as relações não monogâmicas. “É preciso entender, em primeiro lugar, o que é essa geração Z. Os estudos sobre ela são muitos recentes e contemplam bolhas, que por vezes não respondem a questões que são mais universais”, observa o especialista.

Ele concorda que esse tipo de relação está mais presente nas gerações atuais, mas não é algo generalizado. “Tem estudos que mostram que essa tendência está muito associada a certa situação econômica em que as pessoas têm condições de viver a sua independência financeira. Até por isso elas têm mais liberdade de escolha”.

Por outro lado, a insegurança financeira leva as pessoas a manter relações monogâmicas. Colocando tudo isso na balança, o que nos faz atrelar uma liberdade sexual à geração Z é, segundo Paixão, o desenho de um grupo muito específico que surge aos nossos olhos com uma dimensão muito maior do que usualmente poderia ter.

Paixão também contesta o vínculo de relação não monogâmica com o conceito de marmita sexual. “Essa associação é bem interessante, mas não é correta, porque, quando se fala de não monogamia, de relacionamento aberto, de poliamor, são estruturas diferentes do contexto de marmita. Há áreas cinzas entre elas, mas não indicam a mesma coisa”.

No caso da marmita sexual, há uma ideia de descarte. “Em tese, ela exclui o vínculo amoroso (com o terceiro participante). Você tem um relacionamento monogâmico e, dentro dele, resolve pedir uma pizza no fim de semana. Está com preguiça de cozinhar e querendo variar o prato, então pede uma pizza de abobrinha com queijo brie e cogumelos. Essa variação não diz respeito a afeto, mas somente a sexo”, explica.

“Quando se pede uma marmita, você quer uma comida rápida e que chegue à sua casa sem grandes compromissos. Tudo é mais simples, desfrutando daquele prazer. Na marmita sexual, depois desse desfrute, a pessoa vai embora e as coisas continuam como estavam. Grande parte das pessoas que experimentam a marmita não tem relações abertas”, afirma.

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