De uns anos para cá, as lentes de contato dentais viraram febre entre famosos e anônimos. Muitas pessoas com imperfeições nos dentes correram para os consultórios odontológicos para trocarem o sorriso natural por um branquíssimo e 100% alinhado.
Acontece que, em alguns casos, a busca pela perfeição levou ao exagero, e o resultado recebeu apelidos como “dentes de teclado de piano.” Alguns artistas, porém, resistiram a essa onda e mantiveram seus sorrisos naturais, tais quais Madonna, Ney Matogrosso e Elton John, que nunca quiseram “corrigir” a falha entre os dentes da frente, ou Freddie Mercury, cuja marca registrada eram os incisivos proeminentes.
Em produções audiovisuais recentes, também é possível identificar algumas “imperfeições dentais”. Aimee Lou Wood, por exemplo, sustenta dentes salientes na terceira temporada de “The White Lotus”; e Cynthia Erivo, indicada ao Oscar de Melhor Atriz por “Wicked”, não fez nenhum procedimento para esconder o diastema (espaço entre dois dentes).
E a busca por um sorriso natural parece não estar somente concentrada nas produções hollywoodianas. Nos consultórios brasileiros, pacientes vão à procura de procedimentos menos invasivos para um sorriso mais natural. É isso o que avaliam dentistas ouvidos pela reportagem de O TEMPO.
Isso não quer dizer, no entanto, que as pessoas tenham deixado de lado os procedimentos estéticos, mas desejam que eles fiquem mais próximo do natural possível.
“As pessoas ainda procuram muito o consultório para realizar lentes ou facetas, mas a mudança que tenho percebido nos últimos anos está na forma como esses pacientes têm expressado o desejo por uma melhora estética. Hoje, muitos já chegam com um receio grande de que o resultado fique artificial, seja pelo formato, pelo desgaste ou pela cor muito branca”, avalia o dentista Aloísio Napoleão, que também é mestre em odontologia e professor da UniArnaldo Centro Universitário de Belo Horizonte.
O cirurgião-dentista Rafael Grossi chama a atenção para o fato de que o termo “lente de contato” se popularizou amplamente nas redes sociais e acabou se tornando conhecido pelo público. “Infelizmente, em grande parte, esse termo é atrelado a trabalhos muito artificiais, tons excessivamente brancos, com excessos e falta de harmonia e naturalidade”, afirma.
Por isso, ele explica que outros termos são mais adequados para designar essa mudança nos dentes, como facetas ou laminados. “O trabalho pode ser realizado com diferentes materiais, como as facetas em resina composta e os laminados cerâmicos, que recebem indicações e diferentes planejamentos para cada tipo de caso”, comenta.
Além da possibilidade de ficar artificial, procedimentos invasivos nos dentes podem provocar alguns danos, conforme explica a dentista Larissa Valadares.
“Os riscos estão associados ao desgaste dental, necessário em alguns casos. Isso pode levar, por exemplo, a sensibilidade pós-operatória. Além disso, é um procedimento irreversível. Um dente desgastado jamais voltará a ser um dente saudável. Também existe o risco de haver um sobrecontorno (um excesso de material restaurador), que pode causar inflamação na gengiva e, em casos mais graves, perda óssea”, alerta a especialista.
Caso alguém queira reverter o procedimento, nem sempre será possível ter de volta os dentes naturais, porque tudo depende do preparo realizado, conforme indica o mestre em ortodontia e especialista em radiologia oral, Júlio Brant. “Em casos bem planejados, com mínimo ou nenhum desgaste, a reversão pode ser feita com segurança. No entanto, se houve desgaste significativo do esmalte dental, a reversão completa é inviável, sendo necessário manter algum tipo de reabilitação”, afirma.
Quando procurar um dentista?
Há situações em que um diastema ou desalinhamento deixa de ser apenas uma característica estética e passa a exigir intervenção por questões de saúde bucal. Isso ocorre, por exemplo, quando há apinhamento (dentes muito próximos e levemente girados) ou por espaços muito grandes entre os dentes que possam causar desconforto.
“Esses apinhamentos ou diastemas podem indicar necessidade de tratamentos ortodônticos, com a finalidade de fazer com que os dentes estejam corretamente posicionados e engrenados, gerando assim melhora nas funções gerais do sistema, como mastigação, fonética e até respiração em alguns casos”, explica o dentista Aloísio Napoleão.
Cirurgião-dentista, Rafael Grossi enumera outros problemas que podem ser provocados pela estrutura dentária. “Quando há comprometimento funcional ou à saúde bucal do paciente podemos citar alteração na fala, sobrecarga às estruturas periodontais, malefícios à saúde gengival (por dificuldade de higienização, por exemplo) ou alterações oclusais e de engrenamento do sistema estomatognático como um todo. Nesses casos, a intervenção é indicada por razões clínicas, preventivas e funcionais”, recomenda.
Também é preciso ter em mente que dentes artificialmente brancos não são necessariamente sinônimos de saúde. “Dentes naturalmente mais amarelados, por exemplo, podem estar perfeitamente saudáveis. A educação do paciente é fundamental nesse processo: entender que saúde bucal vai muito além da aparência”, salienta o mestre em ortodontia e especialista em radiologia oral, Júlio Brant.
Mestre e doutora em odontologia, Adriana Vieira Martins, avalia que saúde e estética devem caminhar juntos em qualquer tomada de decisão sobre os dentes.
“Entre modismos, o que realmente nunca sai de moda é a saúde bucal. Já vimos a era dos sorrisos superalinhados, branquíssimos e milimetricamente idênticos. Agora, vivemos o momento da valorização do natural, com diastemas, imperfeições e singularidades sendo celebradas. Mas será que precisamos escolher um lado? Como profissional, acredito no equilíbrio: respeitar a individualidade de cada caso, de cada sorriso. Nem padronização extrema, nem desarmonização forçada. Cada caso é único, e o papel da odontologia moderna é justamente o de orientar escolhas conscientes, que unam estética, saúde e função”, pondera ela, que também é cirurgiã dentista e professora da Una Sete Lagoas.
Dentes bonitos, mas livres de procedimentos invasivos
Existem tratamentos que podem dar um tapa no visual dos dentes sem necessariamente ser invasivo. A dentista Larissa Valadares explica, por exemplo, que “um bom profissional nunca vai indicar um tratamento invasivo quando um conservador resolve a queixa do paciente.”
Por isso, na avaliação dela, “é importante pesquisar bastante sobre o profissional ou até mesmo procurar uma segunda opinião antes de decidir por qualquer procedimento que seja irreversível.”
Quando se deseja alterar a coloração, por exemplo, uma alternativa é o clareamento. “Esse procedimento pode ser realizado de forma caseira com a supervisão de um profissional ou no consultório aplicado pelo dentista, melhorando a cor dos dentes de forma eficaz e conservadora”, explica o dentista Aloísio Napoleão.
Outra opção indicada pelo dentista Júlio Brant são pequenos recontornos estéticos ou restaurações com resina. “E em alguns casos, alinhadores transparentes para correções leves. A escolha ideal depende da expectativa do paciente e da condição dos dentes”, explica.