Em cima de um palco, iluminado por uma luz rosa, o historiador e palestrante Leandro Karnal caminha em um chão amadeirado, com um microfone nas mãos. Uma multidão o observa. “A ofensa pessoal é uma necessidade daquele que agride. Nasce de uma dor daquela pessoa, surge de uma inveja, é despertada por uma ferida interna que incomoda. Diferente da crítica objetiva, a ofensa pessoal grita que algo está errado com o autor da ofensa. Entenda sempre que aquilo pertence ao agressor e aceite que não te envolve. (...) Nunca seja o coletor do lixo alheio”, escreveu em um post no Facebook. Um seguidor, talvez aflito com o conselho, perguntou: “E se sentir ofendido é uma opção ou não?”. Sem rodeios, veio a resposta de Karnal: “Sempre”.
A ofensa diz mais sobre quem a profere do que sobre quem é atingido. Mas geralmente não sabemos como nos portar quando somos alvos de palavras duras. Como deixa claro o historiador, não há problema em se sentir ofendido. Muito pelo contrário. “Quando negamos sentimentos de raiva ou de mágoa, eles podem ser canalizados de outras formas, até mesmo sintomáticas”, avalia a psicóloga e mentora de carreira Viviane Rogêdo.
Sintomas, estes, que podem ser reconhecidos tanto na saúde mental, com a depressão e a ansiedade, quanto na física – manchas e erupções pelo corpo, enxaqueca, dores de cabeça e problemas intestinais são os mais comuns. “Culturalmente, vivemos na era da busca extrema da felicidade, mas precisamos também acolher os sentimentos que vêm quando nos sentimos ofendidos”, destaca a profissional.
A estudante de teatro Laís Carmona, 28, procura agir assim. Segundo ela, a maturidade fez com que percebesse o real valor de uma ofensa. “É uma evolução na qual deixamos de nos preocupar com o que vem do outro. Mas caso, de fato, eu fique ofendida com algo a meu respeito, procuro dialogar com quem proferiu tal ofensa”, argumenta. Só há uma exceção: quando a ofensa é voltada para um ente querido: “Costumo virar bicho! Defendo com unhas e dentes e discuto à beça”, enfatiza.
Identificação
Antes de traçar alternativas para saber como lidar com uma afronta, é importante saber como identificá-la. Um discurso ofensivo pode ser entendido de diferentes formas, a depender de quem o profere, de quais palavras são usadas e do nosso estado emocional.
“A ofensa pode liberar gatilhos que têm a ver com a nossa própria história. Eu observo que, com meus pacientes, por exemplo, situações semelhantes são recebidas de maneiras diferentes. Uma pessoa em luto ou com depressão, por exemplo, pode estar mais suscetível a se ofender do que outra pessoa fora dessa situação”, exemplifica a psicóloga.
E reconhecer como um desrespeito pode nos afetar passa fatalmente pelo caminho do autoconhecimento. “Esse processo começa quando sabemos a separar o que é nosso do que é do outro”, assinala. Fazer perguntas como “de zero a dez, quanto isso me afeta?” e “se eu brigar, vai fazer com que eu gaste ou invista energia?” pode contribuir para saber como reagir diante de uma mágoa.
"Outro caminho é saber trabalhar o equilíbrio emocional, não só na psicoterapia, mas também reconhecendo os próprios caminhos e aprendendo a lidar com os sentimentos”, aconselha.
Há de observar, ainda, a intenção do outro ao usar palavras duras. “Percentualmente, tendemos a achar ofensivo algo que talvez nem seja. Na terapia de casal, por exemplo, eu observo que há uma falha na comunicação entre o casal. Na conversa, entendemos qual necessidade não foi atendida, se houve alguma falta e, dessa forma, trabalha-se a comunicação para que ambos entendam os próprios sentimentos e como eles são afetados”, esclarece Viviane.
Isso, Viviane ressalta, quando se trata de um relacionamento saudável, em que há rusgas para acertar. Em uma relação abusiva, marcada por violência psicológica e verbal, não há espaço para diálogos, e, sim, busca por caminhos para sair dele. “Tem ofensas que, de fato, impactam mais do que outras, mas, tratando-se de um relacionamento abusivo, não há o que discutir”, finaliza.