Bem-estar

Crise da meia-idade: pessoas entre 40 e 50 anos tendem a ser mais estressadas

Além de alcançar o pico do estresse no trabalho, grupo está mais vulnerável a sintomas depressivos


Publicado em 26 de setembro de 2022 | 03:00
 
 
 
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A princípio, pode soar como um paradoxo: mesmo eventualmente estando em uma situação econômica mais estável e ainda sem sofrer tanto os efeitos do envelhecimento sobre o organismo, pessoas entre 40 e 50 anos tendem a se sentir mais infelizes na comparação a outros grupos etários. É o que indica uma pesquisa conduzida por economistas do Reino Unidos, Estados Unidos e Cingapura. Segundo o estudo, é nessa fase que chegamos ao pico do estresse no trabalho – onde nos sentimos mais sobrecarregados do que nunca. É também na meia-idade que queixas relacionadas à insônia e dores de cabeça são mais comuns, além de serem mais recorrentes distúrbios ansiosos e de humor, entre eles, a depressão.

Considerando que, socioculturalmente, o ideal de sucesso aparece atrelado a fatores como ganhos financeiros, os dados causam algum espanto, motivo pelo qual o fenômeno foi chamado de “paradoxo perturbador”. A psicóloga e pesquisadora Renata Borja, por outro lado, não se surpreendeu, justamente por ter estudado, em sua dissertação de mestrado, a interseção entre a noção coletiva e individual de sucesso, e os reflexos dessa compreensão sobre o bem-estar. “Somos ensinados que bem-sucedidos são aqueles que conquistam poder, status e dinheiro. É a partir desses elementos que avaliamos, de fora, se alguém alcançou sucesso”, pondera ela. 

Dicotomia. No entanto, ressalta, nem sempre esses critérios são os que, intimamente, julgamos significar um êxito na vida. “Pode ser que, individualmente, mais importante que ter dinheiro, seria ter tempo. Mais que ter status, tranquilidade. E mais que ter poder, seria estar em relacionamentos positivos”, pontua.

Renata frisa que é justamente quando não nos damos conta dessa distorção entre a noção interna e externa do que é ser bem-sucedido, quando nos empenhamos em buscar objetivos que não são autenticamente nossos, que ficamos mais vulneráveis a, depois, ter que lidar com a frustração. 

Um dado curioso da pesquisa promovida por Renata é que, convidados a completar a sentença “ter sucesso é…”, foi na faixa etária dos 46 aos 55 anos que a expressão “fazer o que quiser” aparece com mais força. Agrava o problema o fato de que muitos se sentem “velhos demais” para refazer rotas e, mesmo descontentes, preferem não se aventurar em outros projetos.

Esse quadro geral ajuda a entender o porquê de esse grupo se sentir menos otimista. “Quando questionados se eles se sentem pessimistas, 7,4% das pessoas entre 46 e 55 anos disseram que a sentença se aplica muito ou totalmente a eles. Em segundo lugar, 5% das pessoas entre 26 e 35 anos responderam o mesmo. Entre as de 36 a 45 anos, terceira posição no ranking, o índice foi de 4,82%”, comenta.

Etarismo. Renata adverte que, embora contribua para o fenômeno, a distorção da compreensão do sucesso não explica, por si, a crise da meia-idade identificada pelos estudiosos do Reino Unidos, Estados Unidos e Cingapura.

Outro aspecto destacado pela psicóloga é o etarismo no mercado de trabalho. Um episódio recente, que acabou viralizando, ilustra bem como a discriminação associada à idade pode ser especialmente cruel entre os 40 e 50 anos. O caso veio à tona no início deste mês, quando o operador de logística Carlos Augusto Luchetti Junior, 45, se candidatou a uma vaga de auxiliar de estoque, em uma empresa de recrutamento em Florianópolis. “Cancelaaaaaaaa, passou da idade (sic)”, foi a resposta obtida por ele.

“Do ponto de vista profissional, a pessoa na meia-idade, embora esteja ainda muito produtiva, passa a ser assombrada pelo risco de ser substituída por outra mais jovem, infelizmente um expediente relativamente comum. Como consequência, esses trabalhadores sentem-se mais pressionados e, para evitar o desligamento, muitas vezes se sobrecarregam, ficando ainda mais estressados”, analisa Renata. 

A pesquisadora situa que o temor se acentua frente à perda de colegas e à renovação do quadro de funcionários de uma empresa. “A pessoa pode temer ser a próxima”, diz, salientando que tanta apreensão e autocobrança pode contribuir para a ocorrência de transtornos de ansiedade e de humor.

Ela encontrou ecos desse fenômeno em sua pesquisa. “Embora tenha identificado que esse público se sente muito capaz, percebi que é menos autoconfiante, certamente por se sentir mais descartável, dada a lógica de mercado”, informa, citando que, quando inquiridos se acreditam no próprio potencial, 22% dos respondentes entre 46 e 55 anos disseram que a sentença se aplica muito ou totalmente. Entre pessoas de 18 a 25 anos, o índice sobe para 28%, chegando a 32% após os 65 anos.

Aspectos biológicos. Renata Borja ainda sublinha que fatores biológicos também precisam ser considerados. “Nessa faixa etária, a mulher está entrando na menopausa e, o homem, na andropausa. E sabemos que, sim, essas alterações hormonais podem provocar, por exemplo, distúrbios do sono, podendo motivar ou agravar questões psicológicas e emocionais”, comenta.

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