Procurados na maioria das vezes por quem quer emagrecer ou adotar hábitos alimentares saudáveis, os nutricionistas têm a responsabilidade de contribuir com a promoção da saúde por meio da alimentação. Um levantamento sobre a atuação desse profissional no Brasil, porém, revelou que 45% dos nutricionistas analisados prescreveram dietas desequilibradas. O estudo divulgado pela Proteste Associação de Consumidores na semana passada gerou indignação entre os profissionais e conselhos de nutrição.

Para realizar o levantamento, a Proteste contou com dois perfis de pacientes: um de pessoas obesas – com Índice de Massa Corporal (IMC) acima de 25 –, e outro de pouco peso – IMC 17. O índice é um cálculo que se baseia na relação entre o peso e altura de uma pessoa, sendo considerado satisfatório entre 18,5 e 24,9.

Cada um dos quatro pacientes da pesquisa foi a dez consultas particulares, em São Paulo e no Rio de Janeiro, totalizando 40 visitas anônimas, e os mesmos nutricionistas foram procurados pelos dois grupos. Para uma pessoa de baixo peso, chegou a ser indicada por três nutricionistas diferentes dieta semelhante à prescrita para uma obesa. Cerca de 30% dos nutricionistas procurados por pessoas magras prescreveram dietas hipocalóricas (com restrição de calorias). Para os pacientes obesos, foram constatados erros comuns, como a indicação de perda de peso imediata.

As consultas rápidas, muitas vezes feitas com pressa e com pouca coleta de dados, segundo a pesquisadora de saúde da Proteste Bárbara Guerra, acabaram levando os profissionais a recomendarem dietas prontas e que não estavam de acordo com cada perfil. “Alguns profissionais nem chegaram a medir o peso e a altura, outros indicaram suplementos que deveriam ser comprados em uma determinada farmácia. Deveria ter uma melhor fiscalização, porque cada dieta deve ser montada adequada ao perfil, personalizada, além de considerar a realidade de cada paciente, seus hábitos e preferências para atender as necessidades de cada pessoa”, afirma.

A blogueira fitness Juliana Falchetto, 34, conta que já passou por duas situações ruins. “A primeira foi com uma nutricionista que prescreveu uma dieta de 600 calorias diárias, sendo que eu já corria e praticava outras atividades físicas. Na segunda vez, a profissional, além de passar uma dieta cheia de biscoitinhos e lanchinhos industrializados, fez recomendação exatamente igual à prescrita para outra amiga”, lembra Juliana.

Depois de abandonar os dois tratamentos sugeridos, uma vez que ambos não se adequavam a sua realidade, Juliana tem bem claro o que espera de uma “boa nutricionista”. “Uma profissional que entenda sua rotina, suas necessidades e objetivos e que dê valor à comida de verdade”, resume.

Resposta. O relatório da Proteste ressalta que a amostra não permite generalização dos resultados. Diante de um grande volume de comentários deixados no Facebook da associação criticando o estudo, a Proteste informou que “quer alertar que existem maus profissionais no mercado, que acabam prejudicando pacientes e também todos os bons nutricionistas de maneira geral”.

O Sistema Conselhos Federal e Regionais de Nutricionistas (CFN/CRN) publicou uma nota contra o estudo. Para o órgão, a pesquisa não reflete a realidade brasileira, pois analisou uma parcela irrelevante (0,04%) de um universo de mais de 100 mil nutricionistas inscritos. “As informações apresentadas e a metodologia utilizada basearam-se numa amostragem irrisória. Além disso, não informa o teor das perguntas nem como foram conduzidas”, rebateu.

O Sistema CFN/CRN orienta que qualquer paciente que porventura se sinta lesado em função de um atendimento realizado por nutricionista procure os conselhos de nutricionistas para averiguação de tais condutas. “Também adotaremos as devidas medidas judiciais contra o estudo”, conclui.

Reação. Durante a apuração da matéria, a reportagem recebeu uma série de mensagens, inclusive algumas em tom exaltado, de nutricionistas revoltados com a divulgação do estudo. A reportagem fez o convite para que todos participassem da matéria, mas nenhum deles aceitou.

113.840 nutricionistas atuam no Brasil, sendo 11.250 em Minas Gerais, segundo o CFN

R$ 80 a R$ 1.930 variou o preço das 20 consultas, no RJ e SP, pesquisadas pela Proteste

1.200 kcal é a quantidade que a mulher deve ingerir diariamente, e os homens, 1500 kcal 

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Dietas do jejum intermitente e de ex-BBB recebem críticas

Duas práticas mais recentes no mundo fitness têm chamado atenção dos aficionados por novidades, apesar de ambas serem condenadas por especialistas. Uma delas é a dieta do jejum intermitente, que em alguns protocolos prega que a pessoa fique até 24 horas sem comer pelo menos duas vezes por semana. Para especialistas, a prática é arriscada e tem o efeito sanfona como consequência. Outro método de emagrecimento que tem recebido uma série de críticas de alguns adeptos é o programa #MayraCardiSecavc, da ex-BBB Mayra Cardi. Algumas clientes ouvidas pelo jornal “Extra” reclamaram de cardápios iguais e de serem mal atendidas. A assessoria de imprensa da ex-BBB foi procurada, mas não quis se posicionar sobre o assunto. Segundo a presidente do Conselho Regional de Nutricionistas de Minas Gerais, Elisabeth Chiari, antes de fazer qualquer dieta é preciso escolher um profissional habilitado.

“Qualquer dieta deve ser personalizada. O paciente deve pedir para ver a carteirinha do Conselho, pois sabemos que tem gente se intitulando e que não é nutricionista”, diz.


Minientrevista

Danilo Balu
Bacharel em esporte e consultor de nutrição pela Universidade de São Paulo (USP)
Autor do livro “O Nutricionista Clandestino”

Qual é sua avaliação sobre esse estudo da Proteste?

O mundo da nutrição é um mundo de teoria, de sonho, de ilusão. Sabemos que a dieta hipocalórica para perder peso já não funciona, e os profissionais continuam a usar o mesmo “remédio”.

Por que as dietas como estão sendo passadas não são as corretas?

Porque se a ideia de comer menos, de três em três horas, e fazer uma dieta hipocalórica resolvesse, a pessoa iria fazer isso uma vez e emagrecer. Qualquer pessoa acima do peso está vulnerável a essas promessas. Isso abre a torneira para um monte de picaretas.

Nesse caso, onde você acha que a falha está acontecendo? Na educação ou na fiscalização?

A fiscalização é o de menos. O problema maior é que a nutrição não é uma ciência baseada em dados científicos, e as universidades estão diplomando pessoas, ensinando diretrizes que carecem de comprovação científica. Todas são iguais. Eu estudei na melhor e tudo o que eu aprendi lá tenho que esquecer, pois se eu for aplicar vou acabar deixando a pessoa mais doente. Não é que o nutricionista seja mau caráter, eles só fazem o que aprenderam, aplicando um “remédio” fraco.

Por que então muitas pessoas conseguem emagrecer e manter esse estilo de vida?

Temos que imaginar que existem pessoas de todos os tipos, aquela que fumou até os 90 anos, outra que só comeu porcaria e viveu até os cem... A individualidade biológica permite que as pessoas façam o que seria errado dar certo para um indivíduo.

Todas essas dietas podem ter consequências?

Hoje a nutrição está nas trevas, mas ainda vai aparecer muita dieta. Ninguém vai morrer fazendo duas semanas de dieta da sopa ou uma semana de low carb, mas ninguém aguenta por muito tempo.

Você quer dizer que a reeducação alimentar então é a melhor opção?

Se tiver que dar uma dica eu diria: coma como comia sua avó no começo da vida dela. Como comia uma pessoa nos anos 50. Não tinha muito alimento processado, margarina, nada light ou diet, mas comer comida de verdade, legumes, verduras, carnes... Assim vai ser muito difícil você engordar.

No seu livro você contradiz alguns “mitos” da nutrição.

O primeiro é que a obesidade não é uma questão de valor calórico. O processo de engorda não é um desbalanço calórico, é fisiológico. O excesso de insulina circulante é que faz engordar.

Como controlar isso?

A principal regra seria reduzir as quantidades de carboidratos consumidos e processados, como açúcar, farinhas, pães, bolos, lembrando que não falei de frutas e folhas, que têm carboidratos também. E comer menos vezes, por volta de três refeições por dia, pois quando se come menos já fica mais sensível à insulina.

Por que você diz que procurar um nutricionista esportivo é um péssimo negócio?

Com saúde, as pessoas não deveriam procurar nutricionistas, porque a nutrição não tem embasamento científico e, quando se vai a um nutricionista, as chances de ele te aplicar algo errado é grande. Quanto mais vezes for, mais vezes fica exposto a ser submetido a um processo que é ruim. Na verdade, quando está com saúde não deveria procurar nenhum médico. O erro médico já é a maior causa de morte no país.

Você então é contra o check-up?

Completamente. Se você tem 60 anos e vai fazer mamografia tudo bem, mas querer ir antes dos 40 aumentam as chances de se dar mal, porque é aí que entra o erro médico, o falso positivo.

Mas aí então eu sigo uma dieta da minha cabeça?

É meio irônico, mas procure alguém que não vai aplicar o que aprendeu na faculdade, ou procure alguém que entenda da fisiologia da insulina, conteúdo que não é ensinado nas faculdades de nutrição. E a dica para a vida é: coma como sua avó comia.