“Curtir”, “comentar” e “compartilhar” já são palavras do dicionário popular brasileiro há tempos. Em 2019, que marca o 15º aniversário do Facebook, 88% dos internautas utilizam redes sociais pelo menos uma vez mensalmente. O país é campeão de acessos na América Latina, à frente de Argentina (83%) e México (80%), por exemplo.
Entre os Estados brasileiros, Minas é vice no ranking: os mineiros representam cerca de 14% dessa soma, atrás apenas dos de São Paulo, onde estão 32% dos usuários. Os dados são da consultora internacional de marketing Comscore, com base no comportamento online de 50 mil internautas.
O gosto brasileiro por convívio é uma das hipóteses para explicar a adesão em massa do país às redes. “Essas ferramentas dariam vazão a uma forma de sociabilidade característica do brasileiro, de se organizar em grupos, manter laços de maneira mais cotidiana e se falar mais frequentemente”, explica Carlos D’Andrea, pesquisador do Núcleo de Pesquisa em Conexões Intermidiáticas (NucCon), da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
Ele chama atenção para o paralelo entre conquistas econômicas do país na última década e o fortalecimento das redes: “O período em que o país esteve em um processo de inclusão financeira e de cidadania via consumo também foi um período de expansão do consumo de internet”, explica.
Sem idade
Segundo o levantamento, a faixa etária mais presente nas redes é a de adultos acima de 45 anos, seguida pelo grupo de 25 aos 34. O alcance é geral – mas elas alcançam todas as idades. A professora aposentada Cibele Guimarães, 50, aderiu ao Facebook há cinco anos, depois de descobrir, pela TV, um grupo online para quem gosta de gatos.
A média de tempo de uso das redes é de quase quatro horas mensais, segundo a pesquisa. Mas Cibele ultrapassa a marca. Ela fica mais de duas horas por dia conversando com membros da comunidade por mensagens. “A gente se fala todos os dias, cada um de um canto do país. Falamos de alguém que encheu o saco, dos problemas da mãe… É o trivial do trivial”, relata.
Quando chegar à idade de Cibele, é provável que João Lucas Lopes Bueno seja bem mais experiente com as redes. Aos 4 anos, ele já tem um conta no Instagram em seu nome – e mais de 6.000 seguidores. Ela foi criada e é gerenciada pela mãe, a advogada Ana Camilla Bueno, 36, por sugestão de uma agência de atores e modelos mirins. Ana gosta de ter álbuns de família impressos, mas o Instagram já é mais uma forma de registro do crescimento do filho. “Ele tem até uma hashtag”, conta.
Tá na mão
O designer Thômaz Silva, 23, cresceu com as redes. A primeira em que entrou, aos 12 anos, foi o finado Orkut, tão popular no Brasil entre 2004 e 2014. “Na época, eu nem tinha computador, porque não era de fácil acesso, então eu ia à lan house acessar o Orkut. No sábado, pagava por umas dez horas e ficava navegando umas cinco direto”, lembra.
Hoje, acompanhando a tendência notada pela pesquisa da Comscore, ele usa principalmente o celular para as redes – o acesso móvel é o mais comum. O jovem acredita que isso piorou sua relação com elas. “Antes, eu vivia a minha vida e queria entrar em casa para ver as mensagens. Agora, a gente tem tudo na mão e é bombardeado o tempo inteiro. Eu acho ruim, a gente acaba sendo refém do celular”, declara.
Difusão de mentiras e ‘comércio’ de dados
Num cenário em que governantes trocam farpas via tuítes e o presidente do Brasil usa lives do Facebook para se comunicar com os eleitores, as redes sociais tornaram-se elemento central na discussão sobre os rumos do governo. “A ideia de que elas fomentariam a democracia foi uma coisa romântica dos anos 90. Elas se tornaram até empecilhos fortes, com a circulação de fake news”, diz a professora Geane Alzamora, pesquisadora Núcleo de Pesquisa em Conexões Intermidiáticas (NucCon), da Universidade Federal de Minas Gerais.
Ainda assim, ela acredita que não é possível dizer que a ascensão das redes seja necessariamente positiva ou danosa. “As redes sociais são componentes da nossa vida cotidiana. A tecnologia não é, em si, ruim ou boa. Ruins ou bons são os usos dela”, explica.
O professor Carlos D’Andrea lembra que as redes sociais não são “mera conexão desinteressada entre duas pessoas ou um grupo”. Por trás delas estão empresas com interesses comerciais estratégicos. Segundo um ranking da revista “Forbes”, o Facebook é a quinta marca mais valiosa do mundo (com valor de quase US$ 89 bilhões).
“As pessoas têm que ter consciência de que, quando entram nesses serviços, que são gratuitos, o que oferecem como pagamento são seus dados e informações, o que mais vale hoje em dia”, pontua Geane.
Quase 40% dos posts são propaganda
O relatório da Comscore indica que o Brasil é o país com a maior quantidade de posts pagos no Facebook na América Latina – 38% do total de postagens de páginas são propagandas. O comerciante de ferramentas de jardinagem Frederico Fonseca, 50, é um dos que apostam nas redes para alavancar os negócios. “Ainda não vi retorno direto, de alguém dizendo que chegou à loja pelo Instagram, mas acredito que possa ter atingido pessoas assim”, diz.
Nos momentos livres, ele gosta de usar principalmente o Twitter para acompanhar a opinião de nomes como o chargista Duke e o repórter Guga Chacra. De acordo com a Comscore, os jornalistas estão em quinto lugar na lista de influenciadores mais seguidos, atrás de músicos, atletas, políticos e artistas. O mercado dos influenciadores é mais um filão: 38% das ações nas redes têm relação com algum desses cinco tipos de perfil.