Os advogados do X (antigo Twitter) no Brasil disseram ao ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), que os executivos da empresa no país não têm “capacidade” de interferir na administração da plataforma, por isso não garantem o cumprimento de ordens judiciais, como as expedidas pela Corte para bloquear investigados no inquérito das fake news.

A defesa dos representantes da plataforma no Brasil se pronunciaram após Moraes mandar abrir uma investigação contra Elon Musk, o bilionário sul-africano que comprou o Twitter e mudou o nome para X. A informação foi enviada ao ministro na madrugada desta terça-feira (9) e anexada ao inquérito das fake news, que teve Musk incluído como investigado após início de ataques em série a Moraes.

O inquérito, que tem Moraes como relator, é baseado em investigações da Polícia Federal (PF) e já rendeu diferentes operações. Com o pedido para investigar as intenções das postagens de Musk contra o ministro e o judiciário brasileiro, a PF quer convocar representantes do X no Brasil para prestar esclarecimentos. 

Segundo os advogados, há “limites jurídicos, técnicos e físicos” do X Brasil e seu representante legal. Alegam que o X Brasil tem “personalidade jurídica própria, autônoma e independente das Operadoras do X”, e que por isso “não possui qualquer relação com a gestão, operacionalização e administração da plataforma”.

Os advogados dizem ainda que os negócios do X Brasil se resumem a comercializar e promover a rede e veiculação de publicidade virtual. Dessa forma, os administradores da empresa no Brasil esperam convencer Moraes que não têm responsabilidade pela gestão da rede social. Afirmam que ela é operada e provida pelas empresas X Corp e Twitter International Company, sediadas nos Estados Unidos e na Irlanda. 

“Deve-se, no entanto, pontuar limites jurídicos, técnicos e físicos do X BRASIL e, notadamente de seu representante legal. Eles não detêm capacidade alguma para interferir na administração e operação da plataforma, tampouco autoridade para a tomada de decisões relativas ao cumprimento de ordens judiciais nesse sentido”, argumentam os advogados.

“Há impossibilidade física para tanto. Esta prerrogativa é exclusiva das Operadoras do X, que são as provedoras e operadoras da plataforma e que, portanto, detêm a responsabilidade integral pela sua gestão operacional ou decisória. Estas explicações são simplesmente fáticas e não jurídicas”, completam.

Por fim, os advogados do X Brasil informaram que se limitam a comunicar e encaminhar decisões judiciais às operadoras do X, com escritórios nos Estados Unidos e na Irlanda.

“No que se refere a ofícios, ordens e requisições de autoridades públicas e judiciárias endereçadas ao X Brasil que dizem respeito às ações das Operadoras X, sua atuação é restrita à imediata comunicação e reencaminhamento às Operadoras do X. As Operadoras do X são as exclusivas responsáveis pela tomada de qualquer decisão sobre os ofícios, ordens e requisições que venham a ser encaminhadas pela X Brasil”.

Musk não cessa ataques contra Moraes e atinge também Lula

Elon Musk não cessa os ataques a Alexandre de Moraes. E ele subiu o tom em relação à série de postagens agressivas que começou no sábado (6). Na madrugada desta terça-feira (9), escreveu no X que o magistrado brasileiro é um “ditador brutal” que tem na “coleira” o presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

“Como Alexandre se tornou o ditador do Brasil? Ele tem Lula numa coleira”, publicou Musk. Ele também compartilhou publicação de políticos brasileiros, como o deputado federal Marcel Van Hattem (Novo-RS) que criticavam Moraes. Em resposta ao parlamentar gaúcho, Musk afirmou que foi Moraes “quem tirou Lula da cadeia” e que por isso “o presidente não toma ações contra ele”.

A postagem de Musk é inverídica. A decisão que tirou Lula da cadeia foi a que barrou a prisão em segunda instância. Moraes votou a favor da prisão e, portanto, contra os interesses de Lula. No domingo (7), por ordem de Moraes, dono da X entrou para lista de investigados no inquérito que apura a existência de milícias digitais antidemocráticas e seu financiamento.

Em outra postagem, Musk compartilhou a mensagem de um usuário que exaltou o fato de o governo de Jair Bolsonaro ter “reconhecido as contribuições excepcionais de @elonmusk para o Brasil, considerando-o um verdadeiro e estimado amigo da nação”. Bolsonaro, seus filhos , políticos aliados e seguidores têm elogiado Musk pelos ataques a Moraes.

Musk também falou na possível retirada de funcionários da X que atuam no Brasil. “Precisamos levar nossos funcionários no Brasil para um lugar seguro ou, de outra forma, retirá-los de posições de responsabilidade. Depois disso, faremos um completo vazamento de dados. Eles foram informados de que serão presos”, escreveu o bilionário.

Confira abaixo o passo a passo a escalada de Musk contra a Justiça brasileira e as consequências até o momento:

  • No sábado (6), Musk publicou em cima de uma postagem de Moraes no X a seguinte provocação: “Por que você está exigindo tanta censura no Brasil?”.
  • Também no sábado, Musk disse que o X reativará contas bloqueadas por ordem judicial, mesmo que isso custe o fechamento da empresa no Brasil.
  • No domingo, Musk postou uma foto de Moraes e disse que ele é o Darth Vader do Brasil, em referência ao vilão de Star Wars.
  • Ainda no domingo, o dono do X afirmou que Alexandre de Moraes deve “renunciar ou sofrer um impeachment”. 
  • O bilionário também disse que o magistrado “traiu descaradamente e repetidamente a Constituição e a população do Brasil”.
  • O empresário ainda afirmou que publicará “em breve” na rede social tudo que é exigido por Moraes, dizendo que essas solicitações “violam a lei brasileira”
  • Após os sucessivos ataques do bilionário, Moraes tomou decisões na noite do domingo, como a inclusão de Musk no no inquérito das milícias digitais.
  • O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD), ministros do STF e integrantes do governo Lula cobraram a regulação das redes sociais.  

Musk, que prega a liberdade de expressão, defende regimes autoritários e bloqueou contas no X

Elon Musk, que diz defender a democracia e a liberdade de expressão ao usar a X para atacar o Moraes e ameaçar não criar medidas judiciais, é um defensor do regime opressor chinês, onde a internet é controlada pelo governo e só plataformas locais podem ser acessadas pelos cidadãos e mesmo estrangeiros.

Sem poder lucrar com a X na China, Musk mantém negócios no país comunista  por meio da Tesla, sua empresa de carros elétricos. Ela inclusive tem uma fábrica em Xangai, a capital econômica do país asiático. 

Enquanto lidera uma cruzada contra o STF e Moraes no Brasil em nome de uma suposta liberdade, Musk se aliou ao governo ditatorial chinês na disputa por Taiwan. Mais de uma vez, na X e em entrevistas, ele sugeriu que Taiwan deveria ceder às pressões chinesas.

Dias antes, Musk havia defendido uma posição parecida em relação à Ucrânia. Na ocasião, ele disse que o governo ucraniano deveria ceder parte do território aos russo para por fim à guerra iniciada com uma invasão ordenada por Vladimir Putin, aliado da China que também não preza pela liberdade de expressão.

Para a China, Taiwan é uma província rebelde que segue fazendo parte de seu território, mesmo após décadas de independência administrativa e econômica. Taiwan tem uma Constituição própria. Sua posição é apoiada por grande parte dos países ocidentais, incluindo os Estados Unidos.

Musk já suspendeu contas de jornalistas arbitrariamente

Em sua investida contra Moraes, Musk acusou o magistrado brasileiro de “censura”. Reclamou da suspensão de contas na sua rede X por ordens judiciais. Chegou a pedir a destituição do desafeto e falou que aceita correr o risco de perder dinheiro com possível banimento da plataforma do Brasil em nome da liberdade de expressão e da democracia, segundo ele, um valor inegociável.

Mas o mesmo Musk, que vive disputando a liderança de homem mais rico do planeta, já defendeu golpe contra presidente eleito democraticamente e suspendeu contas de jornalistas arbitrariamente.

Musk fez uma onda de suspensões no antigo Twitter em dezembro de 2022, dois meses após comprar a empresa, que teve o nome mudado para X. A lista de contas bloqueadas incluía funcionários de veículos norte-americanos como CNN, The New York Times e The Washington, principalmente profissionais que cobriam o cotidiano do bilionário e suas empresas.

O motivo para o banimento, segundo Elon Musk, seria a divulgação de informações privadas dele na rede social, prática conhecida como doxxing. No entanto, o endereço de Musk não foi compartilhado. Os jornalistas fizeram postagens sobre o Elon Jet, projeto de um estudante que usa informações públicas para informar a localização do jato privado do empresário.

Pouco antes da suspensão das contas dos jornalistas, o Twitter baniu a conta que fazia o monitoramento do jato de Elon Musk com base em informações públicas. A medida ocorreu graças a uma nova regra criada pelo dono da companhia. A nova diretriz também foi usada como motivo para derrubar a conta dos jornalistas

Musk restabeleceu as contas suspensas de jornalistas no Twitter após forte pressão de diversos setores da sociedade norte-americana, além de ameaças de sanção por parte da União Europeia.

Musk já disse que dará golpe de Estado com os EUA onde quiser

Dois anos antes desse episódio, Musk disse, no Twitter, que ele e os EUA dariam golpe de Estado golpe em qualquer país, para atingir seus interesses econômicos. 

Em publicação no X, em julho de 2020, o bilionário confessou que ajudou a derrubar um governo eleito, de Evo Morales, na Bolívia, para colocar no poder Jeanine Añez.  Disse que fez isso para garantir o suprimento de lítio, material usado na bateria dos carros elétricos da Tesla, sua fábrica de automóveis.

“Vamos dar um golpe em quem quisermos! Lide com isso”, escreveu Musk em resposta a um seguidor, que havia feito um post dizendo que o governo norte-americano havia organizado um golpe para depor Evo Morales, para que a Tesla pudesse obter lítio do país sul-americano. Jeanine está presa e foi condenada a 10 anos de cadeia pelo golpe. Musk está cada vez mais rico.

O lítio é um metal encontrado em abundância em Uyuni, um deserto no sul da Bolívia. É a maior jazida do mundo desse material de alta eficiência energética. Juntos, Chile, Bolívia e Argentina concentram cerca de 75% das reservas mundiais de lítio. O Chile é o principal produtor mundial, mas é a Bolívia quem tem o potencial de se tornar o maior fornecedor global desse metal precioso – o deserto de Uyuni abriga 50% de todo o lítio existente no planeta.