Maurício Werkema é advogado e mestre em direito

Millôr Fernandes, aludindo à tributação, disparou: “me arrancam tudo à força e depois me chamam de contribuinte”. De fato, ninguém contribui voluntariamente para o fisco. Um conjunto de regras prescritivas inseridas no ordenamento jurídico obriga o pagamento de tributos para financiar o Estado.

Mas as regras do tipo que prescrevem o pagamento não são o único tipo de regra tributária. Como vimos, diversas foram as revoltas contra arbitrariedades e abusos tributários que levaram à criação de limites ao poder de tributar.

A pressão tributária da Inglaterra sobre as colônias levou à independência dos Estados Unidos, com a criação da primeira Constituição moderna que, mesmo com apenas sete artigos, trouxe regras que estabeleciam limites. Ainda em 1819, o lendário juiz John Marshall da Suprema Corte daquele país alertou que “o poder de tributar envolve o poder de destruir” sendo necessário moderar a sanha arrecadatória.

Desde então, as constituições, os principais diplomas dos ordenamentos jurídicos dos países, têm sido o locus adequado para criar os limites tributários.

A nossa primeira constituição de 1824 previa que a criação de impostos era de competência da Câmara dos Deputados (e não do Monarca). As Constituições republicanas avançaram na proteção dos contribuintes com criação de limites mais claros ao poder de tributar. Nossa Constituição de 1988 traz, dentro do Capítulo do Sistema Tributário Nacional, uma seção específica para as limitações ao poder de tributar. Qualquer cobrança que não observe o regramento constitucional será considerada ilegítima. Um tributo exigido sem previsão em lei, por exemplo, ofende a regra contida no artigo 150, I, da Constituição.

Mas, além de traçar limites, a Constituição cumpre um outro importante papel no regramento tributário: a definição de competências. Sendo o Brasil um Estado federal formado pela União, os Estados e Municípios, cabe à Constituição definir as competências, isto é, as atribuições administrativas e legislativas de cada um dos entes federativos. E um tipo de competência é a tributária.

Ao longo do texto constitucional o poder de tributar é cuidadosamente divido entra União, os Estados e os Municípios. Cada ente recebe a competência de tributar uma determinada realidade econômica dentro das bases de incidência tributária.

À União foi reservada a competência de tributar a renda. Mas a tributação do consumo é compartilhada entre os entes federados de acordo com realidades

específicas. Portanto, um mesmo fato praticado por um contribuinte pode ser objeto de múltiplas cobranças ou de conflitos de competência entre os entes tributantes.

Assim, é na tributação do consumo de competência compartilhada que a complexidade (ou disfuncionalidade) do sistema tributário brasileiro atinge seu ápice. Veremos no próximo artigo.