Bernardo Ribeiro é diplomata de cidades e mestre em relações internacionais
Todo país tem o direito e a autonomia para decidir como quiser e de forma privativa sobre a forma de lidar com a entrada, temporária ou permanente, de estrangeiros em seus territórios. Dito isto, em qualquer discussão sobre imigração, é preciso tirar o elefante da sala: quando o imigrante acessa o território estrangeiro desobedecendo as condições obrigatórias de entrada, a imigração é ilegal e, portanto, na maioria das legislações, crime.
O que isso nunca irá significar é que toda imigração é ruim. Quando um país determina um conjunto de condições que devem ser respeitadas e garantidas para que um cidadão estrangeiro possa acessar e estar em seu território, este país desenha este regramento para garantir que esta permanência traga benefícios à sua sociedade. Isso fica muito claro em sistemas de entrada permanente que, em sua vasta maioria, qualificam o acesso a pessoas com potencial real e comprovado de contribuir com o avanço social e econômico do país.
Cidadania é direito
Advém dessa lógica a importância que pessoas interessadas em mudar de país devem dar ao cumprimento destas metas e requisitos. Vem daí também a visão de que imigrantes ilegais não apenas foram incapazes de demonstrar sua capacidade em contribuir, mas também evidenciaram sua indiferença e desrespeito àquela sociedade.
Portanto, vale o destaque: toda imigração – temporária ou permanente – deve vir acompanhada pelo atendimento aos requisitos legais de entrada no país e pelo respeito à sociedade, cultura, política e território de destino. Afinal de contas, enquanto a cidadania é um direito, a imigração é somente um privilégio.
Xenofobia
Isso também revela uma dimensão de xenofobia que ocorre em crises migratórias. Além das desigualdades globais, um contexto bastante idiossincrático orienta as pessoas nessa decisão. Na imensa maioria dos casos, o imigrante está em busca de melhores oportunidades para sua própria vida. É legítimo, porém muitas vezes se contrapondo às condições de acesso, considerando-as dificultadores ilegítimos frente à necessidade privada.
Há também aqueles que se justificam dizendo ter ciência dos riscos, racional e também ilegítima. Mais grave fica quando isso é somado à mentalidade clientelista de países em desenvolvimento, acreditando que somente o Estado é responsável pelo bem-estar social.
Queda de confiança
Além de conflitos, desastres e afins, crises migratórias são também produto da queda de confiança no cidadão de origem estrangeira. Mesmo se a sociedade global ocidental do século XXI tenha se tornado cada vez mais homogênea e não sejam mais tão flagrantes as imensas assimetrias culturais que haviam a 50 ou 100 anos atrás. Assim, a xenofobia toma novos contornos, como as preocupações com os potenciais de criminalidade, empobrecimento, precarização da vida urbana e desvalorização das nações.
Os processos imigratórios estão cada vez mais complexos e restritivos, como um produto dessa crise de confiança e das convulsões socioeconômicas da atualidade. Porém, são a garantia de que aquele governo entende que a pessoa será um ativo para o país. Mais ainda, de que aquele país tem capacidade de receber a imigrante em condições de oferecer oportunidades para que sua estada seja a melhor possível para todos os envolvidos.
O mundo sem fronteiras é real onde a relação de confiança é alta. Afinal, todos os dias, milhares de pessoas vivem a tranquilidade de circular de forma segura por todo o mundo ao cumprirem as regras, procedimentos e requisitos de cada país com respeito e contribuindo com a sociedade de destino.
(*) Especialista em cooperação internacional de governos locais com foco em desenvolvimento e ESG.