Ou se salva a operação Lava Jato, levando-a até o fim, ou se voltará ao deplorável sistema cleptocrático anterior.
Quem duvida, se prepare.
Nas últimas três décadas, o Brasil lutou para se livrar da praga da corrupção, um vírus que se espalha numa velocidade incrível, especialmente nos setores públicos, quando parte da cabeça do sistema. E a cada operação, afinal, permitiu que os esquemas se fortalecessem e voltassem com maior virulência e prejuízo para a nação.
O mau exemplo destrói a autoridade moral do líder, e sem esta ninguém segura os andares de baixo.
A primeira tentativa de interromper a rotina da corrupção pública se deu com o impeachment de Fernando Collor, em 1992. Um cheque como pagamento da compra de um Fiat Elba correspondente ao valor de RS 40 mil serviu para tirá-lo de cena.
A segunda tentativa ocorreu um ano depois, com a CPMI dos Anões, que se alongou até 1994. Nessa comissão mista de inquérito, apareceu um esquema de venda de favores para empreiteiras de obras públicas e de benesses indevidas para parlamentares. O núcleo do esquema criminoso se abrigava na Comissão de Orçamento do Congresso Nacional. Figuras como o então jovem Geddel Viera Lima, ainda de fama restrita, estavam entre os que responderam a processo, uma vez flagrados em operações indecentes. Acabou se salvando, e de lá até 2017 seu patrimônio se expandiu a ponto de, num apartamento em Salvador, na Bahia, serem encontradas malas com R$ 51 milhões sem procedência legal.
Dos 37 parlamentares indiciados, seis foram cassados e oito renunciaram. A operação encontrou o fantástico valor de R$ 100 milhões de propinas em prejuízo do erário.
Chegou-se, depois de 11 anos, à CPI do Correios, mais conhecida como a do mensalão. Na rede lançada, ficaram 18 parlamentares, como Roberto Jefferson, José Janene, Severino Cavalcanti, Pedro Corrêa e a cúpula do PT, liderada por José Dirceu, Delúbio Soares, José Genoino, Silvio Pereira e outros. O episódio não impediu, entretanto, ao presidente Lula se reeleger no mesmo ano em que o mensalão fervia na mídia. As investigações realizadas pelo Congresso foram interrompidas, e os valores do valerioduto ficaram sem uma totalização oficial, estimada em mais de R$ 500 milhões.
Em 2014 iniciava-se a operação Lava Jato para investigar aquilo que nunca se ousou no Congresso: a Petrobras e dela as ramificações que levaram ao BNDES, à Caixa, ao BB, mostrando um mecanismo estruturado para espoliar o Estado em favor de quadrilhas e de uma dúzia de grandes empreiteiras lideradas pelo binômio Odebrecht/Andrade Gutierrez. O rombo apenas na Petrobras pode passar de R$ 60 bilhões, e as perdas do BNDES, Caixa e BB, levar a mais de R$ 300 bilhões.
A sequência dos eventos, desde a CPMI do Anões até a Lava Jato, atesta uma relação – entre governos, Legislativo e empreiteiras – que sempre se regenerou e voou mais alto, como a mitológica fênix, aquela ave de rapina gigantesca que conseguia levar até elefantes, mas tinha a capacidade de entrar em autocombustão e virar cinzas, para em seguida se regenerar e sair de debaixo das cinzas.
Não há quem em sã consciência possa concordar com o encerramento de uma operação que veio para salvar a pátria de um fenômeno que aniquila a possibilidade de crescer estruturadamente e levar o país a um patamar de desenvolvimento social e econômico que se encontra refém da corrupção que bateu todos os recordes mundiais.
A Lava Jato há de continuar pelo bem e salvação da pátria. E mais além dever-se-ia proibir acordos de leniência com quem se apossou de centenas de bilhões em prejuízo das carências gritantes deste país. O esquema e os atores são os mesmos, contumazes, desde 1993 até agora, lutando para ressurgir após serem incinerados.
Essa fórmula de leniência por equiparação se estenderia a qualquer crime de assalto e desvio de recursos públicos.
E quem tratou desses acordos até 2018? A Advocacia Geral da União (AGU) dos mesmos governos ocupados por quem arrombou o erário da União. As empresas deveriam ir a leilão, e os responsáveis, impedidos até a morte de exercer qualquer cargo em empresas fornecedoras de bens ou serviços ao setor público.
É preciso encontrar um antídoto para a fênix não se regenerar tão cedo.