Iniciado nesta segunda-feira (21 de outubro), o julgamento em Londres, na Inglaterra, da eventual responsabilização cível da BHP Billiton pelo rompimento da barragem do Fundão, em Mariana, região Central de Minas Gerais, é independente das negociações por uma reparação sócio-econômica em andamento no Brasil. Embora as tratativas possam influenciar a decisão da Justiça britânica, prevista para maio de 2025, ambas são paralelas.
Repactuação no Brasil
As discussões pela reparação envolvem não apenas a BHP Billiton, mas, também, a Vale S.A., a outra acionária da Samarco. Após a Fundação Renova fracassar em conduzir as ações indenizatórias para as quais foi criada ainda em 2016 por meio de um termo de transação e ajustamento de conduta (TTAC), a União e os Estados de Minas Gerais e do Espírito Santo voltaram à mesa com as mineradoras para repactuar o acordo, que se arrasta desde 2021.
Entre idas e vindas, desde o insucesso do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em mediar a repactuação até a entrada do Tribunal Regional Federal da 6ª Região (TRF-6), o acordo está em vias de ser assinado. A expectativa é que as negociações, que atravessaram os governos Jair Bolsonaro (PL) e Luiz Inácio Lula da Silva (PT), sejam concluídas na próxima sexta-feira (25 de outubro), em Brasília, de acordo com o procurador geral de Justiça de Minas Gerais, Jarbas Soares Júnior.
Conforme um comunicado divulgado ao mercado pela Vale S.A. na última sexta (18 de outubro), a repactuação chegará a R$ 170 bilhões, um dos maiores valores da história. Deste total, R$ 100 bilhões serão distribuídos entre a União, os Estados de Minas Gerais e do Espírito Santo e 49 municípios da Bacia do Rio Doce. Os valores por ente, que serão pagos ao longo de 20 anos, ainda estão sendo discutidos internamente pelas partes.
Dos R$ 70 bilhões restantes, R$ 38 bilhões dizem respeito a valores já investidos nos últimos oito anos pela Renova, administrada pela Samarco, em medidas de remediação e compensação. Os outros R$ 32 bilhões serão de novas obrigações de execução da mineradora controlada pela BHP Billiton e pela Vale, como, por exemplo, indenizações individuais, reassentamentos e recuperação ambiental - os valores consideram uma taxa de câmbio média de 5,5415.
Julgamento na Inglaterra
O julgamento na Inglaterra, por sua vez, é uma ação cível movida por cerca de 600 mil vítimas do rompimento da barragem, sendo 23 mil quilombolas e indígenas Krenak, Tupiniquim, Pataxó e Guarani, 46 municípios e, aproximadamente, 1.500 empresas, autarquias e instituições religiosas apenas contra a BHP Billiton. O escritório pede uma indenização de R$ 230 bilhões à Justiça inglesa, onde a mineradora anglo-australiana era listada quando a tragédia ocorreu.
Em tentativa de buscar uma reparação considerada mais justa, a ação foi apresentada à Justiça britânica ainda em novembro de 2018, quando tinha aproximadamente 200 mil requerimentos. Dois anos depois, a BHP Billiton chegou a afastar a jurisdição inglesa do caso, o que foi revertido em julho de 2022. Durante o processo, a BHP chegou a pedir à Justiça que a Vale S.A. também se tornasse ré, o que, após um acordo entre ambas, deixou de acontecer, restando apenas a anglo-australiana como parte.
A ação cível tenta provar à Justiça britânica que a BHP Billiton teria ingerência nas decisões tomadas pela Samarco ao gerir a barragem do Fundão. Para a acusação, representada pelo escritório de advocacia Pogust Goodhead, a BHP se enquadra como poluidora nos termos da Política Nacional do Meio Ambiente, é responsável pelo colapso objetiva e subjetivamente segundo o Código Civil e responde pelos danos na qualidade de acionista da Samarco conforme a Lei das S.A.
O ponto de intersecção entre o julgamento na Inglaterra, que vai se arrastar até março de 2025, e o acordo de repactuação é o cálculo político. Como já mostrou O TEMPO, a expectativa tanto da União e dos Estados quanto da BHP Billiton e da Vale é concluir o novo acordo antes do fim da sessão em Londres. Enquanto o Poder Público teme que a responsabilização da mineradora tire o ímpeto por uma repactuação, a anglo-australiana espera que a reparação amenize uma eventual condenação.