Em 2 de novembro de 2024, na última entrevista concedida a O TEMPO, o então prefeito reeleito de Belo Horizonte, Fuad Noman (PSD), ressaltou vários pontos que considerou como positivos de sua gestão à frente do Executivo. Ele ainda ponderou quais seriam suas marcas na nova administração, que começaria a partir de 2025. Fuad morreu nesta quarta-feira (26 de março), após mais de 80 dias internado.
“Minha marca vai ser daquele prefeito progressista que vai construir, que vai resolver problemas históricos da cidade”, afirmou Fuad à época. Ele também destacou o apoio que teve durante a campanha eleitoral, quando tratava um câncer do tipo linfoma não-Hodgkin: “A população de Belo Horizonte me abraçou e esse abraço eu não vou esquecer nunca”.
Ainda na entrevista, o prefeito mencionou o tratamento do câncer que o acometeu pouco antes da campanha eleitoral, e como administrou as sessões de quimioterapia com o “corpo a corpo” no período eleitoral. “Quando você está em uma encruzilhada, você tem dois caminhos. Primeiro você se recolhe e fica se preparando. E nesse caso, Deus te dá conforto. A outra alternativa é você enfrentar, você lutar, e Deus te dá a força”, avaliou.
Fuad também comentou sobre os ataques que sofreu durante a campanha, especialmente devido ao livro “Cobiça”, publicado em 2020 e duramente criticado no segundo turno das eleições do ano passado. As críticas partiram principalmente da campanha de Bruno Engler (PL) e seus aliados. “Em primeiro lugar, fizeram uma tentativa de criar um escândalo na minha vida. Vasculharam a minha vida inteira, não acharam nada. Acabaram me dando um certificado de bons antecedentes”, afirmou.
Confira os principais pontos da entrevista concedida por Fuad a O TEMPO:
Qual seria a marca deixada por Fuad na Prefeitura de Belo Horizonte?
Minha marca vai ser daquele prefeito progressista que vai construir, que vai resolver problemas históricos da cidade, por exemplo, Anel Rodoviário, por exemplo, o aeroporto, por exemplo, o corredor da Amazonas, a urbanização de vilas e favelas, do Dandara, do Izidora, do Getsêmani. O prefeito que vai cuidar das pessoas. Um programa de proteção dos idosos, das mulheres em situação de risco, da comunidade LGBT que está na rua, das crianças que possuem algum tipo de deficiência, ou seja, um prefeito que vai trabalhar para o povo de Belo Horizonte. Esta é a marca que eu quero deixar. Se eu sair daqui da prefeitura daqui a quatro anos, e eu espero que isso aconteça, vou sair com uma cidade muito melhor do que vai estar hoje.
Com as pessoas protegidas, com a cidade protegida, e com aquilo que for possível preparar para o próximo governo. Eu quero entregar uma cidade melhor e mais inclusiva. Vou trabalhar muito nessa preocupação, trazer à prefeitura para junto das pessoas. É o governo das vilas e favelas, porque as vilas e favelas ficaram muito abandonadas e são áreas importantes que precisam do apoio da prefeitura. Se eu for fazer tudo isso, eu até desanimo de tanto serviço que tem pela frente.
Relação com prefeitos da região metropolitana
Tivemos uma reunião durante a campanha com 18 prefeitos da região metropolitana. A região metropolitana é muito importante para Belo Horizonte, e BH é muito importante para essas regiões metropolitanas exatamente por ser uma cidade polo. Na questão da saúde (por exemplo). A pessoa está em uma UPA em Ribeirão das Neves e precisa de um hospital e lá não tem, onde ela tem que arremeter? Em Belo Horizonte. Então, nós temos que ter um trabalho junto com todas as cidades no sentido de harmonizar e simplificar as relações. A prefeita Marília, além de ser uma grande liderança, já tivemos boas conversas, falamos muito e a gente sabe o que temos que fazer juntos.
Estamos conversando com todos os prefeitos. BH é muito importante para Minas Gerais, então os prefeitos precisam de BH e BH precisa apoiar (os prefeitos). Para se ter uma ideia, se pegar o hospital Risoleta Neves, 60% dos partos que acontecem lá são de pessoas de fora de BH. 30% a 35% do atendimento médico de BH são de pessoas de fora de BH. Essas pessoas precisam de ter um canal mais simples, um processo mais rápido de atendimento. Quando se fala de transporte coletivo, a mesma coisa.
Ataques na campanha
Em primeiro lugar, fizeram uma tentativa de criar um escândalo na minha vida. Vasculharam a minha vida inteira, não acharam nada. Acabaram me dando um certificado de bons antecedentes. E aí resolveram pegar meu livro, ou não leram, ou leram e resolveram fazer uma interpretação que não existe no livro. Não tem nada do que eles falaram, mas rede social e fake news, você sabe como é, um rastilho que cresce. Cresceu muito. Logicamente que me incomodou, logicamente que as pessoas não sabem separar um livro, uma ficção, um romance de uma vida real. O livro não quer dizer que é uma realidade, é uma história, é até uma denuncia que um risco que uma criança de 12 anos sofre por vingança, às vezes por maltrato de padrasto, por pessoas que cuidam dela. Eu diria para você o seguinte: acabou vendendo mais livro, está esgotado.
Relação com Alexandre Kalil
De jeito nenhum (tenho mágoa de Alexandre Kalil). Pelo que ele fez na campanha do Tramonte, mostrou que eu estava certo em não tê-lo na campanha. Prefiro não falar nele, acho que ele teve um comportamento diferente do que ele sempre foi, então não quero falar de Kalil.
Desafios na campanha
A campanha foi muito difícil, muito trabalho, muito esforço, muita dedicação, muito empenho, uma campanha em que eu tive uma equipe de marketing brilhante, uma equipe na prefeitura que sustentou a prefeitura nesse período para que eu pudesse cuidar das duas coisas e uma equipe médica fantástica que me deu sustentação médica para fazer isso. Foi muito desgastante, estou muito cansado, mas, por outro lado, foi muito importante para mim. Eu nunca tinha feito uma campanha. Ser abraçado na rua como eu fui, tantos apertos de mão, tanto carinho, tantas pessoas gritando seu nome, transmitindo para você emoção, confiança, pedindo incessantemente para que lutasse, isso me deixou extremamente feliz, muito emocionado. A população de Belo Horizonte me abraçou e, esse abraço, eu não vou esquecer nunca.
Tratamento de câncer
No final de junho, eu estava com umas dores incomodando e fui ao médico e ele pediu uns exames. Fui para o hospital e descobriram o câncer. Gera a seguinte pergunta: eu vou conseguir fazer a campanha? Vou ficar quieto em casa? Vou curtir a doença? Conversei com a minha família, com amigos, com o meu partido, fiz muita reflexão, rezei, pedi apoio de Deus e cheguei à conclusão de uma coisa: quando você está em uma encruzilhada, você tem dois caminhos. Primeiro, você se recolher e ficar se preparando. E, nesse caso, Deus te dá o conforto.
A outra alternativa é você enfrentar, você lutar, e Deus te dá a força. A força divina, minha fé, neste ponto, é verdadeira. Foi a família, foram os amigos, mas foi a confiança… eu sou devoto do Padre Eustáquio. Fui lá, conversei com ele e saí de lá convicto de que eu era capaz de vencer se eu enfrentasse, se eu lutasse de frente, se eu fosse corajoso, e foi o que eu fiz. E, graças a Deus, consegui sem problema. A doença foi tratando, tirava um dia para fazer a quimioterapia, e me curei em quatro meses, não me atrapalhou na campanha e acho que teve a bênção do Padre Eustáquio, que é o beato da saúde e da paz. Ele me deu a saúde e me deu a paz.
Governo de produtividade
Estou me preparando para ter um governo de produtividade. Um governo que vai melhorar a vida das pessoas. Eu não entrei nessa briga para perder, entrei para ganhar, mas para ganhar não para mim, mas para ganhar para a cidade de Belo Horizonte. Eu sou um prefeito que quer trabalhar para as pessoas. Estou preparado para melhorar a vida da cidade, melhorar o trânsito, melhorar tudo o que precisar, porque Belo Horizonte é uma cidade que nós gostamos e, com amor, é muito mais fácil, e eu só sei dirigir com o coração com muito amor a essa cidade.
Resolução de enchentes em BH
Estamos fazendo grandes obras, obras, talvez, de maior tecnologia do Brasil. Por exemplo, na Vilarinho, estamos fazendo um reservatório lá com 140 metros de comprimento, 40 de largura e 33 metros de profundidade. É um prédio de 12 andares de cabeça para baixo. É de uma tecnologia importante, está bem avançado, tem que ficar pronto ano que vem, é uma obra que me preocupa muito porque ela vai acabar com a enchente na Vilarinho. A Praça das Águas na Estação São Gabriel é outra obra importante porque ela tira a água da Cristiano Machado, deixa de inundar o Primeiro de Maio. As obras estão bem avançadas e precisamos concluir.
O que eu tenho dito é que nós temos hoje, e estamos nos preparando, está bem avançado, para tudo que nós conhecemos de chuva. Minha preocupação é o que ainda a gente não conhece. Para isso, estou criando uma coordenadoria de estudos das mudanças climáticas. Vou trazer especialistas, professores, cientistas, para a gente discutir o que vai acontecer ou pelo menos uma previsão do que pode acontecer, e nos preparar para isso, para não sermos surpreendidos com essa questão. Já avançamos muito, não tem ninguém morrendo ultimamente, protegemos muito as encostas para evitar morte também.
Solução para o novo contrato de ônibus de BH
Fui o primeiro prefeito a enfrentar os ônibus. Criei (o programa) Tolerância Zero exatamente para que a gente pudesse cobrar, das empresas, qualidade. Os ônibus estavam ruins, estavam estragados, as pessoas estavam reclamando muito, estava demorando para chegar, e hoje temos 800 ônibus novos. Belo Horizonte, hoje, tem a frota de idade média mais moderna do Brasil. Estamos aumentando o número de viagens no intervalo, estamos tentando reduzir o número de passageiros. Logicamente que, no horário de pico, a gente acaba tendo um problema maior, mas estamos trabalhando para isso. A pergunta que fica é: está pronto? Claro que não. Primeiro, não está pronto porque ainda tem muita coisa para melhorar.
Vamos começar com alguns trabalhos para modernizar o sistema, e sabemos que o contrato vence agora em 2028. Esse contrato foi feito em 2008 com uma tecnologia completamente diferente, um mundo completamente diferente. Hoje, nessa área, nós sabemos o que é quinze anos de diferença. Vamos nos preparar para esse novo contrato. O que quero fazer é contratar uma consultoria internacional, pode ser nacional, mas que tenha conhecimento internacional, para ver quais são as melhores experiências de concessão de ônibus do mundo. Essa consultoria fará esse estudo para preparar para nós o termo de referência, que é o documento que faz parte da licitação e que descreve tudo que precisa ser feito. Vão dizer: a melhor experiência do mundo é essa. Vamos pegar aquilo, colocar em audiência pública, vamos pedir a sociedade para ver, a imprensa para avaliar, os usuários para avaliar, os especialistas para avaliar e vamos colher as sugestões. Como nós vamos ter tempo, essas sugestões vão ser recolhidas e encaminhadas para a consultoria.
Ela vai avaliar essas sugestões. Feito isso, teremos um termo de referência moderno, atualizado, que espero que sirva até de padrão para outros Estados. Uma licitação nacional, aberta, para quem quiser concorrer, e espero que tenha uma concorrência nacional, porque estamos falando de um contrato de 20 anos, que usa hoje mais de 1 milhão de passageiros/dia. Se considerarmos de janeiro a julho deste ano, tivemos 134 milhões de passageiros. É um contrato muito importante, espero que tenha muita concorrência, vamos ser muito exigentes nesse novo contrato. O novo prefeito que assumir a partir de 2028 com um modelo de contrato muito mais moderno, mais eficiente e, espero, muito mais barato.