Os gastos de Minas Gerais com instituições de Justiça cresceram 10 vezes mais do que as verbas destinadas para todo o Estado em 2023, de acordo com levantamento feito pela organização Justa. Naquele ano, enquanto o orçamento de Minas cresceu 3%, os recursos voltados ao Tribunal de Justiça, ao Ministério Público e à Defensoria Pública cresceram 30%, com R$ 11,4 bilhões desembolsados.
O estudo “Justiça e Orçamento nos Estados: Pesquisa Nacional” monitorou os gastos com essas instituições em todo o país. Conforme o levantamento, Minas Gerais é o segundo Estado que mais destinou recursos do orçamento estadual para as instituições de Justiça, ficando atrás apenas de São Paulo, que gastou R$ 16 bilhões.
Ainda segundo a pesquisa, do total gasto em Minas Gerais, 71% foram destinados para folha de pagamento. O restante foi destinado a outras despesas correntes (custeio) e investimentos, como manutenção de serviços, aquisição de materiais, serviços de terceiros, aquisição de bens de capitais, entre outros. Conforme informações da Justa, o levantamento considerou todas as despesas empenhadas pelos órgãos do sistema de Justiça no ano de referência.
Em 2023, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) recebeu a maior parte do valor em Minas, com R$ 7,9 bilhões. Em seguida, está o Ministério Público (MPMG), que obteve R$ 2,9 bilhões. Segundo a Justa, Minas é o Estado que mais gasta com essa instituição. Já a Defensoria Pública (DPMG) recebeu R$ 600 milhões.
Ainda conforme a pesquisa, as instituições de Justiça em Minas receberam, ainda, R$ 36 milhões em créditos adicionais em 2023. O estudo aponta que essas verbas extras teriam ultrapassado o previsto inicialmente na Lei Orçamentária Anual.
De acordo com a diretora-executiva do Justa, Luciana Zaffalon, no levantamento, os dados de Minas Gerais chamam a atenção por conta da “desproporção” entre o crescimento do orçamento do Estado e o aumento do valor destinado às instituições de Justiça. Ela avalia que a distribuição orçamentária passa por uma “disputa” e, no caso de Minas, a força do Judiciário estaria “se sobressaindo”.
No caso dos créditos adicionais, de R$ 36 milhões, Luciana ressalta a necessidade de que tais aberturas tenham mais transparência. A diretora-executiva do Justa lembra que os orçamentos estaduais são apresentados pelos respectivos governos e debatidos nas Assembleias Legislativas. Desta forma, a abertura de créditos também deveria seguir o mesmo processo, entretanto, na prática, a legislação dá “brechas” para que ocorra o remanejamento dos recursos públicos. Isto ocorre a nível nacional.
“Acho que temos que ter um olhar de racionalização de investimento como prioridade do debate público e precisamos ter mecanismos de rigorosa transparência. Não é razoável que vejamos um orçamento que não é, de fato, debatido com as balizas adequadas que permitem enxergar o que está sendo priorizado ou o que está sendo sucateado. Isso deveria valer para toda a administração pública.”
O TJMG, o MPMG e a DPMG foram procurados para comentar o resultado da pesquisa. Tão logo haja um retorno, esta publicação será atualizada. O espaço segue aberto.
‘É preciso pensar em mecanismos de eficiência para administração dos gastos’, diz especialista
Na avaliação de Murilo Melo Vale, advogado especialista em Direito Público e professor de direito administrativo, a diferença entre o crescimento do que foi destinado ao sistema Judiciário e o orçamento do Estado pode revelar um “desequilíbrio” e ter reflexos na alocação “eficiente” dos recursos públicos.
“Ainda que essas instituições cumpram um papel essencial para o funcionamento do Estado Democrático de Direito, é necessário que o crescimento de seus orçamentos acompanhe de forma razoável a capacidade fiscal do ente federativo.”
Conforme o especialista, a preocupação com a elevação desses gastos é geral, considerando dados da Secretaria do Tesouro Nacional, que indicaram, em 2024, que o Poder Judiciário brasileiro consome o equivalente a 1,6% do PIB do país. Por outro lado, ao mesmo tempo em que os gastos se ampliam, o país ainda carece de um aumento da quantidade de juízes, por exemplo, por conta das demandas judiciais existentes.
“Tem um paradoxo: estamos gastando uma proporção grande do PIB com Poder Judiciário, todavia precisamos de mais juízes, e isso fica mais preocupante na medida em que há um aumento ainda muito maior comparado com o próprio orçamento. Então, acredito que é necessário, sim, revisitar todos esses pontos, pensar em mecanismos de eficiência para essa administração dos gastos”, afirma Vale.
Pesquisa anterior
Em 2022, a mesma pesquisa indicou que os mineiros gastaram quase R$ 8,7 bilhões para manter as instituições vinculadas à Justiça. No caso específico do TJMG, os recursos recebidos alcançaram a marca de R$ 6,1 bilhões. O MPMG recebeu um aporte de R$ 2,1 bilhões e a DPMG, R$ 528 milhões.
A organização Justa monitorou os gastos com Tribunais de Justiça, Ministérios Públicos e Defensorias Públicas de todo o território nacional. Para o levantamento de 2023, foram levantados dados do Acre, Amapá, Amazonas, Bahia, Ceará, Espírito Santo, Mato Grosso, Minas Gerais, Pará, Paraná, Pernambuco, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Rondônia, Santa Catarina, São Paulo, Sergipe e Tocantins.
Os demais Estados (Alagoas, Distrito Federal, Goiás, Maranhão, Mato Grosso, Piauí, Rio Grande do Norte e Roraima) não disponibilizaram as informações para a análise.