Os sindicatos que representam categorias afetadas por uma possível privatização da Cemig e Copasa realizaram, nesta quarta-feira (6/8), um seminário em Belo Horizonte para debater os impactos da proposta do governo Romeu Zema (Novo), que pretende acabar com a exigência de referendo popular para permitir a venda da Cemig e Copasa. Segundo eles, além da queda na qualidade do serviço, existe ainda um risco pouco avaliado da perda de postos de trabalho qualificado em Minas Gerais.
“No caso da Cemig, por exemplo, um eletricitário demora cerca de quatro anos para ser formado e ter excelência técnica. Com a privatização e terceirização do setor, a rotatividade fica, na média, em dois anos. Nós perdemos a capacidade técnica de atender toda a população com a qualidade necessária. Uma quantidade grande de trabalhadores pode perder o emprego; profissionais com um nível de formação técnica para o qual não existem outras empresas em Minas Gerais, pois não existem outras empresas que prestam esse tipo de serviço no estado”, destaca Emerson Andrada, coordenador geral do Sindicato Intermunicipal dos Trabalhadores na Indústria Energética de Minas Gerais (Sindieletro), um dos organizadores do evento.
O seminário, realizado no auditório da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), teve a participação de especialistas nacionais que avaliam e acompanham a privatização de empresas estratégicas do setor de infraestrutura em todo o país. Amauri Pollachi, do Observatório Nacional dos Direitos da Água e Saneamento (Ondas) avaliou, por exemplo, a situação enfrentada em São Paulo após a privatização da Sabesp.
“É preciso desfazer o mito da regulação perfeita no saneamento. Um ano depois da privatização da Sabesp, em São Paulo, a situação é precária e leva muito temor aos paulistas. Defendemos que ‘água’ não deve ser tratada como mercadoria”, disse Pollachi.
Mesmo tom utilizado pelo ex-deputado Aloísio Vasconcelos, que foi diretor da Cemig e ex-presidente da Eletrobrás. Ele defendeu que a população cobre responsabilidade dos políticos ao avaliar o assunto. “Aqui tem muita gente do interior. Dê um toque no deputado estadual da sua cidade”, destacou.
O alvo principal dos sindicatos é mobilizar a opinião pública para criar resistência na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), onde tramita a Proposta de Emenda Constitucional 24/2023. O texto é uma prioridade do governo Romeu Zema (Novo), sob o argumento de que a aprovação é fundamental para permitir a transferência das empresas para o governo federal em troca do abatimento da dívida do Estado com a União. O projeto integra o pacote de projetos para adesão ao Programa de Pleno Pagamento de Dívidas dos Estados (Propag) e revoga a obrigatoriedade de consulta popular para colocar à venda as estatais mineiras.
“Nós consideramos extremamente antidemocrático suprimir a consulta à população. Esse é um instrumento bastante avançado, previsto na Constituição do estado. Mas, de repente, aparece alguém que, numa proposta de privatização, ao invés de consultar se o legítimo dono tem interesse na venda, quer mudar a constituição para proibir o dono de opinar”, disse Emerson Andrada, do Sindieletro.
Os participantes do seminário disseram que não haverá um “documento” ou proposta criada a partir do evento, mas que pretendem mostrar com a experiência de outros estados, que não há evidências de melhoria da qualidade ou universalização dos serviços após a privatização de empresas estatais.
Além do Sindieletro, o Sindicato dos Engenheiros (Senge) e o Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias de Purificação e Distribuição de Água e em Serviços de Esgotos (Sindagua) também encabeçaram a realização do seminário.
Fim do plebiscito
A Proposta de Emenda Constitucional 24/2023 - PEC do referendo - foi enviada à ALMG pelo governo em outubro de 2023 e motivou várias audiências públicas até fevereiro de 2024, quando acabou retirada da pauta pelo relator. A proposta ficou em banho-maria na Casa por um ano e quatro meses.
Em junho, porém, o presidente da Assembleia, Tadeu Leite (MDB), anunciou a retomada da tramitação do projeto, em recado ao vice-governador Mateus Simões (Novo), que vinha cobrando a análise de dois projetos de lei que autorizam a privatização da Cemig e da Copasa.
O governo do estado defende que é necessário transformar as empresas, em especial a Cemig, em “Corporation”, nome dado à uma companhia que possui vários sócios, mas nenhum deles possui o controle da empresa.
Atualmente, o Estado possui maioria das ações ordinárias da Cemig. As ações ordinárias dão direito a voto em decisões estratégicas da companhia, como a compra e venda de ativos ou investimentos. Já as ações preferenciais, não dão direito a voto, mas são às que dão preferência de receber os lucros. Caso vire uma “corporation”, todos os sócios teriam ações preferenciais o quê, de acordo com argumento do governo estadual, viabilizaria a transferência de ações ao governo federal em troca de abatimento da dívida do estado.