A eventual contribuição mensal de empresas para custear a tarifa zero no transporte coletivo de Belo Horizonte representaria, em média, menos de 1% da folha salarial dos empreendimentos, aponta um estudo divulgado nesta quarta-feira (23) por pesquisadores da Faculdade de Economia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Uma proposta para isentar o pagamento de passagem nos ônibus da cidade para toda a população tramita na Câmara Municipal

A análise, que embasa o debate sobre o Projeto de Lei 60/2025, revela também que o risco de evasão de empresas da capital é considerado insignificante. A pesquisa indica ainda que, em cidades brasileiras onde a Tarifa Zero já foi implementada, houve aumento de até 7,5% no número de empresas e crescimento de 3,2% no nível de emprego formal, além de redução nas emissões de gases de efeito estufa. 

“Há baixa possibilidades de impactos setoriais negativos, enquanto o potencial de ganhos sociais desta política pública proposta é grande”, afirma a economista Ana Maria Hermeto, professora da UFMG e uma das autoras da nota técnica. O economista André Veloso, doutor pela mesma instituição, reforça: “uma pesquisa muito consistente identificou crescimento significativo de empresas e empregos em cidades com Tarifa Zero, de modo que pode haver atração de CNPJs para o município.” 

O modelo proposto prevê a substituição do vale-transporte - que é descontado da folha salarial do funcionário e paga parcialmente pelo empregador - por uma taxa mensal de aproximadamente R$185 por trabalhador. O impacto líquido no custo do trabalho, considerando os valores já pagos com o benefício atual, seria de apenas 0,91% da folha salarial agregada das empresas em Belo Horizonte. 

 Empresas com até nove funcionários ficariam isentas. Segundo o levantamento, mais de 80% das empresas da cidade seriam beneficiadas com redução de custos, por se tratar de microempresas isentas da nova cobrança. 

Outro ponto destacado é que a cidade apresenta alta rigidez locacional - ou seja, características urbanas e institucionais que dificultam a mudança de sede das empresas. Mais de 85% dos vínculos formais estão em setores com baixa propensão à realocação, como comércio, serviços e administração pública. Mesmo entre os subsetores com mobilidade mais alta, a maior parte é composta por microempresas, que tendem a permanecer na capital e seriam, inclusive, beneficiadas com a isenção da taxa. 

Para os autores, a proposta ainda tem potencial de impulsionar a economia local ao liberar renda para as famílias mais pobres - que, segundo o IBGE, chegam a comprometer mais de 20% da renda com transporte - e ampliar o acesso a oportunidades de trabalho, estudo e saúde. O estudo também recomenda mecanismos de transparência e monitoramento, caso o projeto avance, para garantir eficácia e ajustes contínuos na política pública.  

'Já estamos vivendo um colapso da mobilidade urbana’, diz pesquisador

O economista André Veloso, um dos autores do estudo, afirmou que o trabalho busca traduzir um tema complexo de forma acessível. “Estamos tentando traduzir algo que é muito complexo. A forma de financiamento é muito arraigada na população por causa da formação história do transporte público e essa ligação com a tarifa, então desconstruir isso é muito difícil. Mas acho que as pessoas podem olhar ao redor delas e ver que a Tarifa Zero é possível porque existem mais de 7,5 milhões de pessoas atendidas por ela no Brasil”, disse, em referência às 137 cidades com passagem gratuita atualmente. Dessas, 33 ficam em Minas, sendo a maior Ibirité, na região metropolitana de Belo Horizonte, com cerca de 180 mil habitantes. 

“O que falta para nós é elas entenderem é que isso é um projeto que colocaria BH na vanguarda da mudança da mobilidade urbana que a gente precisa ter. BH é a cidade com o pior trânsito do Brasil, com mais de um veículo por habitante. O João XXIII está totalmente lotado de pessoas acidentadas de moto. Já estamos vivendo um colapso da mobilidade urbana. É preciso que as pessoas entendam que são necessárias medidas de mudança estrutural para que a cidade volte a ser habitável, para que as pessoas tenham dignidade nos deslocamentos cotidianos delas". 

Procurado, o Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros de Belo Horizonte (Setra-BH) afirmou que as operadoras do transporte coletivo podem ser remuneradas tanto por tarifa paga pelo usuário quanto por subsídio do poder público. O sindicato ressaltou que “a adoção da tarifa zero é uma decisão de competência exclusiva do poder público”. 

Apesar disso, o Setra-BH avaliou: “é importante destacar que o custo do sistema pode mais que triplicar, considerando o aumento da demanda e da oferta necessária. Sem uma fonte de financiamento robusta e permanente, há riscos concretos para a continuidade e a qualidade do serviço prestado à população. 

Tramitação

1 - O PL 60/25 está em análise na última comissão da Câmara Municipal de Belo Horizonte, a de Orçamento e Finanças Públicas. O prazo para apresentação do parecer da relatora, vereadora Marcela Trópia (Novo), terminaria nesta quinta-feira (24/7), mas ela encaminhou diligências à prefeitura. Com isso, a tramitação fica condicionada à resposta do Executivo, que tem até 30 dias para enviar as informações solicitadas. Caso o projeto seja aprovado pela comissão, ele fica pronto para ser votado em plenário. 

Ausência

A Comissão Especial de Estudo do Contrato de Ônibus, criada pela Câmara neste ano, se reuniu na terça-feira (22/7) para seguir com as discussões sobre a nova concessão, que acontece em 2028, mas os representantes de empresas que operam o transporte público da capital não compareceram. Eles alegaram que estão de férias.