O Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) apresentou, nesta terça-feira (8/7), uma denúncia contra a chapa do deputado estadual Bruno Engler (PL), que disputou a prefeitura de Belo Horizonte em 2024 contra o ex-prefeito Fuad Noman, falecido em março deste ano.
De acordo com o órgão, um grupo formado por Engler, pela candidata a vice-prefeita na chapa, Coronel Cláudia Romualdo (PL), e outros parlamentares do Partido Liberal - entre eles o deputado federal Nikolas Ferreira e a deputada estadual Delegada Sheila - teria disseminado informações inverídicas contra o então candidato à reeleição para prefeito.
O caso ainda não foi avaliado pela justiça e cabe aos acusados contestarem a denúncia do Ministério Público. Caso sejam condenados, os acusados podem perder os direitos políticos.
Segundo o MPMG, a ação é considerada “campanha sistemática de desinformação” e operou em duas frentes: exploração de trechos descontextualizados de obra literária de autoria do candidato e falsa imputação de responsabilidade por suposta exposição de crianças a conteúdo impróprio durante um festival internacional de quadrinhos organizado pela prefeitura. O propósito dos denunciados, segundo o MPMG, era desqualificar o candidato e angariar vantagem eleitoral no segundo turno das eleições.
A suposta campanha de difamação teria ocorrido nos últimos dias de campanha eleitoral, em novembro do ano passado, por meio de rádio, televisão, internet e redes sociais, o que potencializou a disseminação da desinformação e das ofensas. Um dos denunciados, segundo o MPMG, se recusou a cumprir uma ordem judicial de remoção de postagens ofensivas, incorrendo em crime de desobediência.
O MPMG ressalta que as condutas já haviam sido reconhecidas como ilícitas na esfera eleitoral. Ou seja, ainda durante as eleições, a Justiça deferiu pedidos de interrupção de divulgação de conteúdo e concessão de direito de resposta. As decisões judiciais anteriores fundamentaram-se na vedação de utilização de conteúdo calunioso, difamatório, injurioso ou sabidamente inverídico na propaganda eleitoral. A denúncia oferecida nesta terça-feira enfatiza que as sanções eleitorais não afastam a apuração dos mesmos fatos na esfera criminal, dada a independência entre as instâncias.
A defesa de Engler e Coronel Cláudia alegaram inocência dos clientes. "Não cometeram qualquer crime e que, no tempo oportuno, irão se manifestar nos autos do processo", disseram em nota. Os deputados Nikolas e Delegada Sheila foram acionados, mas ainda não responderam. Em Brasília, Nikolas fez um discurso na Câmara dos Deputados falando sobre o assunto.
Relembre
Um desses momentos em que as críticas sobre o livro veio à tona durante a campanha e colocou os dois candidatos frente à frente foi durante debate em uma igreja evangélica, em outubro de 2024, reta final da eleição.
Engler trouxe o tema e acusou Fuad de narrar um estupro de um jovem em seu livro. “É um livro absolutamente perturbador. O prefeito, em plena pandemia, escrever um livro pornográfico... que até aí poderia ser só uma peculiaridade dele. Mas dentro desse livro ele descreve com riqueza de detalhes o estupro coletivo de uma criança de 12 anos. Até vi que ele já se defendeu, dizendo que é um livro de ficção, mas como que alguém no contexto de um livro erótico consegue pensar em uma coisa dessa?", disse Engler.
Na ocasião, Fuad respondeu que queria discutir propostas e classificou o questionamento de desespero. “Se a gente quiser discutir literatura, vamos começar a chamar Nelson Rodrigues, Bocage, Jorge Amado... vamos discutir a literatura. Pegar um livro que tem uma passagem em que uma moça mente para uma pessoa para explorar (na campanha) é não conhecer literatura, é não saber que ficção é assim mesmo. É um momento meio desesperado do candidato.
Família de Fuad
Na denúncia apresentada, o Ministério Público incluiu como testemunhas de acusação a viúva de Fuad Noman, Mônica Drumond Lage Noman, e seus filhos, Paulo Henrique Lage Noman e Gustavo Lage Noman. Eles deverão ser ouvidos para apresentar provas dos danos emocionais sofridos pela família em decorrência das acusações.
Os denunciados terão dez dias para responderam à acusação do Ministério Público. A família de Fuad Noman, no processo, manifestou que, caso haja condenação indenizatória, o montante deverá ser destinado à instituição de caridade. Os réus poderão ter os direitos políticos suspensos em caso de condenação.
Acordo
Em desdobramento relacionado ao caso, o MPMG formalizou Acordo de Não Persecução Penal (ANPP) com Victor Lucchesi, suplente a vereador em Belo Horizonte. Ele se comprometeu a renunciar ao direito de candidatar-se a qualquer cargo eletivo nas próximas eleições gerais (2026) e pagar indenização por danos morais de R$ 31,5 mil direcionada a uma entidade de interesse social.
O ex-candidato deverá ainda publicar retratação formal em seu perfil no Instagram, reconhecendo o caráter desinformativo de sua publicação.. Ele também confessou formalmente a autoria e veracidade do vídeo.
Como mostrou a apuração, durante o período de campanha para o segundo turno das eleições municipais, o suplente de vereador publicou em seu Instagram as mesmas afirmações. Pelo acordo, o ex-candidato admite os crimes eleitorais de divulgação de fatos sabidamente inverídicos, calúnia e difamação com fins de propaganda eleitoral. O acordo depende de homologação pela Justiça para ser validado, conforme informações do Ministério Público.