O presidente do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais (TCE-MG), Durval Ângelo, lançou “indiretas” durante seu discurso na abertura do 6º Encontro Nacional dos Municípios Mineiros, que acontece nesta quarta-feira (20/8) e quinta-feira (21/), na sede do TCE-MG, em Belo Horizonte. Ao comentar sobre a mineração nos municípios, o presidente alfinetou o vice-governador de Minas Gerais, Mateus Simões (Novo), e o prefeito de Conceição do Mato Dentro, Otacílio Costa Neto (PSB). 

Durval  comentou sobre conversas que tem com conselheiros do do Tribunal de Contas dos Municípios do Pará (TCM-PA) sobre a aplicação da Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (CFEM), que são recursos pagos pelas mineradoras às cidades onde acontece a exploração, e alfinetou a gestão do governo mineiro. “O Pará tem dois tribunais de contas. Tem gente em Minas Gerais que já não aguenta um, você imagina lá no Pará, que são dois? Então, tem uma vantagem enorme de ter um só em Minas Gerais”.

O presidente do Tribunal fez referência aos ataques do vice-governador e pré-candidato ao governo de Minas, Mateus Simões (Novo), ao TCE-MG. Em coletiva de imprensa na semana passada, Simões criticou decisões recentes do tribunal e alegou que a gestão estadual teria de “delegar ao Tribunal de Contas a administração do governo”. 

A reação de Simões ocorreu após o TCE-MG suspender as audiências para criação das escolas cívico-militares em Minas, proposta defendida pelo governo Zema. O vice-governador lembrou que não é a primeira vez que o órgão barra um projeto do governo estadual e comparou a situação das escolas com o edital de concessão das rodovias do Vetor Norte, que também foi suspenso pelo tribunal por inconsistências na condução do processo pelo governo estadual. 

Na época, o presidente do Tribunal se posicionou em nota, afirmando que as decisões do órgão se baseiam em “análises técnicas e jurídicas de representações e denúncias” e que o objetivo é “garantir que os procedimentos e a aplicação dos recursos públicos estejam em conformidade com a legislação”.

A abertura do evento não teve a presença do governador Romeu Zema (Novo) nem do vice. O governo estadual foi representado pela secretária adjunta da Fazenda, Luciana Mundim de Mattos Paixão.

Recado também a prefeito

Na semana passada, o TCE-MG também suspendeu o processo de licenciamento ambiental de um projeto para alteamento de uma barragem da mineradora Anglo American em Conceição do Mato Dentro, região central de Minas.

O presidente do TCE lembrou dessa decisão no discurso. No final da fala, mencionou um “prefeito jovem, de Conceição” que “faz uma festa com os R$ 500 milhões que recebeu da Anglo”. “Tenho certeza que isso não é de graça e nem é presente. Ela (Anglo) ganha muito mais que isso”, avaliou.

O aporte da mineradora foi amplamente celebrado por “Otacilinho”, como o prefeito também é conhecido, em maio. Nas redes sociais, classificou o acordo como um “marco histórico de Conceição do Mato Dentro” e destacou o salto no valor do acordo: de R$ 20 milhões em 2017 para R$ 500 milhões em 2025. Os recursos seriam destinados a ações como a implantação de uma universidade federal no município. Justamente por estar em articulação com o governo federal, em Brasília, para viabilizar a instituição em reunião no Ministério da Educação, Otacílio não participou da abertura.

A decisão do TCE-MG de suspender o licenciamento se baseia em uma lei estadual que proíbe a concessão de licenças ambientais, inclusive as prévias, para barragens que possuem moradores na Zona de Autossalvamento. Segundo o tribunal, o processo pode ser retomado após o cumprimento das exigências legais e a realocação das famílias residentes na área de risco. A Corte foi acionada por uma representação da deputada estadual Bella Gonçalves (PSOL). 

A assessoria da prefeitura foi procurada. Caso haja um retorno, a matéria será atualizada.

Danos causados pela mineração

No seu discurso, o presidente do tribunal também destacou os danos causados pela mineração nos municípios. Ele citou um estudo feito pelo TCE-MG, divulgado em maio, que mostrou que nos municípios mineradores a taxa de mortalidade em doenças do sistema circulatório por 100 mil habitantes é 61% maior do que nas cidades em que as empresas não pagam a CFEM.

O estudo mostra que embora os municípios mineradores apresentem gastos per capita mais elevados em saúde, por conta de recursos do CFEM, em comparação aos municípios não mineradores, os achados indicam que os dados e os indicadores de saúde não são, necessariamente, mais favoráveis. 

“Há um custo para a cidade mineradora. Um custo muito grande, que muitas vezes não é lembrado”, destacou Durval Ângelo. 

Uma auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU) também mostrou que no período de 2017 a 2022, em média, 69,7% dos titulares de processos ativos de mineração não pagaram a CFEM espontaneamente. “O relatório do TCU apresenta que a Vale é a maior sonegadora. A Vale, a antiga Vale, que era do Rio Doce, hoje o rio já não tá tão doce assim, é grande sonegadora. E é contumaz em processos que se alongam para cair na prescrição”, denunciou o presidente da Corte de Contas mineira.

O discurso de Durval Ângelo, que abriu o encontro, dá o tom dos próximos dois dias. Os representantes dos municípios mineradores defendem a criação de um Marco Regulatório Municipal da Mineração, ações para combater a sonegação das mineradoras, a diversificação econômica nos municípios, e pretendem discutir os efeitos da reforma tributária nas cidades com a economia baseada na atividade mineradora.
 
Para o presidente da Amig (Associação dos Municípios Mineradores de Minas Gerais), o prefeito de Itabira, Marco Antônio Lage (PSB), o objetivo é trazer uma “visão mais moderna” na exploração da indústria da mineração. 

“A gente precisa discutir a qualidade de vida para população dos territórios minerados, a proteção ambiental, que é muito importante, e todos sabem que a mineração é muito agressiva ao meio ambiente, e ordenamento urbano, fazer com que a exploração mineral possa conviver de maneira sustentável com o território habitado, com a agricultura, com as reservas de proteção florestal”, disse o presidente da Amig à imprensa.