BRASÍLIA - O líder do governo Lula (PT) na Câmara, deputado José Guimarães, virou alvo de investigação determinada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) para identificar desvios de emendas parlamentares no Ceará. O relator, ministro Gilmar Mendes, determinou à Polícia Federal (PF) nessa terça-feira (8) a abertura de um inquérito para investigar a participação de políticos com foro privilegiado em uma quadrilha que desviava dinheiro público e fraudava licitações e contratos.

Além de José Guimarães, o documento sigiloso também cita os deputados Eunício Oliveira (MDB-CE), que presidiu o Senado Federal entre 2017 e 2019, e Yury do Paredão (MDB-CE). A nova investigação é um desdobramento de uma operação da Polícia Federal nessa terça-feira que cumpriu mandados de busca e apreensão em endereços ligados ao deputado Júnior Mano (PSB-CE). Agentes deram batidas no gabinete do político na Câmara dos Deputados, no apartamento funcional e em endereços dele no Ceará.

Segundo representação da PF, Mano é a figura central na operação da quadrilha. "A atuação do parlamentar extrapola a esfera meramente política, configurando-se como operador ativo da engrenagem criminosa", conforme relatado no documento. Ainda de acordo com a investigação, o grupo cobrava entre 12% e 15% sobre o valor das emendas para garantir que as prefeituras recebessem o dinheiro público. "Tal percentual era tratado como 'imposto' ou 'pedágio' cobrado sobre os valores destinados, numa prática institucionalizada de corrupção", indicou a PF. As provas obtidas pela investigação são áudios, mensagens e e-mails trocados entre membros da quadrilha.

As emendas eram usadas pelo gabinete do deputado para comprar apoio político, patrocinar campanhas e até pagar blogueiros e jornalistas. A ação do STF cita até o apresentador de um programa exibido em um canal de comunicação cearense. Os nomes do líder José Guimarães e do deputado Eunício aparecem em áudios obtidos pela investigação. "Em diálogo mantido, há referência à oferta de emenda parlamentar atribuída a José Guimarães, supostamente intermediada por Ilomar Vasconcelos, atual vice-prefeito de Canindé, com possibilidades de destinação para saúde, pavimentação ou 'sarramento'", diz o documento.

"Em mensagem posterior, Bebeto afirma para Cleidiane Queiroz ter sido informado, por meio de áudios que atribui a Eunício Oliveira, de que Guimarães teria indicado R$ 2 milhões em emenda para o município de Choró, e que o próprio Eunício também teria destinado R$ 1 milhão para Canindé", cita. Bebeto, ou Bebeto de Choró, é Carlos Alberto Queiroz, apontado como o operador do esquema. Cleidiane Queiroz é irmã dele. 

As referências aos deputados nessas provas obtidas, segundo defendeu a Polícia Federal, revelam a necessidade de "diligências investigativas específicas". Em relação a Yury do Paredão, há indícios de que ele teria mantido um diálogo direto e indireto com o núcleo operacional do esquema de desvios. "Tal suspeita é acentuada pela confirmação de que o deputado indicou emenda individual no valor de R$ 10.000.000 ao município de Choró no exercício de 2024", indica o documento.

A ex-prefeita do município de Canindé, Maria do Rozário Araújo Pedrosa Ximenes, é uma peça importante nessa investigação. Ela disse à PF que a quadrilha teria destinado uma emenda de R$ 3 milhões ao município, mas condicionou a liberação do valor ao pagamento do percentual de retorno em uma operação de rachadinha. 

"Segundo ela, a proposta foi recusada, o que teria motivado o aumento da animosidade do grupo em relação à sua administração", explica a PF. O nome de José Guimarães reaparece nesse trecho da representação. "Acrescentou, ainda, que, Ilomar Vasconcelos, atual vice-prefeito da chapa apoiada por Bebeto em Canindé, e já mencionado nas tratativas relativas à emenda de José Guimarães, foi também seu vice-prefeito em gestão anterior", diz a PF.

"Naquela ocasião, conforme relatado, Ilomar teria obtido duas emendas parlamentares oriundas do gabinete do deputado José Guimarães e, posteriormente, passou a insistir no repasse de 10% do valor de cada emenda como retorno", completou.

Sobre a investigação, José Guimarães afirmou, nesta quarta-feira (9), que não enviou emendas para os municípios de Canindé e Choró e negou relação com o esquema de desvio. "Tive o nome citado durante conversa de terceiros e isso, nem de longe, denota participação em qualquer organização que usurpa o dinheiro público", se defendeu. "Qualquer tentativa de me ligar a esse escândalo que envergonha a bancada cearense é puramente desonesta e direcionada", completou. Os deputados Eunício Oliveira e Yury do Paredão ainda não se manifestaram, mas o espaço segue aberto às defesas dos parlamentares.