Responsável pela Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal (SSP-DF) no fim de semana dos ataques às sedes dos três poderes em Brasília, o delegado Fernando de Souza Oliveira disse, em depoimento na “CPI dos Atos Antidemocráticos” na Câmara Legislativa, que o plano de segurança elaborado para o dia 8 de janeiro não foi executado pela Polícia Militar e houve “passividade” por parte da corporação.
“Eu me senti impotente. (...) Não houve resistência à invasão. Eu posso dizer que houve uma certa passividade [por parte da PMDF]. Isso vai ser apurado por meio do inquérito policial, o que ocorreu de errado na execução”, afirmou Fernando de Souza, na manhã desta quinta-feira (2), no depoimento à CPI, que foi público. Ele era secretário-executivo da SSP-DF, nomeado por Anderson Torres.
Fernando de Souza, exonerado do cargo com Anderson Torres e delegado da PF, assim como o ex-secretário de Segurança Pública, foi a primeira pessoa a depor na comissão instalada pela Câmara Legislativa do Distrito Federal para apurar os atos de 8 de janeiro e outros episódios de violência que antecederam a tentativa de derrubar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva com uma intervenção militar.
Em 8 de janeiro, com Anderson Torres já nos Estados Unidos – para onde havia embarcado seis dias depois de ser empossado no cargo de secretário de Segurança Pública, após deixar o Ministério da Justiça, com a derrota de Jair Bolsonaro –, Fernando de Sousa era o secretário de segurança em exercício.
Fernando enviou áudios para o governador Ibaneis Rocha (MDB) dizendo que a situação na Esplanada dos Ministérios era tranquila, enquanto apoiadores do então presidente Jair Bolsonaro já desembarcavam aos milhares em Brasília e mensagens de texto e áudio convocando para invasão aos prédios públicos eram conhecidos pelos serviços de inteligência, sendo divulgados por veículos de comunicação.
Ibaneis e outros chefes dos poderes locais e nacionais, aliás, ficaram sabendo por acaso que Torres havia viajado para os EUA, quando o então secretário não respondia telefonemas e mensagens.
À CPI dos Antidemocráticos, Fernando de Sousa disse que Torres deixou Brasília e o país sem apresentá-lo a Ibaneis e aos comandantes das forças policiais.
“Não houve uma apresentação formal. O secretário Anderson disse que tinha uma agenda posterior e com a viagem dele eu assumiria”, contou Fernando de Sousa. “Eu assumiria oficialmente na segunda-feira (9 de janeiro). Eu estava aqui, mas era o secretário-executivo. Tanto que eu estava reportando todos os dias ao secretário Anderson. Até para falar com o governador, eu me reportava para o Anderson”, completou.
Ex-número 2 da SSP-DF diz que Anderson Torres não deu 'nenhuma orientação'
Fernando de Souza Oliveira disse ainda que havia um plano de ação integrado para aquele fim de semana, discutido e aprovado por todas as forças de segurança do DF, com a participação e a chancela de Segurança Anderson Torres. No entanto, o ex-número 2 da SSP-DF afirmou que Torres saiu de férias sem deixar “nenhuma orientação específica” à ele, seu interino.
“Ele [Anderson Torres] tinha me demandado a questão dessa operação dos dias 7, 8 e 9. Me apresentou o protocolo de ação integrada, que reúne as ações das forças policiais, e disse que deixaria o protocolo de ação assinado, mas não me deixou nenhuma orientação específica. Ele disse: ‘Vou assinar e se precisar do senhor, irei demandá-lo'”, afirmou Fernando de Souza à CPI.
O ex secretário-executivo da SSP-DF disse não saber o motivo do planejamento não ter sido executado.
“O grande questionamento é: por que o departamento de Operações da Polícia Militar não executou o que foi acordado no PAI (Plano de Ações Integradas?”, disse à CPI, ressaltando que a execução do plano elaborado pelo Departamento de Operações da Polícia Militar (DOP) deveria ser seguido à risca pela PMDF.
CPI quer ouvir Anderson Torres na próxima quinta-feira
A CPI quer ouvir Anderson Torres, que está preso desde 14 de janeiro, na próxima quinta-feira (9). O depoimento, no entanto, depende de liberação do ministro Alexandre de Moraes. O pedido já foi encaminhado e os integrantes da comissão aguardam uma resposta para confirmar a oitava.
Os integrantes da CPI também pretendem ouvir, em 16 de março, dois coronéis da PMDF: Jorge Eduardo Naime e Marcelo Casimiro Vasconcelos Rodrigues. Ex-comandantes, eles estavam na Esplanada dos Ministérios em 8 de janeiro.
O ex-secretário da SSP-DF delegado Júlio Danilo deve ser ouvido pelos deputados distritais no dia 23, assim como o tenente-coronel da PMDF Jorge Henrique da Silva Pinto. Em 30 de março, será a vez do ex-comandante e coronel Fábio Augusto Vieira.
CPI tem ex-militar da PMDF e aliados de Ibaneis Rocha
A CPI dos Atos Antidemocráticos foi instalada em 18 de janeiro. A oficialização ocorreu após a leitura do requerimento que pedia o início das investigações sobre os ataques às sedes dos três poderes, em 8 de janeiro, e à sede da Polícia Federal, em 12 de dezembro.
A leitura do documento foi o primeiro passo para a abertura da CPI que, depois de instalada formalmente – o que ocorreu em fevereiro, com a escolha dos seus integrantes – tem 180 dias, prorrogáveis por mais três meses, para concluir seus trabalhos.
A comissão é composta por Chico Vigilante (PT), presidente; Jaqueline Silva, vice-presidente; João Hermeto (MDB), relator; Pastor Daniel de Castro (PP), Robério Negreiros (PSD), Joaquim Roriz Neto (PL) e Fábio Felix (PSol).
Hermeto é militar da reserva da PMDF e líder do governo Ibaneis na Câmara Legislativa. Ibaneis foi afastado do cargo pelo STF após os episódios de 8 de janeiro, pois colocado sob suspeita.
O presidente da CLDF, deputado Wellington Luiz (MDB), é aliado de Ibaneis Rocha e já declarou que o colega de partido não será alvo da CPI, ao contrário do que deseja a oposição.
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