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Governo deve anular acordos fechados na gestão Pimentel

Executivo questiona prerrogativa de Carlos Calazans para negociar com servidores estaduais

Por Sávio Gabriel
Publicado em 20 de fevereiro de 2020 | 03:00
 
 
 
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Uma nova polêmica está se desenhando na relação entre o governo de Minas e os servidores públicos do Estado. Após o envio do projeto de lei que previa inicialmente a recomposição salarial apenas para a segurança pública, o governo de Romeu Zema (Novo) deve anular ao menos dez acordos firmados com diversas categorias entre os anos de 2016 e 2018, durante a gestão de Fernando Pimentel (PT). Na prática, todos os índices de reajuste e recomposição de carreiras previamente firmados não terão mais validade.

Conforme apurou a reportagem, o imbróglio é de ordem jurídica. Segundo as informações, a equipe do governo constatou que Carlos Alberto Calazans, que na gestão passada ocupou o cargo de assessor de Relações Sindicais da Secretaria de Planejamento (Seplag) e era o representante oficial do governo durante todas as fases de negociação junto aos servidores, não tinha a prerrogativa legal para exercer a função. Na prática, Calazans era o responsável, por exemplo, pela montagem de grupos de trabalho junto às categorias, além de assinar os termos em nome do Palácio Tiradentes.

Durante a gestão de Fernando Pimentel, o governo de Minas firmou acordos com diversas categorias, prevendo, entre outros pontos, reajustes e mudanças nos planos de cargos e carreiras. Tais alterações, no entanto, foram condicionadas à regularização das contas do Estado, que desde 2016 tinha gastos com pessoal acima do limite de 49% estabelecido pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).

No ano passado, uma nova interpretação do Tribunal de Contas de Minas (TCE-MG), que excluiu das despesas os gastos com inativos, fez com que o Estado se enquadrasse na LRF, registrando um índice de 45,5%.

Um dos acordos foi firmado em 2017 com os servidores da Fundação Clóvis Salgado. Um dos termos previa um reajuste de 121% em carreiras como bailarino, professor de arte e músico instrumentista. Além disso, a gestão Pimentel estabeleceu o compromisso de criar 51 gratificações para os solistas da fundação.

Outro acordo que está em xeque foi firmado em 2018 com a Associação Sindical dos Trabalhadores em Hospitais do Estado (Asthemg Sindpros). O termo previa o pagamento de ajuda de custo aos servidores e abordava também a quitação do 13º daquele ano – que não foi pago a nenhuma categoria, sendo integralmente quitado somente no fim de 2019.

Internamente, a equipe de governo constatou que Calazans estava lotado na Prodemge, com data de admissão de 1º de junho de 2016. Ele ocupava o cargo de assessor estratégico II, com remuneração de R$ 15,9 mil, e foi demitido oficialmente no dia 30 de janeiro do ano passado. A área de atuação de Calazans, desde o início, conforme apurou a reportagem, foi na assessoria da presidência do órgão.

No entendimento do governo, Calazans poderia exercer a função junto aos sindicatos desde que tivesse sido oficialmente cedido à Seplag e, após essa etapa, ter sido nomeado como chefe da Assessoria de Relações Sindicais.

No entanto, conforme constatou a equipe de Zema, nenhuma dessas etapas teria sido cumprida. Há resoluções nas quais Calazans consta como chefe do setor, mas isso só teria validade oficial se houvesse atribuição publicada no Diário Oficial, o que também não teria ocorrido, segundo apurou o governo.

Análise

A Seplag informou que “não há registro de nomeação, cessão ou atuação formal de Carlos Alberto Menezes de Calazans na pasta” e disse que vai analisar, junto à Advocacia Geral do Estado, os acordos assinados por ele.

Outro lado

Ex-assessor de Relações Sindicais da Secretaria de Planejamento e Gestão (Seplag), Carlos Alberto Calazans negou qualquer irregularidade nos acordos firmados por ele em nome do governo de Minas e alegou que, diferentemente da interpretação da atual gestão, tinha, sim, a prerrogativa legal para representar o Executivo nas negociações. Além disso, ele argumentou que todos os documentos foram assinados conjuntamente por pelo menos dois secretários, o que daria validade jurídica aos termos.

“A figura do representante de relações não é a figura do secretário. Por isso é que em todos esses acordos eu tive o cuidado de, na minuta, sempre ter (a assinatura) do secretário de Planejamento e o secretário da respectiva área”, pontuou, reforçando que a medida foi tomada para evitar quaisquer questionamentos jurídicos posteriores. Ele também ressaltou que todos os termos firmados foram acompanhados pela Advocacia Geral do Estado (AGE).

“Eles seguiram o trâmite correto, e a AGE não deixaria os acordos (serem firmados) sem ter a tramitação legal”.
Calazans criticou a interpretação da administração de Romeu Zema (Novo). “O governo está procurando um álibi jurídico para não cumprir os acordos que foram feitos de forma correta e honesta com os servidores da área. Isso não é forma de o Executivo agir”, afirmou. 

O ex-assessor confirmou que era vinculado à Prodemge e assegurou que estava, sim, cedido oficialmente à Seplag. “Isso nunca prejudicou em nada os acordos assinados. Não sei por que agora, depois de dois anos, esse questionamento do governo”. Calazans também se colocou à disposição da Seplag e do titular da pasta, Otto Levy Reis, para esclarecer a situação.

Calazans ressaltou ainda que Zema tem cumprido os acordos referentes ao pagamento de ajuda de custo e confirmou que há dez termos referentes a planos de carreira que estão pendentes de execução.

Preocupação

A possibilidade de anulação dos acordos firmados na gestão do ex-governador Fernando Pimentel (PT) preocupa os servidores do Estado. O presidente da Associação Sindical dos Trabalhadores em Hospitais do Estado (Asthemg Sindpros), Carlos Augusto Martins, ressaltou que os trabalhadores não podem ser prejudicados pelo imbróglio

“Nos preocupa que o governo atual tente desfazer qualquer tipo de acordo que o anterior tenha promovido. Se ele (Carlos Calazans) estava ou não autorizado a assinar, já não é problema mais dos trabalhadores”, ressaltou, pontuando que, “tendo ou não a legalidade quanto à pessoa que assina, o importante para o trabalhador é que houve essa concessão (acordo)”.

Ele também criticou a postura da gestão de Romeu Zema (Novo). “Nos estranha que, em vez de o atual governo celebrar novos acordos em função de novas demandas que temos, e nós temos apresentado ao governo, ele esteja preocupado em rever os acordos do governo anterior e desfazê-los”, disse Martins.

Procurada pela reportagem para repercutir a questão, a Fundação Clóvis Salgado informou que não se posicionaria e que seguiria o mesmo tom da nota enviada pela Secretaria de Planejamento. 

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