BRASÍLIA - O empresário e influenciador argentino Fernando Cerimedo, que trabalhou na vitoriosa campanha eleitoral de Javier Milei na Argentina, é um dos 37 indiciados pela Polícia Federal (PF) na investigação que apura golpe de Estado no Brasil em 2022, após a derrota de Jair Bolsonaro (PL) para Luiz Inácio Lula da Silva (PT). 

O relatório do inquérito foi concluído nesta quinta-feira (21) e traz o ex-presidente como um dos envolvidos na suposta trama golpista para mantê-lo no poder. Os planos envolveriam prisão e até assassinato de Lula, de seu vice, Geraldo Alckmin (PSB), e do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF). 

Na última terça-feira (19), a PF deflagrou uma operação e prendeu um agente da corporação e quatro militares do Exército acusados de integrar um plano de golpe de Estado denominado Punhal Verde e Amarelo. Os militares são integrantes das Forças Especiais do Exército, também conhecidos como “kids pretos”, especializados em ações de guerrilha, infiltração e outras táticas militares usadas em ações clandestinas.

Já Fernando Cerimedo foi investigado como um dos mentores da propagação de notícias falsas, no “núcleo de desinformação e ataques ao sistema eleitoral” do que a PF classificou como organização criminosa que seria liderada por Jair Bolsonaro para colocar em prática o suposto plano de golpe.

Cerimedo é amigo de filhos do ex-presidente e um dos responsáveis pela expansão da direita na América Latina. No ano passado, o empresário atuou como estrategista digital do atual presidente da Argentina, Javier Milei, também aliado de Bolsonaro e filhos.

No Brasil, Cerimedo ficou conhecido em novembro de 2022, quando fez uma live, nas redes sociais, atacando o sistema eleitoral do país, com informações falsas e dossiês apócrifos. Também usa as redes sociais para atacar nominalmente Alexandre de Moraes.

Cerimedo já afirmou que usou “trolls (detratores)” para engajar seus candidatos e patrocinar campanhas negativas contra os adversários. Nas eleições argentinas, Cerimedo fez uso da estratégia para atrair o eleitorado jovem para Milei. O marqueteiro também diz ter atuado da mesma forma nas campanhas de Bolsonaro em 2018 e de José Antonio Kast, no Chile, em 2021.

Cerimedo é fundador e CEO da Academia Numen, que ministra cursos virtuais de marketing digital, gestão de projetos, Google Ads e o inovador marketing digital político. Ele também é um dos donos do "La Derecha Diario", um site voltado a adeptos da direita.

Na quinta-feira, assim como Jair Bolsonaro, Cerimedo foi indiciado no Brasil pelos crimes de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado e organização criminosa. As penas acumuladas de tais crimes podem chegar a 30 anos de prisão. Confira abaixo as penas para cada crime citado pela PF:

  • Golpe de Estado: 4 a 12 anos de prisão;
  • Abolição violenta do Estado democrático de Direito: 4 a 8
  • anos de prisão;
  • Integrar organização criminosa: 3 a 8 anos de prisão.

Com a entrega do relatório, a PF encerra as investigações referentes às tentativas de golpe de Estado e abolição violenta do Estado Democrático de Direito.

Cópia do inquérito, que tem 884 páginas, foi enviado ao STF, responsável pela ação. A Procuradoria Geral da República (PGR) recebeu uma cópia do documento para se manifestar contra ou a favor do resultado da investigação. Ela fará a denúncia, ou mandará arquivar ou pedir mais investigações.

Caso a PGR se manifeste favoravelmente sobre o prosseguimento da ação, denunciado ao STF os indiciados pela PF, caberá aos ministros do Supremo julgar se aceitam ou rejeitam a posição da procuradoria. 

Se a maioria dos ministros entenderem que há elementos suficientes para acatar a denúncia da PGR, os indiciados passarão à condição de réus e começarão a responder ao processo penal. Só quando houver decisão definitiva ou não existir mais possibilidade de recurso, eles são considerados culpados.

Há expectativa de o caso ser julgado pelo STF em junho ou julho de 2025.

A PF ressaltou, em comunicado oficial, que “as provas foram obtidas por meio de diversas diligências policiais realizadas ao longo de quase dois anos, com base em quebra de sigilos telemático, telefônico, bancário, fiscal, colaboração premiada, buscas e apreensões, entre outras medidas devidamente autorizadas pelo poder Judiciário”.

As investigações apontaram que os indiciados se estruturaram por meio de divisão de tarefas, o que permitiu a individualização das condutas e a constatação da existência dos seguintes grupos nomeados da seguinte forma pela PF:

  • Núcleo de desinformação e ataques ao Sistema Eleitoral;
  • Núcleo responsável por incitar militares à aderirem ao golpe de Estado;
  • Núcleo jurídico;
  • Núcleo operacional de apoio às ações golpistas;
  • Núcleo de inteligência paralela;
  • Núcleo operacional para cumprimento de medidas coercitivas.

A PF indiciou todos os integrantes do grupo que foi batizado, ao longo do inquérito, como Núcleo de oficiais de alta patente, integrado por militares que “utilizando-se da alta patente que detinham, agiram para influenciar e incitar apoio aos demais núcleos de atuação por meio do endosso de ações e medidas a serem adotadas para consumação do Golpe de Estado”.

A investigação começou após os atos de 8 de janeiro de 2023, quando as sedes dos Três Poderes, em Brasília, foram invadidas e depredadas por apoiadores de Bolsonaro que pediam intervenção militar para manter o ex-presidente no poder, com a prisão de Lula e ministros do STF.