BRASÍLIA - A Polícia Federal (PF) deflagrou, nesta quinta-feira (11), a quarta fase da operação Última Milha. As investigações, iniciadas no ano passado, apuram o uso de sistemas da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) para monitoramento ilegal de autoridades públicas e produção de notícias falsas.
Os fatos investigados estão relacionados às atividades da agência durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
O Supremo Tribunal Federal (STF) autorizou a execução de cinco mandados de prisão preventiva e sete mandados de busca e apreensão nas cidades de Juiz de Fora (MG), Brasília (DF), Curitiba (PR), Salvador (BA) e São Paulo (SP). O relator do caso na Corte é o ministro Alexandre de Moraes.
Segundo a PF, o objetivo desta fase é "desarticular uma organização criminosa" após ser constatado que membros dos três Poderes e jornalistas foram alvos das ações do grupo, incluindo a criação de perfis falsos e a divulgação de fake news.
A corporação informou ainda que os suspeitos acessaram ilegalmente computadores, aparelhos telefônicos e infraestrutura de telecomunicações para monitorar pessoas e agentes públicos.
Os nomes dos alvos desta fase não foram informados, mas a reportagem apurou que os mandados estão sendo cumpridos em endereços de servidores da agência subordinados ao então diretor-geral do órgão e hoje deputado federal, Alexandre Ramagem (PL-RJ), e de pessoas que faziam parte do chamado "gabinete do ódio".
Os investigados podem responder pelos crimes de organização criminosa, tentativa de abolição do Estado Democrático de Direito, interceptação clandestina de comunicações e invasão de dispositivo informático alheio.
Relembre
A ação de hoje é uma continuação das investigações da operação Última Milha, deflagrada ainda em outubro do ano passado. Segundo a PF, as provas obtidas a partir das diligências executadas à época indicaram que o "grupo criminoso" criou uma estrutura paralela na Abin e utilizou ferramentas e serviços da agência de inteligência do Estado para ações ilícitas, produzindo informações para uso político e midiático.
Na época, foi revelado que ministros do STF, jornalistas, advogados, políticos e adversários do governo do ex-presidente estavam entre as pessoas que foram monitoradas ilegalmente por membros da agência. A apuração identificou 33 mil acessos da localização telefônica dos mais diversos alvos.
Conforme as investigações, ocorreram proveitos pessoais para interferir em apurações da Polícia Federal. Na época, foi apontado ainda que servidores teriam utilizado o conhecimento sobre o uso indevido do sistema para coagir colegas e evitar a expulsão da Abin.
Já em janeiro deste ano, a corporação cumpriu outra fase da operação, chamada de Vigilância Aproximada, e que teve como principal alvo Alexandre Ramagem, que foi diretor-geral da Abin na gestão de Bolsonaro. Na época, o ex-presidente também foi alvo dos agentes da PF.
Ramagem é próximo da família do ex-presidente e foi lançado pré-candidato à prefeitura do Rio de Janeiro nas eleições que vão acontecer em outubro deste ano. Foi na gestão dele na Abin, entre julho de 2019 e abril de 2022, que a PF identificou o uso de um sistema de geolocalização de dispositivos móveis (GPS) sem a devida autorização judicial por servidores.
Software permite fazer consultas de até 10 mil celulares a cada 12 meses
A Abin foi criada com o intuito de produzir relatórios para auxiliar a Presidência da República na tomada de decisões sobre os diferentes assuntos, em especial no que diz à defesa, alertando sobre possíveis ameaças, internas e externas.
De acordo com as investigações, o sistema de geolocalização utilizado pela Abin “é um software intrusivo na infraestrutura crítica de telefonia brasileira”. O sistema FirstMile foi desenvolvido pela empresa israelense Cognyte e comprado pela Abin por R$ 5,7 milhões, sem licitação, no governo de Michel Temer (MDB).
Desenvolvido pela empresa israelense Cognyte (ex-Verint), o programa permite rastrear o paradeiro de uma pessoa a partir de dados transferidos do celular para torres de telecomunicações instaladas em diferentes regiões.
Com base no fluxo dessas informações, o sistema oferecia a possibilidade de acessar o histórico de deslocamentos e até criar “alertas em tempo real” de movimentações de um alvo em diferentes endereços. O software permite realizar consultas de até 10 mil celulares a cada 12 meses.