BRASÍLIA – Ao impor medidas cautelares contra o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes invocou a autoridade de dois expoentes históricos: o brasileiro Machado de Assis, na literatura, e o americano Abraham Lincoln, na política norte-americana. 

Na decisão, Moraes reforça a defesa da soberania nacional com uma citação machadiana — “A soberania nacional é a coisa mais bela do mundo, com a condição de ser soberania e de ser nacional” — e relembra a advertência de Lincoln: “Os princípios mais importantes podem e devem ser inflexíveis.”

As referências literária e política sustentam o argumento central da decisão do ministro de que o STF não aceitará qualquer tentativa de subordinação a interesses estrangeiros ou pressão política contra o funcionamento do Judiciário. 

Moraes aponta Jair e Eduardo em ação orquestrada contra o STF

Segundo Moraes, Bolsonaro e um de seus filhos, o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), atuaram para pressionar a Corte, articulando com o presidente americano Donald Trump a aplicação de sanções comerciais contra o Brasil. Em troca, negociava-se a anistia do ex-presidente, hoje réu por tentativa de golpe de Estado na Ação Penal 2.668.

Moraes classificou como “espúrias e criminosas” as tratativas com autoridades estrangeiras, afirmando que houve “clara finalidade de coagir essa Suprema Corte no julgamento da ação penal”. Para o ministro, a conduta de Bolsonaro afronta diretamente a soberania nacional, a independência dos Poderes e os princípios constitucionais que sustentam o Estado de Direito.

Como consequência, o STF impôs uma série de medidas restritivas ao ex-presidente, incluindo:

  • uso de tornozeleira eletrônica;
  • recolhimento domiciliar entre 19h e 6h, incluindo fins de semana e feriados;
  • proibição de contato com diplomatas ou outros réus;
  • veto ao uso de redes sociais, inclusive por intermédio de terceiros;
  • proibição de entrada em embaixadas;
  • e mandados de busca e apreensão de eletrônicos e dinheiro em espécie.

Mandados de busca e apreensão foram cumpridos em endereços de Bolsonaro em Brasília

A Polícia Federal cumpriu os mandados na manhã desta sexta-feira (18), em endereços ligados a Bolsonaro, como sua casa no Jardim Botânico, em Brasília, e o gabinete que mantém na sede do PL. Ele foi conduzido à Secretaria de Administração Penitenciária do DF para a instalação da tornozeleira eletrônica.

A decisão de Moraes foi emitida no âmbito de uma investigação que tramita sob sigilo e está baseada em documentos, postagens, depoimentos e um repasse de R$ 2 milhões a Eduardo Bolsonaro durante viagem aos Estados Unidos.

Em entrevista após o cumprimento das medidas, Bolsonaro afirmou que se sente humilhado e voltou a dizer que é vítima de perseguição política. “Nunca pensei em sair do Brasil ou ir para embaixada”, disse. A defesa do ex-presidente declarou que recebeu com “surpresa e indignação” as medidas e que ele sempre cumpriu as ordens da Justiça.

A decisão reacende a tensão diplomática envolvendo o ex-presidente e os Estados Unidos. Trump, em carta enviada a Bolsonaro na véspera, disse que ele está sendo alvo de uma “caça às bruxas” no Brasil. Já Eduardo Bolsonaro permanece nos EUA, onde atua para pressionar o Congresso americano a adotar sanções contra ministros do STF e demais autoridades brasileiras.

A ofensiva internacional levou o STF a abrir novo inquérito contra o deputado, que teria condicionado o fim das tarifas impostas por Trump à anistia de condenados pelos ataques golpistas de 8 de janeiro de 2023. Moraes deixou claro, porém, que o STF não se curvará a pressões externas: “Um país soberano como o Brasil sempre saberá defender sua Democracia e sua Soberania.”